Ao surpreender esse momento íntimo do ser, estaremos por certo na presença retraída da verdade. A verdade é pois revelação do ser. Mas o que se revela insinua uma profundidade não-revelada. Verdade é então revelação que evoca a não-revelação. Em grego o termo usado para exprimir esse movimento revelador do ser, portanto a verdade, é aletheia, palavra derivada do verbo lantháno, que significa encobrir, e da partícula privativa a. Alétheia ou verdade é o velado retraído no desvelado do ser.
Isso supõe que o ser ande por aí encoberto, que o ser que nos circunda se oculte nos esconderijos das coisas. Embora a realidade esteja aí, não significa imediatamente que nós nos tenhamos encontrado com ela. O que vemos são camadas epidérmicas que por sua vez aludem a outras mais latentes, desconhecidas.
«O que é o ser constitui a pergunta incessante do filosofar. O ser enquanto ser determinado é cognoscível. As categorias mostram as formas fundamentais em que está determinado. Sua representação na lógica deixa ver expressamente as formas ou modos do ser: o ser como ser conhecido e como ser pensado se faz objetivo em suas ramificações e em sua multiplicidade. Mas com isso o ser não está esgotado por completo.
Se quero saber o que é o ser: tanto mais claramente se mostra o extravio do ser para mim quanto mais inexoravelmente prossigo perguntando e quanto menos me deixo enganar por qualquer imagem construtiva do ser. Nunca tenho o ser senão que sempre tenho um ser. O ser se reduz à vazia determinação da afirmação na cópula «é» como função unívoca e indeterminável que notifica sua presença, mas sem converter-se nunca de modo consistente em um conceito que abrangesse a todo ser no que tenha de comum, nem numa totalidade de algo interior, menos ainda num ser especifico, que possuísse a condição sobre-excelente de ser a origem de tudo. Se pretenda conceber o ser como ser, fracasso inexoravelmente.
Em nenhuma parte tenho o ser. Não importa onde, tropeço sempre com limites, movido por aquilo que está vinculado à minha liberdade porque a liberdade mesma é busca do ser. Se não o busco é como se eu mesmo cessara de ser. Pareço encontrá-lo na «historicidade» concreta de minha existência empírica ativa e, sem embargo, tenho que vê-lo me escapando constantemente quando quero agarrá-lo filosofando» (K. Jaspers, Filosofia, II. Madrid 1958, pp. 335-336).