Trawny (2017b:C1) – No universal de tecnologia, capital e meio [TCM]

Temos a tendência de presumir que o mundo poderia ser diferente, tanto no que diz respeito à nossa vida pessoal quanto à coletiva. Acreditamos que a vida não é uma questão de destino; ela pode ser mudada. O indivíduo é autodeterminante. As noções de revolução e utopia também se baseiam na ideia de que o estado atual das coisas é produto do acaso — que se apenas tomássemos as coisas em nossas próprias mãos…

O que pressupomos aqui é uma liberdade que parece nos tornar responsáveis não apenas por nossas próprias ações, mas também pelo estado do mundo. Nossa vida moral e nossa concepção de lei dependem dela, e o significado da política, da democracia, baseia-se nela.

A ideia de que essa liberdade existe, entretanto, é problemática. As condições e pré-condições de nosso pensamento e ação não são, de forma alguma, tão neutras e contingentes que possam gerar um mundo diferente daquele em que nos encontramos. Não há mundos possíveis. O que é, é necessário, como é.

O filósofo que elaborou essa percepção foi Spinoza, e seu pensamento informa o meu no que se segue. Foi Spinoza quem explicou que a contingência não existe e que a liberdade humana consiste apenas em não estar ciente das condições e pré-condições de nosso pensamento e ação. Liberdade é ignorância.

Em outras palavras: estamos constantemente cercados de possibilidades. Todas as possibilidades estão abertas para nós; elas não poderiam deixar de ter sido e não poderiam deixar de estar abertas para nós. De acordo com a ontologia universal constituída pela tecnologia, pelo capital e pelo meio, elas não podem deixar de estar abertas para nós. No universal de tecnologia, capital e meio (TCM), todas as possibilidades são reunidas e armazenadas. Esse TCM universal é a possibilidade absoluta. Não há mundos possíveis; este mundo é sempre a possibilidade absoluta. O TCM é o universal da liberdade.

(TRAWNY, Peter. On freedom: technology, capital, medium. Richard Lambert. London New York (N.Y.): Bloomsbury academic, 2017b)