Dasein
Da-sein
Para reunir, ao mesmo tempo, numa palavra a revelação do ser com a essência do homem, como também a referência fundamental do homem à abertura (“aí”; “da”) do ser enquanto tal, foi escolhido para o âmbito essencial, em que se situa o homem enquanto homem, o nome “ser-aí”. Isto foi feito, apesar de a metafísica usar este nome para aquilo que em geral é designado existentia, atualidade, realidade e objetividade, não obstante até se falar, na linguagem comum, em “ser-aí humano”, repetindo o significado metafísico da palavra. Por isso obvia toda possibilidade de se pensar o que nós entendemos quem se contenta apenas em averiguar que em Ser e Tempo usa-se, em vez de “consciência”, a palavra “ser-aí” [Dasein]. Como se aqui estivesse apenas em jogo o uso de palavras diferentes, como se não se tratasse desta coisa única: da relação do ser com a essência do homem e com isto, visto a partir de nós, como se não se tratasse de levar o pensamento primeiramente diante da experiência essencial do homem, suficiente para a interrogação decisiva. Nem a palavra “ser-aí” tomou o lugar da palavra “consciência”, nem a “coisa” chamada “ser-aí” passou a ocupar o lugar daquilo que é representado sob o nome “consciência”. Muito antes, com o “ser-aí” é designado aquilo que, pela primeira vez aqui, foi experimentado como âmbito, a saber, como o lugar da verdade do ser e que assim deve ser adequadamente pensado. [MHeidegger O RETORNO AO FUNDAMENTO DA METAFÍSICA]
Somente à base da originária revelação do nada [Nichts] pode o ser-aí [Dasein] do homem chegar ao ente [Seiende] e nele entrar. Na medida em que o ser-aí se refere, de acordo com sua essência, ao ente que ele próprio é, procede já sempre, como tal ser-aí, do nada revelado.
Ser-aí quer dizer: estar suspenso dentro do nada. [MHeidegger O QUE É METAFÍSICA?]
O homem somente chegará a saber o incalculável ou, o que é o mesmo, somente chegará a preservá-lo em sua verdade, através de um questionamento e configuração criadores baseados na meditação. Esta translada o homem futuro para esse lugar intermediário, para esse Entre, no qual pertence ao ser e, não obstante, permanece sendo um estranho dentro do ente. [Este espaço aberto entre dois elementos é o ser-aí [Da-sein], entendendo a palavra no sentido do âmbito extático do desocultamento e ocultamento do ser.] [DZW]
Para reunir, ao mesmo tempo, numa palavra a revelação do ser com a essência do homem, como também a referência fundamental do homem à abertura (“aí”) do ser enquanto tal, foi escolhido para o âmbito essencial, em que se situa o homem enquanto homem, o nome “ser-aí”. Isto foi feito, apesar de a metafísica usar este nome para aquilo que em geral é designado existentia, atualidade, realidade e objetividade, não obstante até se falar, na linguagem comum, em “ser-aí humano”, repetindo o significado metafísico da palavra. Por isso obvia toda possibilidade de se pensar o que nós entendemos quem se contenta apenas em averiguar que em Ser e Tempo usa-se, em vez de “consciência”, a palavra “ser-aí”. Como se aqui estivesse apenas em jogo o uso de palavras diferentes, como se não se tratasse desta coisa única: da relação do ser com a essência do homem e com isto, visto a partir de nós, como se não se tratasse de levar o pensamento [81] primeiramente diante da experiência essencial do homem, suficiente para a interrogação decisiva. Nem a palavra “ser-aí” tomou o lugar da palavra “consciência”, nem a “coisa” chamada “ser-aí” passou a ocupar o lugar daquilo que é representado sob o nome “consciência”. Muito antes, com o “ser-aí” é designado aquilo que, pela primeira vez aqui, foi experimentado como âmbito, a saber, como o lugar da verdade do ser e que assim deve ser adequadamente pensado.
Aquilo em que se pensa com a palavra “ser-aí” através de todo o tratado de Ser e Tempo recebe já uma luz desta proposição decisiva (p. 42), que diz: “A essência do ser-aí consiste em sua existência”.
Se se considera que na linguagem da metafísica a palavra “existência” designa o mesmo que “ser-aí”, a saber, a atualidade de tudo o que é atual, desde Deus até o grão de areia, é claro que apenas se desloca – quando se entende a frase linearmente – a dificuldade do que deve ser pensado da palavra “ser-aí” para a palavra “existência”. O nome “existência” é usado, em Ser e Tempo, exclusivamente como caracterização do ser do homem. A partir da “existência” corretamente pensada se revela a “essência” do ser-aí, em cuja abertura o ser se revela e oculta, se oferece e subtrai, sem que esta verdade do ser no ser-aí se esgote ou se deixe identificar com o ser-aí ao modo do princípio metafísico: toda objetividade é, enquanto tal, subjetividade. [MHeidegger O RETORNO AO FUNDAMENTO DA METAFÍSICA]
Mundo como totalidade não “é” ente, mas aquilo a partir do qual o ser-aí se dá a entender a que ente pode dirigir-se seu comportamento e como se pode comportar com relação a ele. O ser-aí “se” dá a entender a partir de “seu” mundo quer então dizer: neste vir-ao-encontro-de-si a partir do mundo o ser-aí se temporaliza (zeitigt) como um mesmo, isto é, como um ente que foi entregue a si mesmo para ser. No ser deste ente se trata de seu poder-ser. O ser-aí é de modo tal que existe em-vista-de-si-mesmo. Se, porém, o mundo é aquilo em cuja ultrapassagem a mesmidade primeiramente se temporaliza, então ele se mostra como aquilo em-vista-de-que o ser-aí existe. O mundo tem o caráter fundamental do em-vista-de… e isto no sentido originário de que é ele que primeiramente oferece a possibilidade interna para cada “em-vista-de-ti”, “em-vista-dele”, “em-vista-disso” etc. Aquilo em-vista-de-que, porém, o ser-aí existe, é ele mesmo. À mesmidade pertence o mundo; ele está essencialmente referido ao ser-aí. [MHeidegger SOBRE A ESSÊNCIA DO FUNDAMENTO]
Ek-sistente, o ser-aí é in-sistente. Mesmo na existência insistente reina o mistério, mas como a essência esquecida, e assim ornada “inessencial”, da verdade. [MHeidegger – SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE]
As “contribuições” perguntam em uma via que é inicialmente aberta pela transição ao outro início, para o interior do qual o pensamento ocidental agora se volta. Essa via lança a transição no espaço aberto da história e a fundamenta como uma estada talvez muito longa, em cuja realização o outro início do pensamento permanece sempre apenas o pressentido, mas já de qualquer modo decidido. Com isto, apesar de já falarem e mesmo de só falarem da essência do seer, isto é, do “acontecimento apropriador”, as “Contribuições” ainda não conseguem juntar a junção livre e fugidia da verdade do seer a partir dele mesmo. Se isso algum dia tiver lugar, então essa essência do seer determinará em seu estremecimento o conjunto articulado da obra pensante ela mesma. Esse estremecimento se fortalece, então, em nome do poder da ternura liberada característica de uma intimidade daquela deização do deus dos deuses, a partir da qual acontece apropriadoramente a destinação do SER-AÍ para o seer, como para a fundação da verdade que é concernente ao seer. [tr. Casanova; GA65: 1]
Para os poucos que de tempos em tempos perguntam uma vez mais, isto é, que colocam em decisão de maneira renovada a essência da verdade. Para os raros, que trazem consigo a mais elevada coragem para a solidão, a fim de pensar a nobreza do seer e falar de sua unicidade. O pensar no outro início é originariamente histórico de uma maneira única: o dispor autoconjuntivo sobre a essenciação do seer. Um projeto da essenciação do seer como o acontecimento apropriador precisa ser ousado porque não conhecemos a missão de nossa história. Que possamos experimentar de um modo fundamental a essenciação desse desconhecido em seu ocultar-se. Precisamos querer, porém, desdobrar esse saber, segundo o qual o desconhecido que nos é dado como tarefa deixa a vontade na solidão e, assim, obriga a existência do SER-AÍ à mais elevada retenção em relação ao que se oculta. [tr. Casanova; GA65: 5]
No conhecimento filosófico, em contrapartida, com o primeiro passo começa uma transformação do homem que compreende, e, em verdade, não no sentido moral-“existenciário”, mas de acordo com o modo de ser do SER-AÍ. Isto quer dizer: a ligação com o seer e, antes disso sempre, com a verdade do seer transforma-se ao modo da transposição para o próprio SER-AÍ. Como no conhecimento filosófico tudo é a cada vez e ao mesmo tempo transposto extasiadamente – o ser humano em seu estar aprumado na verdade, essa verdade mesma e, com isto, a ligação com o seer – e como uma representação imediata de algo presente nunca é possível, o pensar da filosofia permanece estranho. [tr. Casanova; GA65: 5]
Sobretudo no outro início é preciso que – em consequência da pergunta acerca da verdade do seer – seja logo levado a termo o salto para o interior do “entre”. O “entre” do SER-AÍ supera o chorismos; não na medida em que ele constrói uma ponte entre o seer (a entidade) e o ente como margens por assim dizer presentes, mas na medida em que ele transforma o seer e o ente ao mesmo tempo em sua coetaneidade. O salto no entre conquista pela primeira vez por meio do salto o SER-AÍ e não ocupa um suporte já pronto. [tr. Casanova; GA65: 5]
Todos os inícios são em si o inultrapassavelmente consumado. Eles se subtraem à historiologia, não porque eles são eternos e supratemporais, mas porque eles são maiores do que a eternidade: os impulsos do tempo, que arranjam para o ser a abertura de seu encobrir-se. Fundação própria desse tempo-espaço significa: SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 5]
Se uma questão pensante não é tão simples e tão pre-ponderante, a ponto de ela determinar a vontade pensante e o estilo de pensamento de séculos, lhes dando a pensar o mais elevado, então ela permanece na melhor das hipóteses inquestionada. Pois ela amplia – meramente enunciada – apenas o mercado anual incessante dos “problemas” que coloridamente se alternam, aquelas repreensões que não acertam em nada e pelas quais ninguém se vê tocado. Como é que as coisas se encontram – assim mensuradas – em relação à questão do seer, questão essa que requestiona, imersa em si mesma em um movimento de viragem, ao mesmo tempo o seer da verdade? Por quanto tempo só o caminho deve surgir, o caminho sobre o qual apenas pela primeira vez a questão da verdade é tocada? O que futuramente e em verdade tem o direito de se chamar filosofia tem de realizar isto como o primeiro e único ponto: primeiro encontrar, isto é, fundar o lugar do questionar pensante da questão uma vez mais inicial: o SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 5]
A questão é que a tonalidade afetiva fundamental afina o SER-AÍ e, com isto, o pensar como projeto da verdade do seer na palavra e no conceito. A tonalidade afetiva é a pulverização do estremecimento do seer como acontecimento apropriador no SER-AÍ. Pulverização: não como um mero desaparecimento e extinção, mas, ao contrário: como guarda da chama no sentido da clareira do aí de acordo com a plena abertura do fosso abismal do seer. A tonalidade afetiva fundamental do outro início quase não tem como ser jamais nomeada por meio de um nome; e isto se mantém até mesmo na transição para ele. A pluralidade de nomes, porém, não nega a simplicidade dessa tonalidade afetiva fundamental e só mostra em meio ao inconcebível todo o seu caráter simples. A tonalidade afetiva fundamental se chama para nós: o espanto, a retenção, o pudor, o pressentimento, o abrir-se para o pressentimento. [tr. Casanova; GA65: 6]
Até que ponto o deus se encontra afastado de nós, aquele que nos nomeia fundadores e criadores, porque sua essência precisa de tais homens? Ele está tão afastado que nós não conseguimos decidir, se ele se movimenta em nossa direção ou se ele está se distanciando de nós. E repensar plenamente essa distância mesma em sua essenciação como o tempo-espaço da suprema decisão significa questionar acerca da verdade do seer, acerca do próprio acontecimento apropriador, do qual toda história futura provém, se é que ainda haverá história. Essa distância da indecidibilidade do mais externo e do primeiro é o iluminado para o encobrir-se, é a essenciação da própria verdade como a verdade do seer. Pois o que se encobre dessa clareira, a distância da indecidibilidade, não é nenhum mero vazio presente à vista e indiferente, mas a essenciação mesma do acontecimento apropriador como essência do acontecimento apropriador, como essência da renúncia hesitante, que se apropria do SER-AÍ em meio ao acontecimento como já copertinente, o deter-se do instante e dos sítios da primeira decisão. [tr. Casanova; GA65: 7]
O despertar dessa indigência é o primeiro tresloucamento do homem para o interior daquele entre, no qual a confusão acossa de maneira uniforme e o deus permanece em fuga. Esse “entre”, contudo, não é nenhuma “transcendência” com relação ao homem, mas é, ao contrário, aquele aberto, ao qual pertence o homem como fundador e guardião, na medida em que ele é apropriado em meio ao acontecimento como SER-AÍ pelo seer mesmo, que não se essencia como nada diverso senão como acontecimento apropriador. [tr. Casanova; GA65: 7]
Somente se mensuramos o quão unicamente necessário o ser é e como ele não se essencia como o próprio deus; somente se tivermos determinado nossa essência com vistas a esses abismos entre o homem e o seer e entre o seer e os deuses, somente então os “pressupostos” começarão uma vez mais a serem efetivamente realizados para uma “história”. Por isto, em termos de pensamento, a única coisa que se mostra como válida é a meditação com vistas ao “acontecimento apropriador”. Por fim e em primeiro lugar, o “acontecimento apropriador” só pode ser re-pensado (compelido para diante do pensar inicial), se o seer mesmo for concebido como o “entre” para o passar ao largo do último deus e para o SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 7]
A distância da indecidibilidade não é naturalmente algo “para além de”, mas o mais próximo do aí infundado do SER-AÍ, que se tornou insistente na prontidão para a recusa enquanto a essenciação do seer. Esse mais próximo é tão próximo que todo exercício inevitável da maquinação e do vivenciado precisa ter já necessariamente passado ao largo dele e, por isto, também nunca pode ser resgatado imediatamente para ele. O acontecimento apropriador permanece o que há de mais estranho. [tr. Casanova; GA65: 7]
O seer se essencia como acontecimento apropriador. A essenciação tem o meio e a amplitude na viragem. A exportação resolutora de contenda e réplica. A essenciação é garantida e abrigada na verdade. A verdade acontece como o encobrimento clareador. A estrutura fundamental desse acontecimento é o tempo-espaço que emerge dele. O tempo-espaço é o que desponta para as mensurações da abertura do fosso abissal do seer. O tempo-espaço é, enquanto junção da verdade, originariamente o sítio instantâneo do acontecimento apropriador. O sítio instantâneo essencia-se a partir desse acontecimento como a contenda de terra e mundo. A contestação da contenda é o SER-AÍ. O SER-AÍ acontece nos modos do abrigo da verdade a partir da garantia do acontecimento apropriador clareado e velado. O abrigo da verdade deixa que o verdadeiro se abra e se dissimule como o ente. O ente se encontra pela primeira vez assim no seer. O ente é. O seer se essencia. O seer (como acontecimento apropriador) precisa do ente, para que ele, o seer, se essencie. O ente pode “ser” ainda no abandono do ser, sob cujo domínio a tangibilidade e a utilidade imediata, assim como a funcionalidade de todo e qualquer tipo (tudo precisa servir ao povo, por exemplo) constituem obviamente o que é sendo e o que não é. A autonomia aparente do ente em face do seer, como se este fosse apenas um suplemento do pensamento “abstrato” representacional, porém, não é nenhum primado, mas apenas o sinal do privilégio em relação à decadência que cega. Esse ente “real e efetivo” é concebido a partir da verdade do seer como o não-ente sob o domínio da inessência da aparência, cuja origem permanece aí encoberta. O SER-AÍ como a fundação da contestação da contenda em meio ao que é aberto por ela é cristalizado humanamente e sustentado na insistência que suporta o aí e que pertence ao acontecimento apropriador. O pensar do seer como acontecimento apropriador é o pensar inicial, que prepara como confrontação com o primeiro início o outro início. O primeiro início pensa o seer como presentidade a partir da presentação, que apresenta o primeiro reluzir de uma essenciação do seer. [tr. Casanova; GA65: 10]
História aqui não concebida como um âmbito do ente entre outros, mas unicamente com vistas à essenciação do seer mesmo. Assim, já em Ser e tempo, a historicidade do SER-AÍ precisa ser compreendida a partir da intenção ontológico-fundamental e não como uma contribuição para a filosofia da história presente à vista. [tr. Casanova; GA65: 12] [A retenção] Ela só é o estilo do pensar inicial, porque ela precisa se tornar o estilo do ser humano por vir, do ser humano fundado no SER-AÍ, isto é, ela afina inteiramente e suporta essa fundação. Retenção – como estilo – a certeza de si da dotação de medida fundante e da insistência na fúria do SER-AÍ. Ela determina o estilo porque ela é a tonalidade afetiva fundamental. [tr. Casanova; GA65: 13]
A retenção é a prontidão mais intensa e ao mesmo tempo mais terna do SER-AÍ para a apropriação em meio ao acontecimento, o ser jogado no encontrar-se-em propriamente dito na verdade da viragem para o cerne do acontecimento apropriador. O domínio do último deus só toca na retenção; a retenção cria para ele, para esse domínio, assim como para ele, para o último deus, a grande tranquilidade. [tr. Casanova; GA65: 13]
Será que está determinada para nós futuramente uma história totalmente diversa daquilo que parece ser hoje considerado como história: a turva caçada às ocorrências que devoram a si mesmas e que só se deixam fixar ainda por meio do mais estridente barulho? Se é que uma história, ou seja, um estilo do SER-AÍ, ainda nos deve ser doado, então isto só pode ser a história velada da grande tranquilidade, na qual e como a qual o domínio do último deus abre e configura o ente. Portanto, a grande tranquilidade precisa primeiramente se abater sobre o mundo para a terra. Essa tranquilidade emerge apenas do silêncio. E esse silenciamento só desponta da retenção. Ela atravessa de maneira afinadora enquanto tonalidade afetiva fundamental a intimidade da contenda entre mundo e terra e, com isto, a contestação do ataque da apropriação em meio ao acontecimento. O SER-AÍ como contestação dessa contenda tem sua essência no abrigo da verdade do seer, isto é, do último deus em meio ao ente. [tr. Casanova; GA65: 13]
A retenção é o fundamento do cuidado. A retenção do SER-AÍ fundamenta pela primeira vez o cuidado como a insistência que suporta o aí. Mas o cuidado – é preciso sempre dizer isto uma vez mais – não tem em vista a aflição e a opressão, nem tampouco a preocupação atormentada em torno disto e daquilo. Tudo isto diz respeito apenas à inessência do cuidado, na medida em que ele ainda é colocado, além disto, em uma outra incompreensão, segundo a qual ele seria uma “tonalidade afetiva” e uma “postura” entre outras. [tr. Casanova; GA65: 13]
A “visão de mundo” dirige a experiência para uma via determinada e para a sua esfera, até o ponto sempre em que a visão de mundo nunca é colocada em questão; a visão de mundo estreita e impede, por isto, a experiência propriamente dita. Esta é a sua força, visto a partir dela. A filosofia abre a experiência. Por isto, contudo, ela não consegue fundar precisamente de maneira imediata a história. Visão de mundo é sempre um fim, na maioria das vezes um fim longamente estendido e nunca sabido. Filosofia é sempre um início e exige a superação de si mesma. Visão de mundo precisa recusar para si novas possibilidades, a fim de manter a si mesma. A filosofia pode durante muito tempo ficar de fora e aparentemente desaparecer. As duas têm os seus tempos diferentes e se mantêm no interior da história em níveis totalmente diversos do SER-AÍ. A diferenciação entre “filosofia científica” e “filosofia da visão de mundo” é a última ramificação da perplexidade filosófica do século 19, em cujo transcurso a “ciência” conquistou um significado popular técnico peculiar e, por outro lado, a “visão de mundo” do particular, como um substitutivo do solo desaparecido, de maneira bastante fraca, deveria manter coesos ainda os “ideais” e “valores”. [tr. Casanova; GA65: 14]
O “domínio” velado, mas vivido até o fim, das igrejas, o caráter corrente e a acessibilidade das “visões de mundo” para as massas (como substitutivo do “espírito” há muito prescindido e da referência às “ideias”), o levar adiante indiferente da filosofia como erudição e ao mesmo tempo de maneira mediada e imediata como escolástica da igreja e da visão de mundo, tudo isto manterá durante muito tempo afastada a filosofia enquanto cofundação criadora do SER-AÍ a partir da onisciência corrente e ágil da opinião pública. Isto não é naturalmente algo que se precisaria “lastimar”, mas apenas o sinal de que a filosofia vai ao encontro de um envio destinamental autêntico de sua essência. E tudo depende de nós não perturbarmos esse envio, nem o desfigurarmos muito menos por meio de uma “apologética” da filosofia, uma maquinação, que necessariamente permanece sempre abaixo de sua posição hierárquica. Com certeza, porém, é necessária a meditação sobre a aproximação desse envio destinamental da filosofia, o saber sobre aquilo que perturba e desfigura e que gostaria de fazer valer a pseudoessência da filosofia. Esse saber interpretaria com certeza mal a si mesmo, se ele se deixasse atrair pela possibilidade de tornar aquele elemento adverso objeto da refutação e da confrontação. O saber da inessência precisa permanecer aqui constantemente um passar ao largo. [tr. Casanova; GA65: 14]
A meditação sobre o caráter do povo é uma travessia essencial. Assim como não podemos nos esquecer disso, também precisamos saber que um nível hierárquico maximamente elevado do seer precisa ser conquistado por meio da luta, se é que um “princípio autenticamente popular” deve ser dominado como normativo para o SER-AÍ histórico em meio à sua colocação em jogo. [tr. Casanova; GA65: 15]
O povo só se torna povo, quando os seus elementos mais únicos surgem e quando esses começam a pressentir. Assim, o povo só se torna livre para a lei a ser conquistada por meio da luta como a última necessidade de seu instante extremo. A filosofia de um povo é aquilo que torna povo o povo de uma filosofia, que funda o povo historicamente em seu SER-AÍ e determina para a guarda da verdade do seer. [tr. Casanova; GA65: 15]
A filosofia “de” um povo é aquele elemento livre e único, que tanto se abate sobre o povo, quanto vem “do” povo, na medida em que ele já se decide para si mesmo, para o SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 15]
A filosofia é o saber imediatamente inútil, mas, não obstante, um saber dominante a partir da meditação. Meditação é questionamento acerca do sentido, isto é, acerca da verdade do seer. O questionamento acerca da verdade é o salto para o interior de sua essência e, com isto, para o interior do seer mesmo. A questão é: se, quando e como somos pertencentes ao ser (como acontecimento apropriador). Essa questão precisa ser questionada por causa da essência do ser, que precisa de nós, e, em verdade, não como aqueles que se encontram precisamente ainda presentes, mas de nós, na medida em que nós ratificamos insistentemente suportando o SER-AÍ e o fundamos como a verdade do seer. Por isto, a meditação – salto para o interior da verdade do ser – é necessariamente auto-meditação. Isto não significa consideração voltada para trás de nós como “dados”, mas fundação da verdade do ser si mesmo a partir da propriedade do SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 16]
A indigência como aquele elemento que impele de um lado para o outro aquilo que impõe pela primeira vez a decisão e a cisão do homem como um ente com ente e em meio a si e, uma vez mais, de volta a ele. Essa indigência pertence à verdade do seer mesmo. Da maneira mais originária, ela é indigência na coerção para a necessidade das possibilidades extremas, por cujos caminhos o homem criando – fundando para além de si, retorna ao fundamento do ente. Onde essa indigência se eleva ao extremo, ela impõe o SER-AÍ e sua fundação. [tr. Casanova; GA65: 17]
(Sobre a pergunta: quem somos nós?) Como meditação sobre o seer, a filosofia é uma automeditação necessária. A dita fundamentação desse nexo distingue-se essencialmente de todo e qualquer tipo de asseguramento da certeza de “si mesmo” do “eu” justamente em virtude da “certeza”, não da verdade do seer. Mas ela também remonta ainda a um âmbito mais originário do que aquele que precisou levar a termo na transição o posicionamento “ontológico-fundamental” do SER-AÍ em Ser e tempo, posicionamento esse que ainda agora não foi desdobrado de maneira suficiente e elevado ao saber daqueles que questionam. [tr. Casanova; GA65: 19]
Aquele equívoco das pretensões emerge do desconhecimento da essência da verdade como velamento clareador do aí, que precisa ser suportado na insistência do questionar. Mas toda e qualquer reunião com vistas à copertinência mais originária pode ser preparada para a experiência fundamental do SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 24]
Estilo: a certeza de si do SER-AÍ em sua legislação fundante e em sua sustentação da grima. [tr. Casanova; GA65: 31]
Enquanto certeza crescida, o estilo é a lei de realização da verdade no sentido do abrigo no ente. E isto porque a arte, por exemplo, é o pôr-em-obra da verdade e porque, na obra, o abrigo em si mesmo chega a se aprumar em relação a si mesmo. Por isto, o “estilo”, ainda que só muito pouco concebido, é particularmente visível no campo da arte. O pensamento do estilo, contudo, não é transposto de maneira estendida a partir da arte para o SER-AÍ enquanto tal. [tr. Casanova; GA65: 31]
O abrigo mesmo realiza-se no e como SER-AÍ. E isto acontece, conquista e perde a história na o-cupação insistente, que pertence de antemão ao acontecimento apropriador, mas que só sabe muito pouco algo sobre esse pertencimento. Essa ocupação pensada não a partir da cotidianidade, mas concebida a partir da ipseidade do SER-AÍ, se mantém em modos múltiplos que se requisitam entre si: fabricação de utensílios, instituição da maquinação (técnica), criação de obras, ato formador de Estado, sacrifício pensante. Em tudo isso a cada vez de maneira diversa, a pré e a co-configuração de conhecimento e de saber essencial como fundação da verdade. “Ciência” apenas uma estaca distanciada de uma penetração determinada da fabricação de utensílios etc.; nada autônomo e nunca podendo ser colocada em conexão com o saber essencial do repensar do ser (filosofia). [tr. Casanova; GA65: 32]
Inversamente: tudo aquilo que só é pensado de início e em meio à necessidade na transição da questão diretriz desdobrada para a questão fundamental sobre o seer e inquirido como caminho para a verdade (o desdobramento do SER-AÍ), tudo isto nunca pode ser traduzido no deserto sem chão de uma “ontologia” e de uma “doutrina das categorias” até aqui. [tr. Casanova; GA65: 34]
Aqui pela primeira vez, nessa interpretação originária do tempo, toca-se no âmbito no qual o tempo alcança com o espaço a mais extrema diversidade e, assim, precisamente a intimidade da essenciação. Essa ligação prepara na apresentação da espacialidade do SER-AÍ, e não, por exemplo, do “sujeito” e do “eu”. [tr. Casanova; GA65: 34]
“O seer” não visa apenas à realidade efetiva do efetivamente real, nem tampouco apenas à possibilidade do possível, em geral não somente ao ser a partir do respectivo ente, mas ao seer a partir de sua essenciação originária na plena abertura do fosso abissal, à essenciação não restrita à “presentidade”. Naturalmente, a essenciação do seer mesmo e, com isto, o seer em sua unicidade mais única não se deixam experimentar de maneira arbitrária e direta como um ente, mas só se abrem na instantaneidade do salto prévio do SER-AÍ para o interior do acontecimento apropriador. Um caminho também nunca conduz imediatamente do ser do ente para o seer, porque a visão para o ser do ente já acontece fora da instantaneidade do SER-AÍ. A partir daqui, é possível trazer para o interior da questão do ser uma distinção e uma clarificação essenciais. Ela não é nunca a resposta da questão do ser, mas apenas a conformação do questionar, o despertar e a clarificação da força questionadora para essa questão, que só emerge sempre e a cada vez da indigência e do desenvolvimento do SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 34] [O repensar do seer e a linguagem] Com a linguagem habitual, que hoje é cada vez mais amplamente abusada e desgastada, a verdade do seer não tem como ser dita. Será que essa verdade pode ser em geral dita de maneira imediata, uma vez que toda linguagem é de qualquer modo linguagem do ente? Ou será que pode ser inventada uma nova linguagem para o seer? Não. E mesmo se tal tentativa tivesse êxito e mesmo sem uma formação vernácula artificial, essa linguagem não seria nenhuma linguagem que diz. Todo dizer precisa emergir concomitantemente do poder ouvir. Os dois precisam ter a mesma origem. Assim, só uma coisa importa: dizer a linguagem mais nobremente amadurecida em sua simplicidade e força essencial, a linguagem do ente enquanto linguagem do seer. Essa transformação da linguagem penetra em âmbitos que ainda se encontram cerrados para nós, porque não sabemos a verdade do seer. Assim, fala-se da “recusa do perseguimento”, da “clareira do encobrimento”, do “acontecimento apropriador”, do “SER-AÍ”, não um escolher verdades e retirar essas verdades das palavras, mas a abertura da verdade do seer em tal dizer transformado. [tr. Casanova; GA65: 36]
Todas essas junções livres e fugidias precisam subsistir em tal unidade a partir da insistência no SER-AÍ, insistência essa que distingue o ser dos que estão por vir. [tr. Casanova; GA65: 39]
A junção livre e fugidia – o dispor que se junta livremente à conclamação e, assim, funda o SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 39]
O domínio histórico da história do pensar ocidental se torna cada vez mais essencial, e a difusão de uma emdição filosófica “histórica” ou “sistemática” cada vez mais impossível. Pois o que importa é não trazer ao conhecimento nenhuma nova representação do ente, mas fundar o ser homem na verdade do seer e preparar essa fundação no repensar do seer e do SER-AÍ. Essa pre-paração não consiste na criação de conhecimentos provisórios, a partir dos quais, então, mais tarde, deveriam ser descerrados os conhecimentos propriamente ditos. Ao contrário, pre-parar significa aqui: abrir o caminho, impor para o caminho – no sentido essencial: afinar. Por outro lado, porém, não como se o pensado e o a se pensar só fossem uma ocasião indiferente para um movimento de pensamento, mas a verdade do seer, o saber da meditação, é tudo. Todavia, o caminho desse repensar o seer não tem já a inscrição fixa em um mapa. A terra vem a ser pela primeira vez, sim, através do caminho e é em cada posição do caminho desconhecida e não tem como ser calculada. [tr. Casanova; GA65: 42]
O perigo de interpretar equivocadamente Ser e tempo nessa direção “antropológico”-“existenciária”, de ver os nexos entre caráter resoluto – verdade – SER-AÍ a partir da resolução visada moralmente, ao invés de, inversamente, a partir do fundamento vigente do SER-AÍ, a verdade como abertura, conceber o caráter resoluto como a espacialização temporalizante do campo de jogo temporal do seer, esse perigo é natural e é intensificado por aquilo que em muitos aspectos se encontra indomado em Ser e tempo. Mas a interpretação falsa é, no fundo, ainda que não em uma superação executora, alijada, se desde o início se retém a questão fundamental acerca do “sentido do seer” como a única questão. [tr. Casanova; GA65: 43]
Porque a essência do seer se essência no acontecimento da apropriação da de-cisão. Todavia, de onde sabemos isso? Nós não o sabemos, mas o inquirimos e abrimos em tais questões para o seer os sítios e talvez um sítio exigido por ele, caso a essência do seer precise se mostrar como a recusa, para a qual o questionamento insuficiente permanece a única proximidade adequada. E, assim, só um criar que funda todo SER-AÍ com vistas a um longo prazo (e só esse criar, não o empreendimento cotidiano fixo da instituição do ente) precisa despertar a verdade do seer como questão e como indigência através da senda mais decisiva e em impulsos iniciais cheios de alternância, aparentemente desprovidos de conexão e desconhecidos para si, tornar pronto para a tranquilidade do seer; ao mesmo tempo, porém, também decididamente contra toda e qualquer tentativa de confundir e enfraquecer, no mero querer para trás, mesmo que esse querer esteja em relação com as tradições “mais valorosas”, a coação impiedosa na indigência da meditação. [tr. Casanova; GA65: 44]
A missão, porém, à luz e na via da decisão: o abrigo da verdade do acontecimento apropriador a partir da retenção do SER-AÍ na grande tranquilidade do seer. [tr. Casanova; GA65: 45]
Por meio do que é tomada a decisão? Por meio do presente ou da permanência de fora daqueles insignemente delineados, que nós denominamos “os que estão por vir”, em diferença em relação aos muitos que arbitrariamente virão depois e aos imparáveis, que não têm mais nada diante de si e mais nada atrás de si. Desses elementos delineados faz parte: 1) Aqueles poucos particulares, que fundam de antemão os sítios e os instantes para os âmbitos do ente naquelas vias essenciais do SER-AÍ fundante (poesia – pensamento – ação – sacrifício). Eles criam, assim, a possibilidade essenciante para os diversos abrigos da verdade, abrigos esses nos quais o SER-AÍ se torna histórico. 2) Aqueles inúmeros elos de ligação, para os quais está dado pressentir a partir da concepção do querer sapiente e das fundações do particular as leis da recriação do ente, da preservação da terra e do projeto do mundo em sua contenda e torná-las visíveis em meio à execução. 3) Aquelas muitas referências de um para o outro, de acordo com a sua proveniência histórica (terrena e mundana), por meio da qual e para a qual a recriação do ente e, com isso, a fundação da verdade do acontecimento apropriador conquista consistência. 4) Os particulares, os poucos, os muitos (não considerados como número, mas com vistas ao seu caráter assinalado) se encontram ainda em parte nas antigas ordens correntes e planejadas. Essas ordens só se mostram ainda como uma proteção de sua consistência ameaçada ao modo de um invólucro ou ainda como forças diretrizes de seu querer. A consonância desses particulares, desses poucos e muitos é velada, não produzida, crescendo repentinamente e por si. Impera sobre ela o reinado a cada vez diverso do acontecimento apropriador, no qual se prepara uma reunião originária, na qual e como a qual se toma histórico aquilo que pode ser denominado um povo. 5) Esse povo é em sua origem e em sua determinação unicamente de acordo com a unicidade do próprio seer, cuja verdade ele tem de fundar uma única vez junto a um único sítio em um único instante. Como é que essa decisão pode ser preparada? Será que o saber e a vontade têm aqui um espaço para dispor ou só se trata aqui de uma intervenção cega em necessidades veladas? Mas necessidades só reluzem em uma indigência. E a preparação de uma prontidão para a decisão encontra-se naturalmente sob o domínio da necessidade de apenas ainda acelerar por fim a falta de história turbilhonante e calcificar suas condições, onde ela quer de qualquer modo o diverso. [tr. Casanova; GA65: 45]
A decisão precisa criar aquele tempo-espaço, o sítio para os instantes essenciais, no qual a seriedade suprema da meditação emerge em consonância com a maior alegria possível do envio para uma vontade de fundação e de construção, da qual também nenhuma confusão permanece distante. Só o SER-AÍ, nunca uma “doutrina”, pode trazer fundamentalmente a transformação do ente. Tal SER-AÍ enquanto fundamento de um povo carece da mais longa preparação a partir do pensar inicial; mas esse pensar permanece sempre a cada vez apenas um caminho do reconhecimento, que começa ao mesmo tempo por muitas vias, da indigência. [tr. Casanova; GA65: 45]
A essência da decisão só pode ser determinada a partir de sua essenciação essencial. Decisão é decisão entre ou-ou. Com isso, porém, o decisivo já é antecipado. De onde o ou-ou? De onde esse: somente esse ou apenas esse? De onde a incontornabilidade do de tal ou tal modo? Não resta o terceiro elemento, a indiferença? Mas aqui, porém, no extremo, ela não é possível. O que é aqui o extremo: ser ou não-ser e, em verdade, não o ser de um ente qualquer, por exemplo, do homem, mas essenciação do ser, ou? Por que se chega aqui ao ou-ou? A indiferença seria apenas o ser do não-ente, apenas o nada mais elevado. Pois “ser” não tem em vista aqui ao ser em si presente à vista, assim como o não-ser também não visa aqui: ao completo desaparecimento, mas não-ser como uma espécie do ser: sendo e, de qualquer modo, não como uma espécie de ser; e o mesmo vale para o ser: nulo e, de qualquer modo, precisamente sendo. Esse sendo retomado na essenciação do ser exige a intelecção do pertencimento do nada ao ser, e só assim alcança o ou-ou a sua agudeza e a sua origem. Como o seer é nulo, ele precisa para a consistência de sua verdade da subsistência do não e, com isso, ao mesmo tempo do contra tudo o que é nulo, o não-ente. A partir da nulidade essencial do ser (viragem) vem à tona o fato de que ele exige e necessita daquilo que se mostra a partir do SER-AÍ como ou-ou, o um ou o outro, e apenas deles. A essenciação essencial da decisão é um salto em direção à decisão ou a indiferença; ou seja, não a retração e não a destruição. A indiferença como o não-decidir. A decisão passa originariamente por saber se decisão ou não decisão. A decisão, porém, é um colocar-se diante do ou-ou, e, com isso, já é um ter sido decidido, porque aqui já se dá um pertencimento ao acontecimento apropriador. A decisão sobre a decisão (viragem). Nenhuma reflexão, mas o contrário disso: sobre a decisão, isto é, já saber o acontecimento apropriador. Decisão e questão; questão como mais originária: colocar a essência da verdade em decisão. A verdade mesma, contudo, já é o que precisa ser decidido enquanto tal. [tr. Casanova; GA65: 47]
Por que decisões precisam ser tomadas? O que é isso, decisão? A forma necessária de realização da liberdade. Certamente, assim pensamos de maneira “causal” e tomamos a liberdade como uma faculdade. A “decisão” também não é ainda uma forma muito refinada do cálculo? Ou por causa dessa aparência não apenas o oposto mais extremo, mas o incomparável? Decisão, como ato do homem, vista de maneira processual, na sequência. Nela o necessário, que “se encontra” antes do “ato”, que se atém para além dele. O elemento tempo-espacial da decisão como fosso irruptivo do seer mesmo precisa ser apreendido em termos da história do ser, não de maneira moral e antropológica. Arrumação preparatória, então justamente também não uma reflexão ulterior, mas o inverso. Em geral: toda a essência do homem, logo que ela é fundada no SER-AÍ, precisa ser repensada em termos da história do ser (mas não “ontologicamente”). [tr. Casanova; GA65: 49]
O abandono do ser é o fundamento e, com isso, ao mesmo tempo a determinação mais originária da essência daquilo que Nietzsche reconheceu pela primeira vez como niilismo. O quão pouco mesmo ele e sua força conseguiram impelir o SER-AÍ ocidental à meditação sobre o niilismo! Ainda menor, porém, é a esperança de que essa era traga à tona a vontade de saber sobre o fundamento do niilismo. Ou será que deveria emergir desse saber pela primeira vez a clareza quanto ao “fato” do niilismo? [tr. Casanova; GA65: 57]
3) A irrupção do massificado. Com isto, não se tem em vista apenas as “massas” em um sentido “social”; essas massas só ascendem porque o número já vigora e o calculável, isto é, o acessível a qualquer um da mesma maneira. O que é comum a muitos e a todos é, para os “muitos”, aquilo que eles conhecem como o pre-ponderante; por isso, a interpelação com vistas ao cálculo e à rapidez, assim como, inversamente, a adução realizada por esses do massificado em trilhos e quadros. Aqui a mais aguda oposição, porque a mais discreta, em relação ao raro, ao único (a essência do ser). Por toda parte nesses encobrimentos do abandono do ser, a inessência do ente se difunde, o não ente se expande e, em verdade, com a aparência de um “grande” acontecimento. A propagação desses encobrimentos do abandono do ser e, com isso, precisamente deles mesmos é o mais forte obstáculo, porque ao mesmo tempo um obstáculo que não tem de modo algum como ser notado, para a correta apreciação e fundação da tonalidade afetiva fundamental da retenção, na qual pela primeira vez a essência da verdade reluz, na medida em que a remoção para o interior do SER-AÍ acontece. Aqueles modos da estada no ente e de seu “domínio” são, porém, a tal ponto degradantes porque eles não gastam somente um dia, por exemplo, com formas aparentemente apenas externas que abarcam um interior. Eles colocam a si mesmos no lugar do interior e negam finalmente a diferença entre um interior e um exterior, uma vez que eles são o que há de primeiro e uma vez que eles são tudo o que há. A isso corresponde o modo como se alcança o saber, e a distribuição calculada, rápida e maciça de conhecimentos não compreendidos na maior quantidade possível e no menor tempo possível; “a escolaridade”, uma palavra, que coloca de ponta cabeça em seu significado atual precisamente a essência da escola e da schole. Mas mesmo isso é apenas um novo sinal da reviravolta, que não detém o desenraizamento crescente porque ela não chega às raízes do ente e não quer mesmo chegar até aí; porque se ela chegasse a essas raízes, ela precisaria se deparar com a sua própria ausência de solo. Ao cálculo, à rapidez e à massificação alia-se ainda um outro elemento que, ligado aos três de uma maneira acentuada, assume o encobrimento e a dissimulação da decomposição interior – esse elemento é: [O desnudamento, a publicização e a vulgarização da tonalidade afetiva] [tr. Casanova; GA65: 58]
A ausência de indigência se torna a mais elevada possível, lá onde a certeza de si mesmo se tornou inexcedível, lá onde tudo é considerado como calculável e onde antes de tudo se decide, sem questão prévia, quem nós somos e o que nós devemos ser; lá onde se perdeu o saber e onde esse saber nunca foi fundamentado propriamente, de tal modo que o ser si mesmo propriamente dito acontece no fundar para além de si, o que exige: a fundação do espaço da fundação e de seu tempo, o que requer: o saber da essência da verdade como o que incontornavelmente precisa ser sabido. Onde, porém, a “verdade” há muito tempo não se mostra mais como questão e a tentativa de tal questão é rejeitada como perturbação e como um permanecer ao largo meditabundo, aí a indigência do abandono do ser não encontra de modo algum um tempo-espaço. Onde a posse do verdadeiro como o correto se encontra fora de questão e dirige todo fazer e todo deixar de fazer, em que medida ainda haveria aí espaço para a questão acerca da essência da verdade? E onde essa posse do verdadeiro pode até mesmo se reportar aos fatos, quem gostaria de se perder aí ainda na inutilidade de uma questão essencial e se expor ao escárnio? A partir do soterramento da essência da verdade como o fundamento do SER-AÍ e da fundação da história emerge a ausência de indigência. [tr. Casanova; GA65: 60]
1) A copertinência entre maquinação e vivência. 2) A raiz comum das duas. 3) Em que medida elas consumam a dissimulação do abandono do ser. 4) Por que o conhecimento de Nietzsche do niilismo precisou permanecer inconcebido. 5) O que desentranha – uma vez reconhecido – o abandono do ser acima do seer ele mesmo? A origem do abandono do ser. 6) Por que via o abandono do ser precisa ser experimentado como a indigência? 7) Em que medida já é necessário para tanto a transição para a superação? (SER-AÍ) 8) Por que é que só para essa transição a poesia de Hölderlin se torna vindoura e, com isso, histórica? [tr. Casanova; GA65: 62]
9) O desdobramento do rigor de uma ciência realiza-se em meio aos modos de avanço (da assunção de uma perspectiva sobre a região de objetos) e de procedimento (de execução da investigação e da apresentação), no “método”. Esse avanço traz o âmbito do objeto respectivamente para o interior de uma determinada direção da explicabilidade, que já assegura de maneira principial a inevitabilidade de um “resultado”. (Algo sempre vem à tona). O modo fundamental do procedimento em toda explicação é a persecução e a disposição antecipativa de séries e cadeias particulares de relações incessantes de causa-efeito. A essência maquinacional do ente, apesar de não ser reconhecida enquanto tal, não apenas justifica, mas exige uma elevação sem limites desse pensar seguro dos resultados em termos de “causalidades”, que, consideradas rigorosamente, não são senão ligações “se-então” sob a forma do quando-então (ao que também pertence, por isso, a “estatística” da física moderna, que não supera de maneira alguma a causalidade, mas a traz simplesmente à luz em sua essência maquinacional). Achar que se pode conceber antes com essa causalidade aparentemente “livre” o vivente revela apenas a convicção secreta fundamental de que um dia também se colocará o vivente sob a jurisdição da explicação. Esse passo encontra-se tanto mais próximo, uma vez que, do lado da região contrária à natureza, na história, predomina o método puramente “historiológico” ou “pré-historiológico”, que pensa completamente em termos de causalidade e torna acessível a “vida” e o “vivenciável” ao computo causal e vê tão somente aí a forma do “saber” histórico. O fato de se admitir na história o “acaso” e o “destino” como codeterminantes atesta com maior razão o domínio único do pensamento causal, na medida em que, sim, “acaso” e “destino” só representam as ligações de causa-efeito não exata e inequivocamente calculáveis. O fato de, em geral, o ente histórico poder possuir um modo de ser completamente diverso (fundado no SER-AÍ), nunca pode se tornar passível de ser sabido pela historiologia, porque ela nesse caso precisaria abdicar, então, de si mesma. Pois enquanto ciência ela tem como seu âmbito de transcurso de antemão fixado o autoevidente, aquilo que é incondicionadamente consonante com uma inteligibilidade mediana, inteligibilidade essa que é exigida a partir da essência da ciência como a instituição de correções no interior do domínio e da direção de tudo o que é objetivo a serviço da utilização e do cultivo. [tr. Casanova; GA65: 76]
Tornar visível a insondável pluralidade de facetas do ponto de partida questionador de Leibniz e, contudo, ao invés da mônada, pensar o SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 88]
Reconstruir os passos principais de Kant e, contudo, superar o ponto de partida “transcendental” por meio do SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 88]
Esses são alguns caminhos, em si independentes e, entretanto, copertinentes, para jogar no saber sempre apenas uma única coisa: o fato de que a essenciação do seer carece da fundação da verdade do seer e de que essa fundação precisa se realizar como SER-AÍ, algo por meio do que todo idealismo e, com isso, a metafísica até aqui e a metafísica em geral são superadas como um desdobramento necessário do primeiro início, que ganha assim pela primeira vez de maneira nova a obscuridade, a fim de só ser concebido a partir do outro início enquanto tal. [tr. Casanova; GA65: 88]
Nietzsche, concebido como o fim da metafísica ocidental, não aponta para nenhuma constatação historiológica daquilo que se encontra atrás de nós, mas se mostra como o ponto de partida histórico do futuro do pensar ocidental. A questão acerca do ente precisa ser trazida para o seu fundamento próprio, para a questão acerca da verdade do seer. E o que constituiu até aqui o fio condutor e a formação do horizonte de toda interpretação do ente, o pensar (re-presentar), é retomado na fundação da verdade do seer, no SER-AÍ. A “lógica” enquanto doutrina do pensar correto transforma-se em meditação sobre a essência da linguagem como a denominação instituidora da verdade do seer. O seer, contudo, até aqui, sob a figura da entidade, o que havia de mais universal e corrente, se torna enquanto acontecimento apropriador o que há de mais único e estranho. [tr. Casanova; GA65: 89]
Ora, mas o “não” (e o sim) não precisaria ter a sua figura essencial no SER-AÍ usado pelo seer? O não é o grande salto livre, no qual o aí é arrancado em meio a um salto no SER-AÍ. O salto livre, que “afirma” até mesmo aquilo de que ele salta, mas que também não tem nada nulo por si mesmo como salto. O salto livre mesmo assume pela primeira vez o ressaltar do salto, e, assim, o não ultrapassa aqui o sim. Esse não, porém, visto externamente, é a de-posição do outro início em relação ao primeiro, nunca “negação” no sentido usual da recusa e quiçá da degradação. Ao contrário, essa negação originária é do tipo daquela recusa, que renuncia para si a um continuar acompanhando a partir do saber e do reconhecimento da unicidade daquilo que, em seu fim, exige o outro início. [tr. Casanova; GA65: 90]
O outro início é o salto que transforma o seer em meio à sua verdade mais originária. O pensar ocidental na questão diretriz estabelece, de acordo com o seu início, o primado do ente ante o ser; o “a priori” é apenas o velamento do caráter ulterior do seer, velamento que precisa vigorar, na medida em que, no acesso imediatamente primeiro, acolhedor e reunidor ao ente, é aberto o seer. Assim, não pode causar espanto, mas precisa ser concebido expressamente como consequência o modo como, então, o ente mesmo se torna normativo para a entidade em uma determinada interpretação. Apesar de, sim, com base no primado da physis e do physei ón, porém, precisamente o thesei ón e o poioumenon se tornam aquilo que fornece agora para a interpretação apreendedora o elemento compreensível, determinando a compreensibilidade da própria entidade (como hyle – morphe). Por isto, encontra-se no pano de fundo e logo se impondo em Platão de maneira particular no primeiro plano a techne como caráter fundamental do conhecimento, isto é, da ligação fundamental com o ente enquanto tal. Tudo isso não aponta para o fato de que, porém, mesmo a physis precisa ser interpretada a partir da correspondência com o poioumenon da poiesis, de que a physis não é suficientemente capaz de exigir a sua verdade para além da parousia e aletheia mesmas, levando-a ao seu desdobramento? Isso, porém, é aquilo que o outro início quer realizar e precisa realizar: o salto para o interior da verdade do seer, de tal forma que esse seer mesmo funda o ser do homem e, em verdade, nem mesmo imediatamente, mas o ser do homem só como uma consequência do e como o estar-referido ao SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 91]
O primeiro início não é controlado, a verdade do seer, apesar de sua reluzência essencial, não é expressamente fundada, e isso significa: uma antecipação humana (do enunciado, da techne, da certeza) torna-se normativa para a interpretação da entidade do seer. Agora, porém, faz-se necessária a grande inversão, que está além de toda “transvaloração de todos os valores”, daquela inversão, na qual o ente não é fundado a partir do homem, mas o ser do homem a partir do seer. Isso, porém, carece de uma força superior do criar e questionar, e ao mesmo tempo da prontidão mais profunda para o sofrimento e para a resolução na totalidade de uma mudança completa das relações com o ente e com o seer. Agora, a ligação com o seer não pode mais permanecer em uma repetição que emerge de uma ligação com o ente (dianoein – noein – kategorein). Como, porém, aquela antecipação inicial lança o homem para fora e para dentro do ente a partir do comportamento da apreensão (noûs – ratio), de tal modo que graças a ela um ente supremo é pensado como arche – aitia – causa – como algo incondicionado, as coisas se mostram como se não se tratasse de uma degradação do ser em meio à essência do homem. Aquela antecipação característica do primeiro início do pensar como fio condutor da interpretação do ente pode necessariamente ser concebida a partir do outro início como uma espécie de não dominação do SER-AÍ ainda não experimentável. [tr. Casanova; GA65: 91]
Espaço, porém, também precisa ser concebido aqui originariamente como espacialização (tal como essa espacialização pode ser indicada na espacialidade do SER-AÍ, mas não concebida de maneira completamente originária). [tr. Casanova; GA65: 98]
O fato de a entidade ter sido concebida desde a Antiguidade como presentidade constante já vale para muitos, se é que eles em geral perguntam sobre uma fundamentação, como fundamentação. Mas o caráter do inicial e do primevo nessa interpretação do ente não é imediatamente uma fundamentação, mas torna inversamente essa interpretação pela primeira vez propriamente questionável. Para o questionamento correspondente se mostra: não se pergunta de maneira alguma sobre a verdade da entidade. Para o pensar do primeiro início, a interpretação é infundada e infundável, e isso com razão, se compreendermos por interpretação a explicação explicativa, que reconduz a um outro ente (!). Não obstante, essa interpretação do ón como physis (e mais tarde idea) não é sem fundamento, mas com certeza ela permanece velada com vistas ao fundamento (isto é, à verdade). Poder-se-ia achar que a experiência da fugacidade, do surgimento e do perecimento, sugeriria e exigiria como contraparte o estabelecimento da constância e da presentidade. Mas por que é que o que surge e o que perece são considerados como o não ente? De qualquer modo, isso só acontece se a entidade já se encontra fixada como constância e presentidade. Por isto, entidade não é deduzida a partir do ente ou do não-ente, mas o ente é projetado para essa entidade, a fim de se mostrar pela primeira vez no aberto desse projeto como o ente ou não-ente. Mas a partir de onde e por que a abertura da entidade é sempre projeto? Mas a partir de onde e por que o projeto é de tal tempo não concebido por si mesmo? As duas coisas estão em conexão? (Tempo extaticamente e projeto fundado como SER-AÍ). [tr. Casanova; GA65: 100]
O fato de a verdade do seer permanecer velada, apesar de a entidade ser colocada nela (o “tempo”), precisa estar fundado na essência do primeiro início. Será que esse encobrimento do fundamento da verdade do ser não significa ao mesmo tempo que a história do SER-AÍ grego determinado por essa verdade foi colocada sobre a via mais breve e o presente foi levado a termo em um grande e único instante da criação? [tr. Casanova; GA65: 100]
Que ninguém se atreva hoje tanto a tomar como um mero acaso o fato de que esses três, que sofreram por fim cada um à sua maneira do modo mais profundo possível os efeitos do desenraizamento, ao qual é impelida a história ocidental, e que pressentiram ao mesmo tempo da maneira mais íntima possível os seus deuses, tenham precisado abandonar precocemente a claridade de seu dia. O que está se preparando? O que reside no fato de que o primeiro desses três, Hölderlin, tenha sido aquele que da maneira mais ampla possível poetou de antemão nessa era, uma vez que o pensar impeliu uma vez mais toda a história até aqui a saber absolutamente? Que história velada do tão famigerado século 19 aconteceu aqui? Que lei do movimento do que está por vir se prepara aí? Não precisamos repensar em regiões e critérios de medida completamente diversos, assim como precisamos assumir modos totalmente diversos de ser, a fim de nos tornarmos ainda pertencentes às necessidades que aqui irrompem? Ou será que essa história permanece inacessível para nós como fundamento do SER-AÍ? Não porque ela passou, mas porque ela ainda está por vir para nós? [tr. Casanova; GA65: 105]
12) Por meio do nominalismo, porém, o que é interpelado como sendo a realitas propriamente dita é o conteúdo material coisal do particular, esse, e, de acordo com isso, a realitas é requisitada como sendo a distinção do particular, o ser presente à vista aqui e agora mais próximo, a existentia; o estranho: a “realidade” se torna agora o título para a “existência”, para a “realidade efetiva”, para o “SER-AÍ”. [tr. Casanova; GA65: 110]
24) Para criar uma prontidão para o salto no SER-AÍ, por isso, há uma tarefa incontomável: introduzir a superação do platonismo por meio do saber mais originário em tomo de sua essência. [tr. Casanova; GA65: 110]
O que é estabelecido em Ser e tempo como “compreensão de ser” parecia ser apenas a ampliação dessa representação anterior, e, no entanto, (compreender como pro-jeto – SER-AÍ) é algo completamente diverso; como transição, porém, ele remete para a metafísica. A verdade do seer e a essenciação do seer não são nem o que há de mais primevo nem o que há de mais tardio. [tr. Casanova; GA65: 112]
Por mais certamente que a história do fim prossiga e, medida a partir dos dados presentes, por mais que ela se mostre mais “viva” e “mais rápida” e confusa do que nunca, a própria transição permanecerá o que há de mais questionável e antes de tudo o que há de mais desconhecido. O homem, em pequeno número e sem conhecer a si mesmo, se preparará em meio ao campo de jogo temporal do SER-AÍ e se reunirá em uma proximidade com o seer, proximidade essa que precisa permanecer estranha para todos aqueles que se encontram “próximos da vida”. A história do seer conhece em longos espaços de tempo, que são para ela apenas instantes, acontecimentos apropriadores raros. Os acontecimentos apropriadores enquanto tais: o remetimento da verdade ao seer, a precipitação da verdade, a solidificação de sua inessência (da correção), o abandono do ser do ente, a entrada do seer em sua verdade, o atiçar do fogo da lareira (da verdade do seer) como o sítio solitário do passar ao largo do último deus, o reluzir da unicidade única do seer. Enquanto a destruição do mundo até aqui enquanto autodestruição alardeia em meio ao vazio o seu triunfo, a essência do seer se reúne em sua mais elevada vocação: enquanto acontecimento da apropriação do âmbito de decisão sobre a divindade dos deuses, apropriar-se do fundamento e do campo de jogo temporal, isto é, do SER-AÍ, na unicidade de sua história. [tr. Casanova; GA65: 116]
A transposição para a essência do seer e, com isso, o questionamento da questão prévia (essência da verdade) são diversas de todas as objetivações do ente e de todo acesso imediato a esse ente; nesse caso, ou bem o homem é em geral esquecido, ou bem o ente é atribuído como certo ao “eu” e à consciência. Em contrapartida: a verdade do seer e, com isso, a essência da verdade se es-senciam somente na insistência no SER-AÍ, na experiência do caráter de jogado no aí a partir do pertencimento ao clamor do acontecimento apropriador. [tr. Casanova; GA65: 119]
Para que, porém, esse questionar completamente outro enquanto consistência do SER-AÍ em geral possa ascender a uma possibilidade decidível, é preciso que se tente de saída, a partir da questão diretriz, criar por meio de seu desdobramento completo uma transição para o salto na questão fundamental; nunca uma transição imediata para essa questão. É preciso que se torne visível que e por que na questão diretriz a questão acerca da verdade (sentido) do seer permanece sem ser questionada. Essa questão não questionada é a questão fundamental, vista no campo de visão do caminho da questão diretriz, ou seja, só indicativamente vista; o tempo como verdade do seer; esse experimentado a princípio inicialmente como presentação nas diversas figuras. [tr. Casanova; GA65: 119]
São sempre poucos aqueles chegam ao salto e esses chegam sempre por sendas diversas. Trata-se sempre das sendas da fundação criadora e sacrificial do SER-AÍ, em cujo tempo-espaço o ente é preservado como ente e, com isso, a verdade do seer é abrigada. Isso, porém, acontece sempre no mais extremo encobrimento, o arrebatamento extasiante para o interior do in-calculável e único, na cumeada mais aguda e mais elevada, que constitui o seguir ao longo do a-bismo do nada e funda ele mesmo o abismo. [tr. Casanova; GA65: 120]
As sendas e as veredas mais silenciosas e mais íngremes precisam ser encontradas, a fim de conduzir para fora do hábito há muito tempo duradouro assim como da exploração do seer, fundando para o seer os sítios de sua es-senciação naquilo de que ele mesmo se apropria em meio ao acontecimento como acontecimento apropriador, no SER-AÍ. [tr. Casanova; GA65: 121]
Na abertura da essenciação do seer torna-se manifesto que o SER-AÍ não realiza nada, a não ser iniciar o contraimpulso do acontecimento da apropriação, isto é, a não ser inserir nesse contraimpulso e, assim, se tornar ele mesmo: o que guarda o projeto jogado, o fundador fundado do fundamento. [tr. Casanova; GA65: 122]
A situação de emergência essencial não deve se defender da emergência, a fim de afastá-la, mas precisa, em se defendendo, precisamente conservá-la e estendê-la para o interior da exportação resolutora de acordo com a ampliação do estremecimento. Assim, o seer é como a recusa atributiva o acontecimento da apropriação do SER-AÍ. Esse acontecimento da apropriação, porém, tem o ímpeto para o próprio como estremecimento da deização, que precisa do campo de jogo temporal para a sua própria decisão. [tr. Casanova; GA65: 123]
O seer só alcança sua grandeza, se ele é reconhecido como aquilo de que o deus dos deuses e de que toda deização precisam. O “usado” se contrapõe a toda utilização. Pois ele é o acontecimento apropriador do acontecimento da apropriação do SER-AÍ, no qual o sítio silencioso é fundado como a essenciação da verdade, o campo de jogo temporal do passar ao largo, o em meio a desprotegido, que desencadeia a tempestade do acontecimento da apropriação. [tr. Casanova; GA65: 126] [A abertura do fosso abissal] Essa abertura é o desdobramento que permanece em si da intimidade do seer mesmo, na medida em que nós o “experimentamos” como a recusa e como a recusa tr