Mas é realmente verdade que esse mundo é um mundo do ser em si, que já suplantou toda relatividade do estar-aí e cujo conhecimento pode, por conseguinte, reclamar o título de ciência absoluta? O próprio conceito de um “objeto absoluto” não é uma espécie de ferro de madeira? Nem o universo biológico nem o universo físico podem negar realmente a relatividade ao estar-aí, que lhes é própria. A física e a biologia têm, por consequência, o mesmo horizonte ontológico que, na sua qualidada (456) de ciências, não podem passar por cima. Conhecem o que é, e, como Kant mostrou, isso significa que o conhecem, tal como está dado no espaço e no tempo e como é objeto da experiência. Isso define justamente o progresso de conhecimento que se busca na ciência. Tampouco o mundo da física pode querer ser o todo do ente. Mesmo uma equação universal que transcrevesse tudo quanto é, de maneira que também o observador do sistema aparecesse nas equações do mesmo, continuaria pressupondo o físico que, enquanto calculador, não seria o calculado. Uma física que se calculasse a si mesma e fosse o seu próprio calcular seria uma contradição em si mesma. E o mesmo se pode dizer da biologia, que investiga os mundos vitais e os modos de comportamento do homem. O que é reconhecido, nesse caso, vale certamente também para os homens. O que nela se conhece abrange, é claro, também o ser do investigador, pois também ele é um ser vivo e um homem. Não obstante, disso não se deduz, de modo algum, que a biologia seja apenas um modo de comportamento do homem, e que somente interessa como tal. Ela é também conhecimento (ou erro). A biologia investiga, tal como a física, o que é, e ela não é, por sua vez, o que investiga. VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 3.
A determinação kantiana fundamental do prazer estético, como um gosto isento de todo interesse, não somente se refere ao fato puramente negativo de que o objeto desse gosto não seja nem empregado como útil nem desejado como bom, mas quer dizer também positivamente que o “estar-aí” (“Dasein”) não pode acrescentar nada ao conteúdo estético do prazer, à “pura contemplação”, precisamente porque o ser estético é representar-se. Somente a partir do ponto de vista moral é que se pode encontrar um interesse pela existência (Dasein) do belo, por exemplo, pelo canto do rouxinol, cuja enganosa imitação é para Kant, até certo ponto, uma ofensa moral. A questão seria, naturalmente, até que ponto podemos assumir, como consequência real dessa constituição do ser estético, o fato de que aqui não há porque procurar verdade alguma, já que aqui não se conhece nada. Nas nossas análises estéticas já consideramos a estreiteza do conceito do conhecimento que condiciona, nesse ponto, o questionamento kantiano, e partindo da questão da verdade da arte tínhamos encontrado o caminho para a hermenêutica, na qual encontramos fundidas no uno a arte e a história. VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 3.