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quarta-feira 13 de dezembro de 2023
Gewesen = ter SIDO; Gewesenheit = vigor de ter SIDO
A decisão antecipadora compreende a presença [Dasein] em seu ser-e-estar em dívida essencial. Este compreender diz assumir, na existência, o ser e estar em dívida, diz ser-fundamento lançado do nada. Assumir o estar-lançado significa, porém, ser, em sentido próprio, a presença [Dasein], no modo em que ela sempre já foi. Só é possível assumir o estar-lançado na medida em que a presença [Dasein] por vir possa ser “como já sempre foi”, no sentido mais próprio, isto é, possa ser o seu “ter SIDO”. Somente enquanto a presença [Dasein] é como eu sou o ter-SIDO é que ela, enquanto porvir, pode vir-a-si de maneira a vir de volta. Própria e porvindoura, a presença [Dasein] é propriamente o ter SIDO. Antecipar da possibilidade mais própria e extrema é vir de volta, em compreendendo, para o ter SIDO mais próprio. A presença [Dasein] só pode ser o ter SIDO sendo por-vindoura. O vigor de ter SIDO surge, de certo modo, do porvir. STMSC: §65
Vindo-a-si mesma num porvir, a decisão atualiza-se na situação. O vigor de ter SIDO surge do porvir e isso de tal maneira que o porvir do ter SIDO (melhor, do que tem SIDO) deixa vir-a-si a atualidade. Chamamos de temporalidade este fenômeno unificador do porvir que atualiza o vigor de ter SIDO. Somente determinada como temporalidade é que a presença [Dasein] possibilita para si mesma o poder-ser toda em sentido próprio da decisão antecipadora. Temporalidade desvela-se como o sentido da cura propriamente dito. STMSC: §65
O anteceder-a-si-mesma funda-se no porvir. O já-ser-em… anuncia em si o vigor de ter SIDO. O ser-junto-a encontra sua possibilidade na atualização. O que foi dito não permite, de modo algum, apreender o “ante” de “anteceder” (Vor im Vorweg) e o “já” de “já-ser-em” a partir da compreensão vulgar de tempo. O “ante” (Vor) não significa o “antes” no sentido de “agora-ainda-não, mas depois”; da mesma forma, o “já” não significa um “agora-não-mais, mas antes”. Se estas expressões “ante” (Vor) e “já” possuíssem este significado temporal, que aliás também podem possuir, então com temporalidade da cura estar-se-ia dizendo que cura é alguma coisa que se dá “antes” e “depois”, “ainda não” e “não mais”. Nesse caso, a cura seria concebida como um ente que ocorre e transcorre “no tempo”. O ser de um ente com caráter de presença [Dasein] tornar-se-ia, portanto, algo simplesmente dado. Se isso é impossível, então o significado temporal das expressões mencionadas deve ser outro. “Ante” (Vor) e “anteceder” (vorweg) indicam o porvir que, como tal, os possibilita, de maneira que possa dar-se um ente em que está em jogo seu poder-ser. O projetar-se “em virtude de si-mesmo”, fundado no porvir, é um caráter essencial da existencialidade. O seu sentido primário é o porvir. STMSC: §65
Do mesmo modo, o “já” (Schon) significa o sentido ontológico, existencial e temporal de um ente que, em sendo, já é sempre lançado. Somente porque a cura se funda no vigor de ter SIDO é que a presença [Dasein], enquanto ente-lançado, pode existir. “Enquanto” existe faticamente, a presença [Dasein] nunca é passado mas sempre o ter SIDO, no sentido de “eu sou o ter SIDO”. E ela só pode ser o ter SIDO, enquanto ela é. Em contraposição, chamamos de passado o ente que não é mais simplesmente dado. Por isso, a presença [Dasein], em existindo, nunca pode ser constatada como um fato simplesmente dado que surge e passa “com o tempo” e, aos poucos, torna-se passado. Ela sempre só “se encontra” como fato-lançado. Na disposição, a própria presença [Dasein] sobrevém-a-si como o ente que, ainda sendo, já foi, ou seja, é contínua e constantemente o ter SIDO. O sentido existencial primário da facticidade reside no vigor de ter SIDO. Com as expressões “ante” (Vor) e “já” (Schon), a formulação da estrutura da cura indica o sentido temporal de existencialidade e facticidade. STMSC: §65
Em contrapartida, falta ainda uma indicação dessa espécie para o terceiro momento constitutivo da cura: o ser-decadente-junto-a… Isso não deve significar que a decadência não se fundaria também na temporalidade. Indica, sobretudo, que a atualização, na qual se funda primariamente a decadência das ocupações com o que está à mão e o ser simplesmente dado, também está incluída nos modos da temporalidade originária de porvir e vigor de ter SIDO. Decidida, a presença [Dasein] se recupera justamente da decadência a fim de ser e estar tanto mais propriamente “por aí” [»da«] no instante da situação, que se abriu. STMSC: §65
A temporalidade possibilita a unidade de existência, facticidade e decadência, constituindo, assim, originariamente, a totalidade da estrutura de cura. Os momentos da cura não podem ser ajuntados, somando os pedaços, bem como a própria temporalidade não pode se conjugar “com o tempo”, ajuntando porvir, vigor de ter SIDO e atualidade. A temporalidade não “é”, de forma alguma, um ente. Ela nem é. Ela se temporaliza. Porque não podemos deixar de dizer “temporalidade ‘é’ – o sentido da cura”, a “temporalidade, ‘é’ – determinada deste ou daquele modo”, isto se tornará compreensível após o esclarecimento da ideia do “é” e do ser em geral. A temporalidade temporaliza, e temporaliza nos modos possíveis de si mesma. São estes que possibilitam a pluralidade dos modos de ser da presença [Dasein], sobretudo, a possibilidade fundamental de existência própria e imprópria. STMSC: §65
Porvir [Zukunft], vigor de ter SIDO e atualidade mostram os caracteres fenomenais do “para si mesma”, “de volta para”, “deixar vir ao encontro de”. Os fenômenos para…, ao…, junto a… manifestam a temporalidade como o puro e simples ekstatikon. Temporalidade é o “fora de si” em si e para si mesmo originário. Chamaremos, pois, os fenômenos caracterizados de porvir, vigor de ter SIDO e atualidade, de ekstases da temporalidade. Ela, sobretudo, não é um ente que só sai de dentro de si. Mas a sua essência é temporalização na unidade das ekstases. O característico do “tempo” acessível à compreensão vulgar consiste, entre outras coisas, justamente em que, no tempo, o caráter ekstático da temporalidade originária é nivelado a uma pura sequência de agora, sem começo nem fim. De acordo com seu sentido existencial, esse nivelamento funda-se, porém, numa determinada temporalização possível, pela qual a temporalidade temporaliza impropriamente este “tempo”. Se, portanto, o “tempo” acessível à compreensibilidade da presença [Dasein] se comprova como não originário e, além disso, como oriundo da temporalidade própria, então justifica-se, segundo a sentença a potiori fit denominatio, a designação da temporalidade agora liberada como tempo originário. STMSC: §65
Enquanto existir, compreender é primariamente porvindouro, no poder-ser de qualquer projeto. Contudo, ele não se temporalizaria se não fosse temporal, isto é, se não fosse determinado, de modo igualmente originário, pelo vigor de ter SIDO e pela atualidade. Já esclarecemos, embora de modo grosseiro, que esta última ekstase também constitui o compreender impróprio. A ocupação cotidiana compreende-se a partir do poder-ser que lhe vem ao encontro num possível sucesso ou insucesso, relativo àquilo de que se ocupa. Ao porvir impróprio, ao aguardar, corresponde um ser próprio junto àquilo de que se ocupa. O modo ekstático desta atualidade que vem de encontro desvela-se quando se compara esta ekstase com o modo da temporalidade própria. Pertence ao antecipar da decisão uma atualidade segundo a qual a decisão abre uma situação. Na decisão não apenas se recupera a atualidade da dispersão nas ocupações imediatas como ela se mantém atrelada ao porvir e ao vigor de ter SIDO. Chamamos de instante a atualidade própria, isto é, a atualidade mantida na temporalidade própria. Este termo deve ser compreendido em sentido ativo como ekstase. Ele remete a retração da presença [Dasein] decidida, mas mantida na decisão, ao que de possibilidades e circunstâncias passíveis de ocupação vem ao encontro na situação. Fundamentalmente, o fenômeno do instante não pode ser esclarecido pelo agora. O agora é um fenômeno temporal que pertence ao tempo da intratemporalidade: o agora “em que” algo nasce, perece ou simplesmente se dá. “No instante”, nada pode ocorrer. Ao contrário, enquanto atualidade em sentido próprio, é o instante que deixa vir ao encontro o que, estando à mão ou sendo simplesmente dado, pode ser e estar “em um tempo”. STMSC: §68
O compreender impróprio temporaliza-se como um aguardar atualizante a cuja unidade ekstática pertence necessariamente um vigor de ter SIDO, que lhe corresponde. Em sentido próprio, o vira-si da decisão antecipadora é, conjuntamente, um voltar para o si-mesmo mais próprio, lançado em sua singularidade. Esta ekstase possibilita que a presença [Dasein] tenha condições de, decididamente, assumir o ente que ela já é. No antecipar, a presença [Dasein] se retoma previamente em seu poder-ser mais próprio. Chamamos de retomada o ser de maneira própria o ter SIDO. O projetar-se impróprio nas possibilidades hauridas e atualizantes nas ocupações só se torna possível caso a presença [Dasein] tenha esquecido a si, em seu poder-ser lançado mais próprio. Esse esquecer não é um nada negativo, nem simplesmente a falta de recordação, mas um modo próprio, “positivo” e ekstático do vigor de ter SIDO. A ekstase (retração) do esquecer tem o caráter de uma extração, fechada para si mesma, do vigor de ter SIDO em sentido mais próprio, de tal maneira que esse extrair-se de… fecha, ekstaticamente, aquilo de que se extrai e, com isso, a si mesmo. No sentido impróprio do vigor de ter SIDO, o esquecimento refere-se ao próprio ser e estar lançado; o esquecimento é o sentido temporal do modo de ser em que, numa primeira aproximação e na maior parte das vezes, eu, tendo SIDO, sou. E somente com base nesse esquecimento é que a atualização que aguarda as ocupações pode reter e guardar o ente, não dotado do caráter de presença [Dasein], que vem ao encontro no mundo circundante. A esse reter corresponde um não-reter que apresenta, por sua vez, um “esquecer” em sentido derivado. STMSC: §68
Assim como a espera só é possível com base no aguardar, também a recordação só é possível com base no esquecer e não o contrário; pois, no modo do esquecimento, o vigor de ter SIDO “abre”, primariamente, o horizonte em que a presença [Dasein], perdida na “exterioridade” das ocupações, pode recordar-se. O aguardar que atualiza e esquece é uma unidade ekstática própria onde a compreensão imprópria se temporaliza em sua temporalidade. A unidade destas ekstases fecha o poder-ser próprio sendo, com isso, a condição existencial de possibilidade da indecisão. Embora o compreender impróprio das ocupações se determine pela atualização daquilo de que se ocupa, é primariamente no porvir que o compreender se temporaliza. STMSC: §68
Aviando e desviando da própria presença [Dasein], o humor realiza aberturas. Existencialmente, só é possível colocar-se diante desse que (se é) do próprio estar-lançado – seja desvelando com propriedade ou encobrindo com impropriedade – quando o ser da presença [Dasein], de acordo com seu sentido, é constantemente o vigor de ter SIDO. O colocar-se diante deste ente-lançado, que impessoalmente se é, não cria o vigor de ter SIDO. A sua ekstase é que possibilita o encontrar-se como disposição. O compreender funda-se, primariamente, no porvir, ao passo que a disposição se temporaliza, primariamente, no vigor de ter SIDO. Humor temporaliza-se, ou seja, a sua ekstase específica pertence a um porvir e a uma atualidade mas de tal forma que o vigor de ter SIDO modifica as ekstases igualmente originárias. STMSC: §68
Já salientamos que os humores, não obstante conhecidos do ponto de vista ôntico, não são reconhecidos em sua função existencial originária. São considerados vivências fugazes que “dão cor” a todo o “estado d’alma”. O que, para uma simples observação, não passa de um aparecer e desaparecer fugaz pertence, no entanto, à consistência originária da existência. Mas o que pode haver de comum entre os humores e o “tempo”? Que estas “vivências” vêm e vão, que elas transcorrem “no tempo”, é uma constatação trivial; sem dúvida, e, na verdade, uma constatação ôntico-psicológica. A tarefa consiste, porém, em demonstrar a estrutura ontológica da afinação do humor em sua concreção existencial e temporal. Numa primeira aproximação, isso pode apenas significar: tornar visível, ao menos uma vez, a temporalidade do humor. A tese segundo a qual “disposição funda-se, primariamente, no vigor de ter SIDO” diz que o caráter existencial básico do humor é uma recolocação em… A recolocação não produz o vigor de ter SIDO, mas a disposição sempre revela, para a análise existencial, um modo do vigor de ter SIDO. A interpretação temporal da disposição não pode, portanto, pretender deduzir os humores da temporalidade e dissolvê-los em puros fenômenos de temporalização. Trata-se apenas de comprovar que os humores, no que e no modo em que “significam” existenciariamente, só são possíveis com base na temporalidade. A interpretação temporal limitar-se-á aos fenômenos já analisados do medo e da angústia. STMSC: §68
Começaremos a análise com a demonstração da temporalidade do medo. Caracterizou-se o medo como disposição imprópria. Em que medida o vigor de ter SIDO é o sentido existencial que o possibilita? Que modo desta ekstase caracteriza a temporalidade específica do medo? Medo é ter medo do que ameaça. Trata-se do que se aproxima prejudicialmente, como já descrito, do poder-ser fático da presença [Dasein], no âmbito do que está à mão e do que é simplesmente dado nas ocupações. No modo da circunvisão cotidiana, o ter medo abre algo que ameaça. Um sujeito meramente espectador nunca poderia descobrir algo assim. Mas não será esta abertura de ter medo de alguma coisa um deixar vir-a-si? Não é correta a determinação do medo como espera de um mal que está vindo (malum futurum)? Não será o sentido temporal primário do medo tanto o porvir como o vigor de ter SIDO? Indiscutivelmente, o medo não apenas se “relaciona” com o que “está por vir”, entendido como o que só advém “no tempo”, mas também esse relacionar-se, em si mesmo, já está por vir, no sentido do tempo originário. Sem dúvida, também pertence à constituição existencial e temporal do medo um aguardar. Mas, de início, isso diz apenas que a temporalidade do medo é imprópria. Será que ter medo de alguma coisa é apenas esperar uma ameaça em advento? Esperar uma ameaça em advento ainda não precisa ser medo, e é tão pouco medo que lhe falta justamente o caráter do humor específico do medo. Este reside em que o aguardar próprio ao medo deixa e faz com que aquilo que ameaça volte para o poder-ser fático, empenhado em ocupações. Só no aguardar é que o que ameaça pode estar de volta para o ente que eu sou e, dessa forma, a presença [Dasein] só pode ser ameaçada caso já se tenha aberto, ekstaticamente, o para onde volta. O caráter de humor e afecção do medo reside em que o aguardar medroso tem medo “de si mesmo”, isto é, em que todo ter medo de alguma coisa é um ter medo por… O seu sentido existencial e temporal constitui-se por um esquecer-se de si: qual seja, extrair-se, de forma conturbada, do poder-ser fático em sentido próprio; é nesse esquecer que o ser-no-mundo ameaçado se ocupa do que está à mão. É com razão que Aristóteles determina o medo como lype tis he tarache, aflição e conturbação. A aflição pressiona a presença [Dasein] no sentido de voltar para o seu estar-lançado mas de tal maneira que justamente este estar-lançado se fecha. Já a conturbação funda-se num esquecer. O extrair-se no esquecimento de um poder-ser fático e decidido baseia-se nas possibilidades de salvação e escape previamente descobertas numa circunvisão. Porque se esquece de si e não apreendendo nenhuma possibilidade determinada, a ocupação que se teme salta do mais próximo para o mais próximo. Com isso, todas as possibilidades “possíveis” e impossíveis se oferecem. Aquele que tem medo não se detém em nenhuma delas; o “mundo circundante” não desaparece, ao contrário, lhe vem ao encontro justamente nesse não-mais-se-reconhecer no mundo circundante. Essa atualização conturbada do que é melhor por ser o mais próximo pertence ao esquecimento de si, inerente ao medo. É sabido que o habitante de uma casa em chamas, por exemplo, frequentemente, quer “salvar” as coisas mais indiferentes por estarem mais imediatamente à mão. A atualização esquecida de si de uma confusão de possibilidades soltas possibilita a conturbação do medo que, como tal, lhe constitui o caráter específico de humor. O esquecimento inerente à conturbação também modifica o aguardar, caracterizando-o como um aguardar aflito e conturbado por oposição a uma pura espera. STMSC: §68
A unidade ekstática específica que, do ponto de vista existencial, possibilita o ter medo temporaliza-se, primariamente, a partir do esquecimento acima caracterizado que, enquanto modo do vigor de ter SIDO, lhe modifica tanto a atualidade quanto o porvir, em sua temporalização. A temporalidade do medo é um esquecer que aguarda e atualiza. Orientada para o que vem ao encontro dentro do mundo, a interpretação que compreende o medo busca, de início, o seu referente no “mal que está vindo” e determina, correspondentemente, como espera a relação que com ele estabelece. Tudo o que, além disso, pertence ao fenômeno fica sendo um “sentimento de prazer e desprazer”. STMSC: §68
A insignificância do mundo, aberta na angústia, desvela a nulidade das ocupações, a impossibilidade de projetar-se um poder-ser da existência primariamente fundado na ocupação. Desvelar essa impossibilidade significa, porém, deixar vir à luz a possibilidade de um poder-ser próprio. Que sentido temporal possui esse desvelar? A angústia angustia-se pela presença [Dasein] nua e crua, enquanto lançada na estranheza. Ela recoloca o puro que (se é) do estar-lançado mais próprio e singular. Esse recolocar não tem o caráter de um esquecer que se esquiva e nem tampouco de uma recordação. A angústia, porém, também não implica um assumir que retoma a existência na decisão. A angústia, bem ao contrário, recoloca o estar-lançado enquanto possível de ser retomado. E isso a tal ponto que ela também desvela a possibilidade de um poder-ser próprio que, entendido como porvindouro, deve retornar, na retomada, para o “pre” [das Da] que está lançado. Colocar-se diante da possibilidade de retomada é o modo ekstático específico do vigor de ter SIDO, constitutivo da disposição da angústia. STMSC: §68
A possibilidade de apoderar-se, que distingue o humor da angústia, comprova-se na temporalidade específica da angústia por ela fundar-se, originariamente, no vigor de ter SIDO e porque somente a partir dele é que se temporalizam porvir e atualidade. Nele, a presença [Dasein] retoma inteiramente a nudez de sua estranheza e é por ela possuída. Esta possessão não só toma de volta a presença [Dasein] das possibilidades “mundanas”, mas também lhe dá a possibilidade de um poder-ser próprio. STMSC: §68
Ambos os humores do medo e da angústia, no entanto, nunca “ocorrem” apenas isoladamente no “fluxo das vivências”, mas sempre de-terminam o humor de um compreender ou de-terminam para si o humor a partir de um compreender. O medo encontra seu ensejo nos entes que vêm ao encontro no mundo circundante. A angústia, ao contrário, surge da própria presença [Dasein]. O medo sobrevêm a partir do intramundano. A angústia cresce a partir do ser-no-mundo enquanto ser-lançado-para-a-morte. Em seu sentido temporal, este “crescer” da angústia, a partir da própria presença [Dasein], significa que o porvir e a atualidade da angústia se temporalizam a partir de um vigor de ter SIDO originário, entendido como recolocar a possibilidade de retomada. A angústia, no entanto, só pode “crescer” propriamente numa presença [Dasein] decidida. Embora o decidido desconheça o medo, ele compreende precisamente a possibilidade de angústia como possibilidade do humor que nem inibe e nem conturba. Ao contrário, libera de possibilidades “nulas”, tornando-o livre para as possibilidades próprias. STMSC: §68
Embora ambos os modos da disposição, medo e angústia, estejam fundidos primariamente num vigor de ter SIDO, na totalidade da cura, a sua temporalização própria tem, cada vez, uma origem diferente. A angústia surge do porvir da decisão. O medo surge da atualidade perdida que, medrosamente, tem medo do medo, para então nele decair. STMSC: §68
Mas será que, talvez, a tese da temporalidade dos humores não valha apenas no caso dos fenômenos escolhidos para a análise? Como se pode encontrar um sentido temporal na morna ausência de humores que domina o “cotidiano cinzento”? E o que dizer da temporalidade dos humores e afetos como esperança, alegria, encantamento e jovialidade? Que não apenas o medo e a angústia mas também outros fenômenos estão existencialmente fundados num vigor de ter SIDO, isso se mostra, claramente, quando nomeamos fenômenos tais que tédio, tristeza, melancolia e desespero. Sem dúvida, sua interpretação deve fazer-se com base numa analítica mais ampla da presença [Dasein], elaborada existencialmente. Mas também um fenômeno como a esperança, que parece totalmente fundada no porvir, deve ser analisado de forma correspondente à análise do medo. Em oposição ao medo, que se relaciona a um malum futurum, costuma-se caracterizar a esperança como espera de um bonum futurum. Para a estrutura do fenômeno, porém, o decisivo não é tanto o caráter “futuro” daquilo a que a esperança está relacionada mas, sobretudo, o sentido existencial do próprio ter esperança. Também aqui o caráter de humor reside, primariamente, em ter esperança enquanto ter esperança-para-si. Aquele que tem esperança carrega, por assim dizer, a si mesmo para dentro da esperança, contrapondo-se ao que é esperado. Isso pressupõe, no entanto, um ter-se-conquistado. Que a esperança, em oposição ao medo que abate, alivia diz apenas que também essa disposição permanece referida ao peso de uma carga, no modo de ser o ter SIDO. Do ponto de vista ontológico, o humor exaltado, ou melhor, exaltante só é possível numa remissão ekstático-temporal da presença [Dasein] ao fundamento-lançado de si mesma. STMSC: §68
Por fim, o que demonstra, da forma mais penetrante, o poder do esquecer nos humores cotidianos da ocupação imediata é a morna ausência de humor na indiferença. Pois esta não se prende nem força nada, abandona-se a tudo que cada dia lhe apresenta, aceitando, assim, de certo modo, tudo. Este ir levando a vida, que “deixa tudo ser” como é, funda-se num esquecer que se abandona ao estar-lançado, possuindo o sentido ekstático de um vigor de ter SIDO, impróprio. Deve-se distinguir com precisão a indiferença, que pode acompanhar a sucessão desenfreada de tarefas, da equanimidade. Este humor surge da decisão. Esta se concentra no instante das possíveis situações do poder-ser todo, que se abre no antecipar para a morte. STMSC: §68
Afetado pode ser somente aquele ente que, de acordo com seu sentido ontológico, se dispõe, isto é, que, existindo, já é sempre o vigor de ter SIDO e existe num modo constante do vigor de ter SIDO. Do ponto de vista ontológico, a afecção pressupõe a atualização e isso de tal maneira que, nela, a presença [Dasein] pode ser recolocada em si mesma enquanto o que já é o vigor de ter SIDO. Permanece um problema independente o modo em que se deve delimitar, ontologicamente, estímulo e contato dos sentidos em algo apenas-vivo, e o modo, por exemplo, como e onde o ser dos animais é constituído por um “tempo”. STMSC: §68
A interpretação temporal de compreender e disposição deparou-se não apenas com a ekstase primária referente a cada fenômeno mas também com toda a temporalidade. Da mesma forma que o porvir possibilita primariamente o compreender e o vigor de ter SIDO possibilita o humor, o terceiro momento estrutural da cura, a decadência, encontra seu sentido existencial na atualidade. A análise preparatória da decadência teve início com a interpretação da falação, da curiosidade e da ambiguidade. A análise temporal da decadência deve seguir o mesmo caminho. Contudo, a investigação se limitará em considerar a curiosidade porque é nela que se pode ver, mais facilmente, a temporalidade específica da decadência. A análise da falação e da ambiguidade, por sua vez, já pressupõe o esclarecimento da constituição temporal da fala e da significação (da interpretação). STMSC: §68
A curiosidade é uma tendência ontológica privilegiada da presença [Dasein], segundo a qual ela se ocupa de um poder-ver. Tanto o “ver” quanto o conceito de visão não se restringem à percepção propiciada pelos “olhos do corpo”. Em sentido amplo, a percepção deixa vir ao encontro “corporalmente” em si mesmos o que está à mão e o ser simplesmente dado, no tocante ao seu aspecto. Esse deixar vir ao encontro funda-se numa atualidade. A atualidade fornece o horizonte ekstático no qual o ente pode ser corporalmente vigente. Entretanto, a curiosidade não atualiza o ser simplesmente dado a fim de, nele demorando-se, compreendê-lo. Ela busca ver apenas para ver e ter visto. Enquanto esta atualização presa em si mesma ao ser simplesmente dado, a curiosidade está numa unidade ekstática com um porvir e um vigor de ter SIDO correspondentes. A avidez do novo move-se, sem dúvida, em direção ao ainda-não-visto mas de tal maneira que a atualização tenta escapar do aguardar. A curiosidade é toda ela impropriamente porvindoura e isto a tal ponto que ela não aguarda uma possibilidade mas, em sua avidez, só cobiça a possibilidade como algo real. A curiosidade constitui-se de uma atualização que não se sustenta e, apenas atualizando, procura constantemente fugir do aguardar em que a atualização se “mantém” e se resguarda, embora insustentada. A atualidade “surge” da correspondente atualização que lhe pertence, no sentido mencionado de fuga. Mas a atualização em que “surge” a curiosidade se entrega tão pouco à “coisa” que, ao conquistar uma visão, já deixa de ver para ver a próxima. Do ponto de vista ontológico, o que possibilita o não demorar-se, característico da curiosidade, é a atualização que constantemente “surge” no aguardar a uma possibilidade apreendida e determinada. A atualização não “surge” do aguardar no sentido de que ela estaria onticamente desligada do aguardar para a ele se abandonar. O “surgir” é uma modificação ekstática do aguardar, de tal maneira que o aguardar ressurge da atualização. O aguardar abdica, por assim dizer, de si mesmo em não mais deixando que venham a si possibilidades impróprias da ocupação a partir daquilo de que se ocupa, à exceção daquelas que se oferecem para uma atualização que não se sustenta. A modificação ekstática do aguardar mediante a atualização que surge numa atualização que ressurge é a condição temporal e existencial da possibilidade de dispersão. STMSC: §68
No tocante a seu sentido temporal, os caracteres da decadência, anteriormente demonstrados, como tentação, tranquilização, alienação e auto-aprisionamento significam que a atualização que “surge” busca, de acordo com a sua tendência ekstática, temporalizar-se a partir de si mesma. A presença [Dasein] aprisiona-se – esta determinação possui um sentido ekstático. O retrair-se da existência na atualização não significa que a presença [Dasein] se desligue de seu eu e de seu si-mesmo. Mesmo na atualização mais extrema, ela permanece temporal, ou seja, aguardando e esquecendo. Mesmo atualizando, a presença [Dasein] ainda se compreende, embora alienada de seu poder-ser mais próprio, primariamente fundado no porvir e no vigor de ter SIDO, em sentido próprio. Sempre oferecendo algo “novo”, a atualização não deixa que a presença [Dasein] volte a si mesma, tranquilizando-a sempre de novo. Essa tranquilização, no entanto, fortalece a tendência para surgir. A curiosidade não é “provocada” pela visibilidade sem fim do que ainda não se viu mas pelo modo decadente de temporalização da atualidade que surge. Mesmo que tenha visto tudo, a curiosidade sempre inventa algo novo. STMSC: §68
O modo de temporalização em que a atualidade “surge” funda-se na essência da temporalidade, que é finita. Lançada no ser-para-a-morte, a presença [Dasein] foge, de início e na maior parte das vezes, desse estar-lançado, que se desvela de modo mais ou menos explícito. A atualidade surge de seu próprio porvir e vigor de ter SIDO para então deixar, pelo viés de si mesma, que a presença [Dasein] venha à existência própria. A origem em que a atualidade “surge”, isto é, em que a decadência cai na perdição, é a temporalidade originária e própria que, por sua vez, possibilita o ser-lançado-para-a-morte. STMSC: §68
O compreender funda-se, primariamente, no porvir (antecipar e aguardar). A disposição temporaliza-se, primariamente, no vigor de ter SIDO (retomada e esquecimento). A decadência enraíza-se, primária e temporalmente, na atualidade (atualização e instante). Não obstante, a compreensão é sempre atualidade “do vigor de ter SIDO”. Não obstante, a disposição se temporaliza num porvir “atualizante”. Não obstante, a atualidade “surge” ou se sustenta num porvir do vigor de ter SIDO. Assim, fica claro que: a temporalidade se temporaliza totalmente em cada ekstase, ou seja, a totalidade do todo estrutural de existência, facticidade e decadência funda-se na unidade ekstática de cada temporalização plena da temporalidade. Esta é a unidade estrutural da cura. STMSC: §68
Temporalização não significa “sucessão” de ekstases. O porvir não vem depois do vigor de ter SIDO, e este não vem antes da atualidade. A temporalidade se temporaliza num porvir atualizante do vigor de ter SIDO. STMSC: §68
A unidade ekstática da temporalidade, isto é, a unidade do “fora de si” nas retrações de porvir, vigor de ter SIDO e atualidade é a condição de possibilidade para que um ente possa existir como o seu “pre” [das Da]. O ente que carrega o título de presença [Dasein] É “iluminado”. A luz que constitui a luminosidade da presença [Dasein] não é uma força ou fonte ôntica simplesmente dada de uma clareza cintilante que, por vezes, ocorre neste ente. Antes de toda interpretação “temporal”, determinou-se como cura o que ilumina essencialmente esse ente, isto é, aquilo que o torna “aberto” e também “claro” para si mesmo. É na cura que se funda toda abertura do pre [das Da]. E é esta luminosidade que possibilita toda iluminação e esclarecimento, toda percepção, “visão” e posse de alguma coisa. A luz desta luminosidade só pode ser compreendida quando, ao invés de sairmos à busca de uma força simplesmente dada e implantada, questionarmos toda a constituição ontológica da presença [Dasein], ou seja, a cura, quanto ao fundamento unificador de sua possibilidade existencial. A temporalidade ekstática ilumina originariamente o pre [das Da]. Ela é o regulador primordial da unidade possível de todas as estruturas essencialmente existenciais da presença [Dasein]. STMSC: §69
O enraizamento da atualidade no porvir e no vigor de ter SIDO é a condição existencial e temporal de possibilidade para que aquilo que se projetou no compreender da compreensão, guiada por uma circunvisão, possa ser colocado mais perto numa atualização. E isto de tal forma que a atualidade se adéque ao que vem ao encontro no horizonte do reter que aguarda, ou seja, se deva interpretar segundo o esquema da estrutura-como. Com isso, responde-se à questão anteriormente colocada se a estrutura-como estabelece um nexo ontológico-existencial com o fenômeno do projeto. Da mesma maneira que o compreender e o interpretar em geral, o “como” funda-se na unidade ekstática e horizontal da temporalidade. Com a análise fundamental do ser, e esta no contexto da interpretação do “é”, que, como cópula, “exprime” o dizer de algo como algo, devemos tematizar mais uma vez o fenômeno do como e delimitar, existencialmente, o conceito de “esquema”. STMSC: §69
Determinamos o ser da presença [Dasein] como cura. Seu sentido ontológico é a temporalidade. Mostrou-se tanto que e como ela constitui a abertura do pre [das Da]. Na abertura do pre [das Da], abre-se conjuntamente o mundo. A unidade da significância, isto é, a constituição ontológica de mundo, também deve fundar-se, portanto, na temporalidade. A condição existencial e temporal da possibilidade de mundo reside em que a temporalidade, enquanto unidade ekstática, possui um horizonte. As ekstases não são simplesmente retrações para… A ekstase pertence, sobretudo, um “para onde” ela se retrai. Chamamos de esquema horizontal esse para onde da ekstase. O horizonte ekstático é diferente em cada uma das três ekstases. O esquema em que a presença [Dasein] vem a si no porvir, quer de modo próprio ou impróprio, é o estar em virtude de si. Apreendemos como o diante de que (Wovor) do estar-lançado e o para o que (Woran) do estar-entregue o esquema em que a presença [Dasein], lançada na disposição, abriu-se para si mesma. Este esquema caracteriza a estrutura horizontal do vigor de ter SIDO. Lançada e existindo em virtude de si na entrega a si mesma, a presença [Dasein], na condição de ser e estar junto a…, é, ao mesmo tempo, atualizante. É o ser-para que determina o esquema horizontal da atualidade. STMSC: §69
A unidade dos esquemas horizontais de porvir, vigor de ter SIDO e atualidade funda-se na unidade ekstática da temporalidade. O horizonte de toda a temporalidade determina aquilo na perspectiva de que o ente, existindo faticamente, se abre de modo essencial. Com a presença [Dasein] fática, um poder-ser está sempre lançado no horizonte do porvir, o “já-ser” está sempre aberto no horizonte do vigor de ter SIDO, e aquilo de que se ocupa já está sempre descoberto no horizonte da atualidade. É a unidade horizontal dos esquemas das ekstases que possibilita o nexo originário entre as remissões de ser-para e de ser em virtude de. Isto implica que: com base na constituição horizontal da unidade ekstática da temporalidade, algo como um mundo aberto pertence ao ente que, cada vez, é o seu pre [das Da]. STMSC: §69
Assim como, na unidade de temporalização da temporalidade, a atualidade surge do porvir e do vigor de ter SIDO, também o horizonte de uma atualidade se temporaliza, de modo igualmente originário, nos horizontes de porvir e vigor de ter SIDO. À medida que a presença [Dasein] se temporaliza, um mundo também é. Com referência a seu ser que se temporaliza como temporalidade, a presença [Dasein] é e está, essencialmente, “em um mundo”, com base na constituição ekstática e horizontal da temporalidade. O mundo não é algo à mão nem algo simplesmente dado. O mundo se temporaliza na temporalidade. Ele “é” “presença” [»da«] com o fora de si das ekstases. Se não existir presença [Dasein] alguma, também nenhum mundo se faz “pre”-sente [»da«]. STMSC: §69
A presença [Dasein] só se fez tema existindo, por assim dizer, “para frente”, deixando, com isso, “para trás” de si todo o ter SIDO. STMSC: §72
Em sentido rigorosamente ontológico, a presença [Dasein], que não mais existe, não é passada, mas o vigor de ter SIDO presença [Dasein]. STMSC: §73
As antiguidades ainda simplesmente dadas possuem um caráter “passado” e histórico, com base em sua pertinência instrumental e proveniência do ter SIDO de um mundo que pertence a uma presença [Dasein] que é o vigor de ter SIDO presença [Dasein]. STMSC: §73
Será a presença [Dasein] o ter SIDO apenas no sentido do vigor de ter SIDO presença [Dasein], ou será ela o ter SIDO enquanto atualizante e porvindouro, ou seja, na temporalização de sua temporalidade? STMSC: §73
Além disso, mostra-se que a determinação temporal de “passado” não tem um sentido unívoco, distinguindo-se, claramente, do vigor de ter SIDO, que aprendemos ser um constitutivo da unidade ekstática da temporalidade da presença [Dasein]. STMSC: §73
Com isso, acirra-se o enigma, por que justamente o “passado”, mais precisamente, o vigor de ter SIDO, determina prevalentemente o histórico, já que o vigor de ter SIDO se temporaliza, de modo igualmente originário, junto com a atualidade e o porvir. STMSC: §73
O ente que, em seu ser, é essencialmente porvir, de tal maneira que, livre para a sua morte, nela pode despedaçar-se e deixar-se relançar para a facticidade de seu pre [das Da] é um ente que, sendo porvir, é de modo igualmente originário o vigor de ter SIDO. STMSC: §74
A retomada é a transmissão explícita, ou seja, o retorno às possibilidades da presença [Dasein], que é o vigor de ter SIDO presença [Dasein]. STMSC: §74
A retomada própria do ter SIDO de uma possibilidade existencial – que a existência escolhe seus heróis – funda-se, existencialmente, na decisão antecipadora; pois é somente nela que se escolhe a escolha capaz de libertar a sucedaneidade na luta e a fidelidade a outras possibilidades de retomada. STMSC: §74
Não é, contudo, a transmissão passível de ser retomada de uma possibilidade em vigor que abre a presença [Dasein], enquanto vigor de ter SIDO presença [Dasein], numa nova realização. STMSC: §74
A retomada controverte a possibilidade da existência que é vigor de ter SIDO presença [Dasein]. STMSC: §74
Enquanto modo de ser da presença [Dasein], a história está tão essencialmente enraizada no porvir que a morte, enquanto a possibilidade caracterizada da presença [Dasein], relança a existência antecipadora para o seu estar-lançado fático, só então conferindo ao vigor de ter SIDO o seu primado característico na história. STMSC: §74
A partir dos fenômenos de transmissão e retomada, enraizados no porvir, tornou-se claro por que o acontecer da história em sentido próprio tem seu peso no vigor de ter SIDO. STMSC: §74
Na retomada, marcada pelo vigor de ter SIDO de um destino de possibilidades, a presença [Dasein] se recoloca “imediatamente” no ter SIDO antes dela, ou seja, no que é temporalmente ekstático. STMSC: §75
Ao contrário, estes surgem da temporalidade já estendida da retomada, porvindoura em seu ter SIDO. STMSC: §75
Cego para possibilidades, ele não é capaz de retomar o ter SIDO, mantendo e sustentando apenas o “real” que sobrou do vigor da história do mundo, as sobras e os anúncios simplesmente dados. STMSC: §75
Como o ser da presença [Dasein] é histórico, ou seja, com base na temporalidade ekstática e horizontal, já está aberto em seu vigor de ter SIDO, tem caminho livre a tematização do “passado” em geral, que pode cumprir-se na existência. E porque a presença [Dasein] e somente ela é originariamente histórica, aquilo que a tematização historiográfica apresenta como objeto possível de pesquisa deve ter o modo de ser da presença [Dasein] que vigora por ter SIDO presença [Dasein]. Com a presença [Dasein] fática, na condição de ser-no-mundo, também já se dá uma história do mundo. Se a presença [Dasein] não mais for presente, então o mundo ainda vigora por ter SIDO presença [Dasein]. Isso não é negado quando um manual intramundano de uma época anterior ainda não passou e pode ser encontrado “historiograficamente”, no presente, como algo de um mundo que vigora por ter SIDO presença [Dasein]. STMSC: §76
Restos, monumentos, relatos ainda dados constituem “material” possível para a abertura concreta da presença [Dasein] que vigora por ter SIDO presença [Dasein]. Estes só podem tornar-se material historiográfico porque, em seu próprio modo de ser, possuem o caráter de pertencer à história do mundo. E apenas se tornam material por serem previamente compreendidos em sua intramundanidade. O mundo já projetado determina-se pela interpretação do material “conservado” de uma história do mundo. A constatação, depuração e o asseguramento do material é que dão o passo rumo ao “passado”, mas eles já pressupõem o ser histórico para a presença [Dasein] que vigora por ter SIDO presença [Dasein], isto é, para a historicidade da existência do historiógrafo. E esta que funda, existencialmente, a historiografia como ciência, até mesmo nos dispositivos mais sutis e “artesanais”. STMSC: §76
Se, portanto, a historiografia se enraíza na historicidade, então é a partir desta que se pode determinar o objeto “próprio” da historiografia. A delimitação do tema originário da historiografia deve cumprir-se de acordo com a historicidade própria e com a abertura a ela inerente do que vigora por ter SIDO presença [Dasein], ou seja, com a retomada. Esta compreende a presença [Dasein] que vigora por ter SIDO presença [Dasein] no vigor de sua possibilidade. O “nascimento” da historiografia a partir da historicidade própria significa, então: a tematização primária do objeto histórico projeta a presença [Dasein] que vigora por ter SIDO presença [Dasein] em sua possibilidade mais própria de existir. Será, portanto, o possível tema da historiografia? Todo o seu sentido não reside, unicamente, nos “fatos”, isto é, no modo como de fato foi? STMSC: §76
Mas o que significa: presença [Dasein] é “de fato”? Se a presença [Dasein] só é “propriamente” real na existência, então a sua “fatualidade” se constitui justamente no projetar-se decidido para um poder-ser escolhido. O “fato” próprio do que vigora por ter SIDO presença [Dasein] é, então, a possibilidade existenciária em que, de fato, se determinam o destino, o envio comum e a história do mundo. Porque, cada vez, a existência sempre está lançada faticamente, a historiografia abrirá tanto mais penetrantemente a força silenciosa do possível quanto mais simples e concretamente ela compreender e “apenas” expuser o vigor de ter SIDO-no-mundo em sua possibilidade. STMSC: §76
Brotando da historicidade própria, a historiografia desvela, na retomada, a presença [Dasein] que vigora por ter SIDO presença [Dasein] em sua possibilidade. Nesse caso, ela também já revelou o “universal” no que é único. Já constitui um equívoco radical perguntar se a historiografia tem por objeto apenas a série dos dados únicos e “individuais” ou também as “leis”. Seu tema não é o que aconteceu uma única vez nem um universal que paira sobre a singularidade, mas a possibilidade que faticamente vigorou na existência. Esta não se retoma como tal, ou seja, não é compreendida de modo propriamente historiográfico, mesmo quando distorcida pela palidez de um padrão supratemporal. Enquanto destino decidido, somente a historicidade própria e fática é capaz de abrir a história que vigora por ter SIDO presença [Dasein]. E isso de tal modo que, na retomada, a “força” do possível ressoe na existência fática, isto é, advenha ao seu porvir. Tão pouco como a historicidade da presença [Dasein] não historiográfica, a historiografia não parte, de forma alguma, do “presente” e de uma “realidade” que só se dá hoje para, tateando, recuperar um passado. A abertura historiográfica também se temporaliza a partir do porvir. A “seleção” do que deve tornar-se objeto possível da historiografia já foi feita na escolha existenciária e fática da historicidade da presença [Dasein], onde somente a historiografia surge e unicamente é. STMSC: §76
Somente porque o tema central da historiografia sempre é a possibilidade da existência que vigora por ter SIDO presença [Dasein], e esta, de fato, sempre existe numa história do mundo, é que ela pode exigir de si a implacável orientação pelos “fatos”. Por isso, a pesquisa dos fatos se ramifica de forma tão variada, transformando em seu objeto a história dos instrumentos, das obras, da cultura, do espírito e das ideias. Por sempre se transmitir em si mesma, a história também sempre se encontra numa interpretação correspondente. Também esta tem a sua própria história. E é por isso que, na maior parte das vezes, a historiografia só penetra no que vigora por ter SIDO presença [Dasein] mediante a história da transmissão. É por isso também que a pesquisa historiográfica concreta sempre pode ater-se a seu próprio tema, não obstante varie a proximidade. “Comprometendo-se” previamente com a “concepção de mundo” de uma época, o historiógrafo ainda não comprova ter compreendido o seu objeto num modo propriamente histórico e não apenas “estético”. Por outro lado, a existência de um historiógrafo, que “só” edita fontes, pode ser determinada por uma historicidade própria. STMSC: §76
Histórica, a presença [Dasein] apenas é possível com base na temporalidade. Esta se temporaliza na unidade ekstática e horizontal de suas retrações. A presença [Dasein] existe propriamente como porvir na abertura decidida de uma possibilidade escolhida. Voltando a si numa decisão, ela se abre em retomadas para as possibilidades “monumentais” da existência humana. A historiografia que surge de tal historicidade é “monumental”. Enquanto vigor de ter SIDO, a presença [Dasein] é e está entregue à responsabilidade de seu estar-lançado. Ao se apropriar do possível nas retomadas, também se prelineia a possibilidade de se venerar a existência que vigora por ter SIDO presença [Dasein], preservada e revelada na possibilidade assumida. Monumental, a historiografia própria é, por isso, “antiquária”. A presença [Dasein] se temporaliza como atualidade na unidade do porvir e do vigor de ter SIDO. A atualidade abre, como instante, o hoje em sentido próprio. Interpretando o instante a partir da compreensão porvindoura nas retomadas de uma possibilidade de existência assumida, a historiografia própria desatualiza o hoje, isto é, separa-se, com sofrimento, do público e decadente do hoje. Em sentido próprio, a historiografia monumental e antiquária é, necessariamente, uma crítica do “presente” [Gegenwart]. A historicidade própria é o fundamento da unidade possível das três essências da historiografia. O solo em que se funda a historiografia própria é, no entanto, a temporalidade enquanto sentido ontológico e existencial da cura. STMSC: §76
A apresentação concreta da origem existencial e histórica da historiografia realiza-se na análise da tematização, constitutiva dessa ciência. O ponto nevrálgico da tematização historiográfica é elaborar a situação hermenêutica. Esta se abre com o decidir da presença [Dasein], que historicamente existe, por abrir, na retomada, o que vigora por ter SIDO presença [Dasein]. É a partir da abertura própria (“verdade”) da existência histórica que se deve expor a possibilidade e a estrutura da verdade histórica. Porque, no entanto, quer referidos a seus objetos ou a seus modos de tratamento, os conceitos fundamentais das ciências historiográficas são conceitos existenciais, a teoria das ciências do espírito pressupõe uma interpretação existencial temática da historicidade da presença [Dasein]. Ela é a meta constante do trabalho de pesquisa de W. Dilthey , e se esclarece, mais profundamente, através das ideias do Conde Yorck von Wartenburg. STMSC: §76
Falso, até impossível, embora não seja o único, tem SIDO o questionamento até hoje existente. STMSC: §77
A sua atualização própria do instante nas situações nunca predomina mas se sustenta no porvir do ter SIDO. STMSC: §79
Tampouco coincidem o vigor de ter SIDO, ekstaticamente compreendido, o “outrora” datável da significância e o conceito de passado, no sentido dos puros agora passados. STMSC: §81
Por nem sequer ter SIDO desencadeado, o combate em torno da interpretação de ser não se pode dar por terminado. STMSC: §83