a) Em Freud, trata-se de fato de psicologia compreensiva e não de explicação causal, como ele pensava. Há, é verdade, explicações causais que desempenham um certo papel, quando dados físicos, aos quais se liga um conjunto de relações compreensíveis, são tidos como causas, por exemplo, da paralisia de um braço, de um distúrbio de consciência, etc.
b) Freud leva-nos ao conhecimento indiscutível de numerosas relações compreensíveis isoladas. Compreendemos como os complexos, reprimidos fora da consciência clara, reaparecem por meio de símbolos. Compreendemos que os instintos recalcados ensaiem processos de reação. Compreendemos também a distinção entre processos primários, autênticos, e os processos secundários, que apenas existem como símbolos ou sublimação. Em parte, Freud desenvolve, neste caso, detalhadamente, os ensinamentos de Nietzsche; penetra profundamente no psiquismo despercebido (unbemerkt), fazendo-o voltar à consciência.
c) A confusão entre relações compreensíveis e relações causais deu lugar a que Freud caísse no erro de proclamar que tudo na vida psíquica, cada processo, é compreensível (isto é, segundo ele, determinado por um sentido). Só a exigência de uma causalidade ilimitada se pode admitir com razão, e não a de uma “compreensibilidade” sem limites. Este erro traz consigo um outro. Partindo de relações compreensíveis, Freud desenvolve algumas teorias sobre as causas do processo psíquico total. Ora a compreensão não pode nunca, por sua essência, conduzir a teorias, – ao passo que as explicações causais levam sempre necessariamente à teoria (a interpretação suposta de um único processo psíquico – não há mais que interpretações isoladas deste tipo – não se faz evidentemente por meio de uma teoria).
d) …
e) Existe uma outra falha nos ensinamentos de Freud: a simplificação crescente da compreensão, devida ao fato de que os processos compreensíveis se convertem em teoria. As teorias levam à simplificação, ao passo que a compreensão revela uma infinita diversidade. Freud acabou por acreditar que o psiquismo, quase por inteiro, pode ser compreendido como derivado da sexualidade, entendida em sentido lato, enquanto força primitiva única. Particularmente, muitos dos escritos dos seus discípulos são de uma simplicidade que os torna fastidiosos e insuportáveis. Já se sabe de antemão que, em cada um desses trabalhos, se encontrará sempre a mesma coisa. Aqui a psicologia compreensiva não avança.
(Gesemmelte Schriften zur Psychopathologie, págs. 337-338).