Assim, se cada ação de meu corpo é fenômeno de um ato volitivo, no qual minha vontade mesma, portanto meu caráter, expressa-se em geral e no todo sob certos motivos, então o pressuposto e a condição absolutamente necessária daquela ação têm de ser também fenômeno da vontade, pois (I 128) o aparecimento desta não pode depender de algo que não exista imediata e exclusivamente mediante ela, que, portanto, seja-lhe simplesmente contingente: com o que seu aparecimento mesmo seria casual. Aquela condição, no entanto, é todo o corpo mesmo. Este, portanto, já tem de ser fenômeno da vontade, e relacionar-se com minha vontade em seu todo, isto é, com meu caráter inteligível, cujo fenômeno no tempo é meu caráter empírico, da mesma forma que a ação isolada do corpo se relaciona com o ato isolado da vontade. Logo, todo o corpo não tem de ser outra coisa senão minha vontade que se torna visível, tem de ser a minha vontade mesma na medida em que esta é objeto intuível, representação da primeira classe. — Em confirmação de tudo isso, recorde-se que toda ação sobre o corpo afeta simultânea e imediatamente a vontade e, nesse sentido, chama-se dor ou prazer, ou, em graus menores, sensação agradável ou desagradável; inversamente, todo movimento veemente da vontade, portanto todo afeto e paixão, abala o corpo e perturba o curso de suas funções.
(SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e como representação. Primeiro Tomo. Tr. Jair Barboza. São Paulo: Editora UNESP, 2005, p. 165)