Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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visão prévia

quarta-feira 13 de dezembro de 2023

Vorsicht  

Tudo o que está à mão sempre já se compreende a partir da totalidade conjuntural. Esta, no entanto, não precisa ser apreendida explicitamente numa interpretação temática. Mesmo quando percorrida por uma interpretação, ela se recolhe novamente numa compreensão implícita. E é justamente nesse modo que ela se torna fundamento essencial da interpretação cotidiana da circunvisão. Essa sempre se funda numa posição prévia. Ao apropriar-se da compreensão, a interpretação se move em sendo compreensivamente para uma totalidade conjuntural já compreendida. A apropriação do compreendido, embora ainda velado, sempre cumpre o desvelamento guiada por uma visão que fixa o parâmetro na perspectiva do qual o compreendido há de ser interpretado. A interpretação funda-se sempre numa VISÃO PRÉVIA, que “recorta” o que foi assumido na posição prévia, segundo uma possibilidade determinada de interpretação. O compreendido, estabelecido numa posição prévia e encarado numa “visão previdente” (vorsichtig) torna-se conceito através da interpretação. A interpretação pode haurir conceitos pertencentes ao ente a ser interpretado a partir dele mesmo, ou então forçar conceitos contra os quais o ente pode resistir em seu modo de ser. Como quer que seja, a interpretação sempre já se decidiu, definitiva ou provisoriamente, por uma determinada conceituação, pois está fundada numa concepção prévia. STMSC: §32

A interpretação de algo como algo funda-se, essencialmente, numa posição prévia, VISÃO PRÉVIA e concepção prévia. A interpretação nunca é apreensão de um dado preliminar, isenta de pressuposições. Se a concreção da interpretação, no sentido da interpretação textual exata, se compraz em se basear nisso que “está” no texto, aquilo que, de imediato, apresenta como estando no texto nada mais é do que a opinião   prévia, indiscutida e supostamente evidente, do intérprete. Em todo princípio de interpretação, ela se apresenta como sendo aquilo que a interpretação necessariamente já “põe”, ou seja, que é preliminarmente dado na posição prévia, VISÃO PRÉVIA e concepção prévia. STMSC: §32

O conceito de sentido abrange o aparelhamento formal   daquilo que pertence necessariamente ao que é articulado pela interpretação que compreende. Sentido é a perspectiva na qual se estrutura o projeto pela posição prévia, VISÃO PRÉVIA e concepção prévia. É a partir dela que algo se torna compreensível como algo. Como compreender e interpretação constituem existencialmente o ser do pre [das Da  ], o sentido deve ser concebido como o aparelhamento existencial-formal da abertura pertencente ao compreender. Sentido é um existencial da presença [Dasein  ] e não uma propriedade colada sobre o ente, que se acha por “detrás” dele ou que paira não se sabe onde, numa espécie de “reino intermediário”. A presença [Dasein] só “tem” sentido na medida em que a abertura do ser-no-mundo pode ser “preenchida” por um ente que nela se pode descobrir. Somente a presença [Dasein] pode ser com sentido ou sem sentido. Isso significa: o seu próprio ser e o ente que se lhe abre podem ser apropriados na compreensão ou recusados na incompreensão. STMSC: §32

Mas, ver nesse círculo um vício, buscar caminhos para evitá-lo e também “senti-lo” apenas como imperfeito inevitável, significa um mal-entendido de princípio acerca do que e compreender. Não se trata de equiparar compreender e interpretação a um ideal   de conhecimento, que determinado em si mesmo não passa de uma degeneração e que, na tarefa devida de apreender o ser simplesmente dado, perdeu-se na incompreensão de sua essência. Para se preencher as condições fundamentais de uma interpretação possível, não se deve desconhecer as suas condições essenciais de realização. O decisivo não e sair do círculo, mas entrar no círculo de modo adequado. Esse círculo do compreender não e um cerco em que se movimenta qualquer tipo de conhecimento. Ele exprime a estrutura-prévia existencial, própria da presença [Dasein]. O círculo não deve ser rebaixado a um vitiosum, mesmo que apenas tolerado. Nele se esconde a possibilidade positiva do conhecimento mais originário que, decerto, só pode ser apreendida de modo autêntico se a interpretação tiver compreendido que sua primeira, única e última tarefa e de não se deixar guiar, na posição prévia, VISÃO PRÉVIA e concepção prévia, por conceitos populares e inspirações. Na elaboração da posição prévia, da VISÃO PRÉVIA e concepção prévia, ela deve assegurar o tema científico a partir das coisas elas mesmas. Porque, de acordo com seu sentido existencial, compreender e o poder-ser da própria presença [Dasein]; as pressuposições ontológicas do conhecimento histórico ultrapassam, em princípio, a ideia de rigor das ciências mais exatas. A matemática não e mais rigorosa do que a história. E apenas mais restrita, no tocante ao âmbito dos fundamentos existenciais que lhe são relevantes. STMSC: §32

Reunindo esses três significados de “enunciado” numa visão unitária de todo o fenômeno, teremos a seguinte definição: o enunciado é um mostrar a partir de si mesmo e por si mesmo, que determina e comunica. Todavia, ainda é preciso perguntar: com que direito entendemos o enunciado como modo de interpretação? Nesse caso, as estruturas essenciais da interpretação devem reaparecer no enunciado. O mostrar a partir de si mesmo e por si mesmo no enunciado se dá com base no que já se abriu no compreender e descobriu na circunvisão. O enunciado não paira no ar, desligado e solto, a ponto de poder por si mesmo abrir pela primeira vez o ente como tal; mas já se detém no ser-no-mundo. O que antes se esclareceu a respeito do conhecimento do mundo vale também para o enunciado. O enunciado necessita de uma posição prévia do que se abriu, a fim de mostrá-lo a partir de si mesmo e por si mesmo segundo os modos de determinação. Ademais, já reside no ponto de partida da determinação uma perspectiva orientada para o que se vai enunciar. A perspectiva a partir da qual se encara o ente preliminarmente dado assume, no processo de determinação, a função de determinante. O enunciado necessita de uma VISÃO PRÉVIA que desloque, por assim dizer, o predicado a ser explicitado e indicado, incluindo-o implicitamente no próprio ente. Uma articulação do significado daquilo que se mostra a partir de si mesmo e por si mesmo pertence ao enunciado enquanto comunicação determinante. É por isso que ela se move numa determinada conceituação: o martelo é pesado, o peso é do martelo, o martelo tem a propriedade de ser pesado. A concepção prévia sempre presente em todo enunciado permanece, na maior parte das vezes, sem surpresas, pois toda língua já guarda em si uma conceituação elaborada. Tanto o enunciado quanto a interpretação têm necessariamente seus fundamentos existenciais numa posição prévia, VISÃO PRÉVIA e concepção prévia. STMSC: §33

O ente sustentado na posição prévia, por exemplo, o martelo, numa primeira aproximação, está à mão como um instrumento. Se ele se torna “objeto” de um enunciado, já se realiza previamente com o enunciado proposicional uma mudança na posição prévia. Aquilo com que lidava manualmente o fazer, isto é, a execução, torna-se aquilo “sobre” o que o enunciado mostra. A VISÃO PRÉVIA visa a algo simplesmente dado no que está à mão. Através da visualização e para ela o manual vela-se como manual. Dentro deste descobrir do ser simplesmente dado que encobre a manualidade, determina-se o encontro de tudo que é simplesmente dado, em seu modo de dar-se. Só agora é que se abre o acesso às propriedades. O conteúdo com que o enunciado determina algo simplesmente dado é haurido do ser simplesmente dado como tal. A estrutura-”como” da interpretação modificou-se. O “como” já não basta para cumprir a função de apropriar-se do que se compreende numa totalidade conjuntural. No tocante às suas possibilidades de articular relações de remissão, o “como” separou-se da significância constitutiva do mundo circundante. O “como” é forçado a revelar-se com o ser simplesmente dado. Afunda-se na estrutura de mera visão que determina o simplesmente dado. A vantagem do enunciado consiste nesse nivelamento que transforma o “como” originário da interpretação, guiada pela circunvisão, no “como” de uma determinação do que é simplesmente dado. Somente assim o enunciado adquire a possibilidade de pura visualização demonstrativa. STMSC: §33

Investigação ontológica é um modo possível de interpretação. Esta foi caracterizada como elaboração e apropriação de uma compreensão. Toda interpretação possui sua posição prévia, VISÃO PRÉVIA e concepção prévia. No momento em que, enquanto interpretação, se torna tarefa explícita de uma pesquisa, então o conjunto dessas “pressuposições”, que denominamos de situação hermenêutica, necessita de um esclarecimento prévio que, numa experiência fundamental, assegure para si o “objeto” a ser explicitado. Uma interpretação ontológica deve liberar o ente na constituição de seu próprio ser. Para isso, vê-se obrigada, numa primeira caracterização fenomenal, a conduzir o ente tematizado a uma posição prévia pela qual se deverão ajustar todos os demais passos da análise. Estes, porém, devem ser orientados por uma possível VISÃO PRÉVIA do modo de ser dos entes considerados. Posição prévia e VISÃO PRÉVIA, portanto, já delineiam, simultaneamente, a conceituação (concepção prévia) para a qual se devem dirigir todas as estruturas ontológicas. STMSC: §45

Uma interpretação ontológica originária, no entanto, não exige somente uma situação hermenêutica segura e ajustada aos fenômenos, mas deve assegurar-se, explicitamente, de ter levado todo o ente tematizado à sua posição prévia. Também não é suficiente uma descrição preliminar do ser desse ente, mesmo que fundada em bases fenomenais. A VISÃO PRÉVIA do ser deve respeitar-lhe, sobretudo, a unidade dos momentos estruturais possíveis e pertinentes. Só então é que se pode colocar e responder com segurança fenomenal a questão do sentido da unidade da totalidade ontológica de todo o ente. STMSC: §45

Como é a VISÃO PRÉVIA que, até aqui, orientou o procedimento ontológico? Determinamos a ideia de existência como o poder-ser que compreende, e onde está em jogo seu próprio ser. Sendo porém sempre meu, o poder-ser é livre para a propriedade e a impropriedade ou ainda para um modo de indiferença. Tomando como ponto de partida a cotidianidade mediana, a interpretação limitou-se à análise da existência indiferente e imprópria. Na verdade, por essa via, foi possível e necessário alcançar uma determinação concreta da existencialidade da existência. Entretanto, a caracterização ontológica da constituição existencial ainda guardou uma falta essencial. Existência significa poder-ser, mas também um poder-ser próprio. Enquanto não se incorporar a estrutura existencial do poder-ser próprio à ideia de existência, a VISÃO PRÉVIA, orientadora de uma interpretação existencial, ressentir-se-á de originariedade. STMSC: §45

Um método autêntico funda-se numa VISÃO PRÉVIA adequada da constituição fundamental e do âmbito do “objeto” a se abrir. STMSC: §61

Originariamente, ou seja, no tocante a seu poder-ser todo em sentido próprio, a presença [Dasein] já se acha na posição prévia; mediante o esclarecimento do poder-ser mais próprio, ganhou determinação a VISÃO PRÉVIA orientadora, isto é, a ideia de existência; com a elaboração concreta da estrutura ontológica da presença [Dasein], torna-se de tal modo clara a sua especificidade ontológica frente a todo e qualquer ser simplesmente dado que a concepção prévia da existencialidade da presença [Dasein] adquire articulação suficiente para orientar, com segurança, a elaboração conceituai dos existenciais. STMSC: §63

A propriedade do poder-ser-si-mesma garante, para a VISÃO PRÉVIA, a existencialidade originária que, por sua vez, assegura uma conceitualização existencial adequada. STMSC: §63