salto

Sprung

Assim, pois, torna-se necessário um SALTO para se experimentar o comum-pertencer de homem e ser, propriamente. Este SALTO é a subitamente da entrada não mediada naquele pertencer cuja missão é dispensar uma reciprocidade de homem e ser e instaurar a constelação de ambos. O SALTO é a súbita penetração no âmbito a partir do qual homem e ser desde sempre atingiram juntos a sua essência, porque ambos foram reciprocamente entregues como propriedade a partir de um gesto que dá. A penetração no âmbito desta entrega como propriedade dis-põe e harmoniza a experiência do pensar. Estranho SALTO, que provavelmente nos convencerá que ainda não nos demoramos bastante ali, onde propriamente já estamos. Onde estamos nós? Em que constelação de ser e homem? IDENTIDADE E DIFERENÇA


O esboço dessas “contribuições” para a preparação da transição é retirado do esboço fundamental ainda indômito da historicidade da própria transição: A ressonância – A conexão de jogo – O SALTO – A fundação – Os que estão por vir – O último deus. Esse esboço não fornece nenhum arranjo de considerações diversas sobre objetos diversos; ele não implica tampouco nenhuma ascensão introdutória de algo que se acha embaixo para algo que está em cima. Ele é o esboço prévio do campo de jogo tempo-espacial que cria pela primeira vez a história da transição como o seu reino, a fim de decidir a partir de sua lei sobre aqueles que são sem futuro, ou seja, sobre aqueles que são sempre apenas “eternos”, e sobre os que estão por vir, isto é, aqueles que serão algum dia. [tr. Casanova; GA65: 1]

Por vezes, aqueles fundadores do abismo precisam ser consumidos no fogo do que se guarda, para que o ser-aí venha a ser possível para o homem e, assim, seja salva a constância em meio ao ente, para que o ente mesmo experimente a restauração no aberto da contenda entre terra e mundo. Consequentemente, o ente é voltado para o interior de sua constância por meio do ocaso dos fundadores da verdade do seer. Tal movimento é exigido pelo próprio seer mesmo. Ele precisa dos que experimentam o ocaso; e, onde quer que um ente apareça, o seer já sempre se a-propriou desses fundadores que perecem em meio ao acontecimento, já sempre os atribuiu a si mesmo. Essa é a essenciação do seer mesmo: nós a denominamos o acontecimento apropriador. A riqueza da ligação volteante do seer com o ser-aí que lhe é entregue apropriadoramente é imensurável. A plenitude do acontecimento da apropriação é incalculável. E somente algo muito diminuto pode ser dito aqui “sobre o acontecimento apropriador” nesse pensar inicial. O que é dito é questionado e pensado em uma “conexão de jogo” do primeiro e do outro início a partir da “ressonância” do seer; ele é questionado e pensado em meio à indigência do abandono do ser para o “SALTO” em direção ao interior do seer. Esse “SALTO” tem por fim promover a “fundação” da verdade do seer como a preparação dos “que estão por vir” e “do último deus”. Esse dizer pensante é uma diretiva. Essa diretiva indica o livre abrigo da verdade do seer em meio ao ente como algo necessário, sem ser, contudo, uma ordem. Tal pensamento jamais pode ser transformado em uma doutrina: ele se subtrai completamente ao acaso da opinião. Além do mais, ele só dá uma diretiva aos poucos e ao seu saber, quando o que importa é o resgate dos homens da barafunda do não-ente, lançando-os para o interior da maleabilidade à junção característica de uma criação reservada dos sítios que são determinados para o passar ao largo do último deus. Mas se o acontecimento apropriador perfaz a essenciação do seer, o quão perto está, então, o perigo de que ele recuse e precise recusar o acontecimento da apropriação porque o homem perdeu a força para o ser-aí, uma vez que a violência desencadeada do desvario em meio ao gigantesco o dominou sob a aparência da “magnitude”. No entanto, se o acontecimento apropriador se tornar recusa e denegação, isso significa apenas a retração do seer e o abandono do ente ao não-ente? Ou será que a denegação (o caráter de não do seer) pode se tornar no mais extremo o mais distante acontecimento da apropriação, posto que o homem conceba esse acontecimento apropriador e o horror do pudor o recoloque na tonalidade afetiva fundamental da retenção e, com isto, já o exponha para o ser-aí? [tr. Casanova; GA65: 2]

O perguntar sobre a verdade do seer não se deixa contabilizar a partir do que se deu até aqui. E se ele deve preparar o início de outra história, a execução precisa ser originária. Por mais inacessível que permaneça a confrontação com o primeiro início da história do pensamento, é certo que o perguntar mesmo só precisa considerar a sua indigência e esquecer de tudo à sua volta. A história só emerge no SALTO imediato por sobre o “historiológico”. [tr. Casanova; GA65: 4]

Se o homem, por meio desse tresloucamento, chegar a se aprumar no acontecimento apropriador e se ele continuar insistentemente na verdade do seer, então ele continuará se encontrando sempre a princípio no SALTO para a experiência decidida quanto a se, no acontecimento apropriador, se decide em nome dele ou contra ele o ficar de fora ou a entrada em cena do deus. [tr. Casanova; GA65: 7]

Cortam de nós a palavra; não como uma ocorrência ocasional, junto à qual não teria lugar um discurso e um enunciado realizável e onde apenas o enunciar e o redizer o que já foi dito e o que é dizível não são levados a termo, mas originariamente. A palavra não ganha ainda de modo algum a palavra, por mais que ela chegue ao primeiro SALTO por meio de tal corte. O que corta a palavra é o acontecimento apropriador enquanto aceno e acometimento do seer. O fato de se cortar a palavra é a condição inicial para a possibilidade que se desdobra de uma denominação originária – poética – do seer. Linguagem e a grande tranquilidade, a proximidade simples da essência e a distância clara do ente, quando a palavra atua uma vez mais pela primeira vez. Quando chegará esse tempo? A retenção: o suportar criador no a-bismo. [tr. Casanova; GA65: 13]

Repousar significa dizer que o questionamento se acha em meio ao mais extremo âmbito de oscilação, em meio ao pertencimento ao acontecimento mais extremo, que é a viragem no acontecimento apropriador. O encontrar-se acontece no SALTO, que se desdobra como fundação do ser-aí. [tr. Casanova; GA65: 22]

O pensar inicial é a performance originária de ressonância, conexão de jogo, SALTO e fundação em sua unidade. Performance quer dizer aqui que essa unidade – ressonância, conexão de jogo, SALTO e fundação em sua unidade – só pode ser a cada vez assumida e suportada humanamente, que elas mesmas são sempre essencialmente um outro e pertencem ao acontecimento do ser-aí. [tr. Casanova; GA65: 27]

Nós nunca podemos dizer de maneira imediata o próprio seer, precisamente se ele é ressaltado no SALTO. Pois todo dizer vem do seer e fala a partir de sua verdade. Toda palavra e, com isso, toda lógica se encontra sob o poder do seer. A essência da “lógica” é, portanto, a sigética. Nela se concebe também pela primeira vez a essência da linguagem. Mas “sigética” é apenas um título para aqueles que ainda pensam em “disciplinas” e só acreditam ter um saber quando o dito é inserido na ordem de tais disciplinas. [tr. Casanova; GA65: 37]

A junção livre e fugidia nesse triplo sentido precisa ser tentada, para que algo mais essencial e mais feliz se dê, aquilo que será presenteado para os que estão por vir, algo tal no qual se dá um SALTO, com o qual ele se conecta e imiscui provisoriamente, a fim de superá-lo. Esse ser superado, quando ele é algo autêntico e necessário, traz naturalmente a grandeza a se aprumar: ele faz com que uma tentativa pensante se poste pela primeira vez historicamente em seu caráter de futuro, ele faz com que ela se encontre lançada para o futuro e para a incontornabilidade. [tr. Casanova; GA65: 39]

Ressonância e conexão de jogo são o solo e o campo para o primeiro despontar do pensar inicial para o SALTO na essenciação do seer. [tr. Casanova; GA65: 39]

O SALTO abre de antemão as amplitudes e os encobrimentos não revisados daquilo para onde a fundação do ser-aí, pertencente ao clamor do acontecimento apropriador, precisa avançar. [tr. Casanova; GA65: 39]

Refletindo em termos modernos, nós pensamos a partir de nós e nos deparamos, quando pensamos para além de nós, sempre apenas com objetos. Nós nos apressamos em pegar esse caminho habitual do re-presentar, indo de um lado para o outro, e explicamos em sua esfera tudo, de tal modo que nunca levamos em consideração se esse caminho não permitiria a caminho um SALTO, por meio do qual nós pela primeira vez saltaríamos para o interior do “espaço” do seer, conquistando para nós mesmos por meio do SALTO a de-cisão. [tr. Casanova; GA65: 43]

A essência da decisão só pode ser determinada a partir de sua essenciação essencial. Decisão é decisão entre ou-ou. Com isso, porém, o decisivo já é antecipado. De onde o ou-ou? De onde esse: somente esse ou apenas esse? De onde a incontornabilidade do de tal ou tal modo? Não resta o terceiro elemento, a indiferença? Mas aqui, porém, no extremo, ela não é possível. O que é aqui o extremo: ser ou não-ser e, em verdade, não o ser de um ente qualquer, por exemplo, do homem, mas essenciação do ser, ou? Por que se chega aqui ao ou-ou? A indiferença seria apenas o ser do não-ente, apenas o nada mais elevado. Pois “ser” não tem em vista aqui ao ser em si presente à vista, assim como o não-ser também não visa aqui: ao completo desaparecimento, mas não-ser como uma espécie do ser: sendo e, de qualquer modo, não como uma espécie de ser; e o mesmo vale para o ser: nulo e, de qualquer modo, precisamente sendo. Esse sendo retomado na essenciação do ser exige a intelecção do pertencimento do nada ao ser, e só assim alcança o ou-ou a sua agudeza e a sua origem. Como o seer é nulo, ele precisa para a consistência de sua verdade da subsistência do não e, com isso, ao mesmo tempo do contra tudo o que é nulo, o não-ente. A partir da nulidade essencial do ser (viragem) vem à tona o fato de que ele exige e necessita daquilo que se mostra a partir do ser-aí como ou-ou, o um ou o outro, e apenas deles. A essenciação essencial da decisão é um SALTO em direção à decisão ou a indiferença; ou seja, não a retração e não a destruição. A indiferença como o não-decidir. A decisão passa originariamente por saber se decisão ou não decisão. A decisão, porém, é um colocar-se diante do ou-ou, e, com isso, já é um ter sido decidido, porque aqui já se dá um pertencimento ao acontecimento apropriador. A decisão sobre a decisão (viragem). Nenhuma reflexão, mas o contrário disso: sobre a decisão, isto é, já saber o acontecimento apropriador. Decisão e questão; questão como mais originária: colocar a essência da verdade em decisão. A verdade mesma, contudo, já é o que precisa ser decidido enquanto tal. [tr. Casanova; GA65: 47]

A ressonância do seer quer resgatar o seer em sua plena essenciação como acontecimento apropriador por meio do desentranhamento do abandono do ser, o que só acontece de tal modo que o ente é recolocado por meio da fundação do ser-aí no seer que se abre no SALTO. [tr. Casanova; GA65: 55]

A conexão de jogo da história do pensar do primeiro início não é, porém, nenhuma adução e nenhuma doação prévia historiológicas para um “novo” sistema, mas ela é em si a preparação essencial do outro início, preparação essa que impele à transformação. Por isso, talvez precisemos dirigir de maneira ainda mais inaparente e ainda mais decidida a meditação histórica sobre os pensadores da história do primeiro início e plantar por meio do diálogo questionador com a sua postura questionadora um questionamento, que se encontrava outrora expressamente enraizado em um outro início. Todavia, uma vez que essa meditação histórica, enquanto conexão de jogo dos inícios em si fundantes, que pertence de maneira a cada vez diversa ao abismo, emerge transitoriamente do outro início, mas, para conceber esse outro início, já se exige o SALTO, a meditação se encontra submetida por demais à incompreensão, que só se depara com considerações historiológicas sobre obras pensantes, cuja escolha se deixa guiar por uma predileção qualquer. Sobretudo a forma exterior dessas meditações históricas (preleções “filosófico-historiológicas”) não se distingue em nada daquilo que só representa ainda uma erudição ulterior a uma história concluída da filosofia. [tr. Casanova; GA65: 82]

Ora, mas o “não” (e o sim) não precisaria ter a sua figura essencial no ser-aí usado pelo seer? O não é o grande SALTO livre, no qual o aí é arrancado em meio a um SALTO no ser-aí. O SALTO livre, que “afirma” até mesmo aquilo de que ele salta, mas que também não tem nada nulo por si mesmo como SALTO. O SALTO livre mesmo assume pela primeira vez o ressaltar do SALTO, e, assim, o não ultrapassa aqui o sim. Esse não, porém, visto externamente, é a de-posição do outro início em relação ao primeiro, nunca “negação” no sentido usual da recusa e quiçá da degradação. Ao contrário, essa negação originária é do tipo daquela recusa, que renuncia para si a um continuar acompanhando a partir do saber e do reconhecimento da unicidade daquilo que, em seu fim, exige o outro início. [tr. Casanova; GA65: 90]

Tal negação, naturalmente, não se satisfaz com o SALTO livre, que só deixa atrás de si, mas ela desdobra a si mesma, na medida em que ela libera o primeiro início e sua história inicial e na medida em que a liberação retrojeta para a posse do início, lá onde, retroagido, tudo também agora e futuramente ainda pre-pondera, o que aconteceu outrora em sua sequência e que se tomou o objeto do computo historiológico. Essa edificação do que prepondera no primeiro início é o sentido da “destruição” na transição para o outro início. [tr. Casanova; GA65: 90]

A confusão se intensifica radicalmente, quando se busca chegar, com o auxílio da diferença “ontológica” que emergiu de modo ontológico-fundamental, a uma solução da questão. Pois essa “diferença” é, com efeito, apenas ponto de partida não na direção da questão diretriz, mas na direção do SALTO ao cerne da questão fundamental; não para jogar de maneira obscura com marcas desde então fixas (ente e ser), mas para retornar à questão acerca da verdade da essenciação do seer e, com isso, para apreender de maneira diversa a ligação entre seer e ente, sobretudo porque o ente enquanto tal experimenta uma interpretação transformada (guarda da verdade do acontecimento apropriador) e porque não subsiste mais nenhuma possibilidade de inopinadamente contrabandear para aí “o ente” enquanto “objeto representado” ou enquanto “algo presente à vista em si” e coisas do gênero. [tr. Casanova; GA65: 107]

24) Para criar uma prontidão para o SALTO no ser-aí, por isso, há uma tarefa incontomável: introduzir a superação do platonismo por meio do saber mais originário em tomo de sua essência. [tr. Casanova; GA65: 110]

O SALTO, o que há de mais ousado no procedimento do pensar inicial, deixa e lança tudo o que é corrente para trás de si e não espera nada imediatamente do ente, mas ressalta antes de tudo o pertencimento ao seer em sua plena essenciação como acontecimento apropriador. O SALTO aparece assim sob a aparência do que não leva nada em consideração e, contudo, ele é precisamente afinado por aquele pudor, no qual a vontade da retenção ultrapassa a si mesma e se transforma na insistência do suportar da mais distante proximidade da renúncia hesitante. O SALTO é a ousadia de uma primeira penetração no âmbito da história do ser. [tr. Casanova; GA65: 115]

A meditação “ontológico-fundamental” (fundamentação da ontologia como sua superação) é a transição do fim do primeiro início para o outro início. Essa transição, contudo, é ao mesmo tempo o ímpeto para o SALTO, por meio do qual apenas um início, e, sobretudo, o outro, pode, como constantemente ultrapassado pelo primeiro, se iniciar. Aqui, na transição, prepara-se a decisão mais originária e, por isso, mais histórica, aquele ou-ou, em relação ao qual não restam nenhum esconderijo e nenhuma região para o desvio; ou permanecemos presos ao fim e ao seu transcurso, o que significa ao mesmo tempo às modulações renovadas da “metafísica”, que vêm se tornando cada vez mais toscas, desprovidas de fundamento e de meta (o novo “biologismo” e coisas do gênero), ou iniciamos o outro início, ou seja, nos decidimos pela sua longa preparação. Agora, porém, uma vez que o início só acontece no SALTO, essa preparação também precisa já ser um saltar e, enquanto preparação, provir e se destacar por meio de um SALTO da confrontação (conexão de jogo) com o primeiro início e sua história. O totalmente outro do outro início em contraposição ao primeiro pode ser elucidado por meio de um dizer, que aparentemente só joga com uma inversão, enquanto na verdade tudo se modifica. [tr. Casanova; GA65: 117]

O SALTO é o mais extremo projeto da essência do ser, de tal modo que nós nos colocamos a nós (mesmos) no assim aberto, nos tornamos insistentes e só por meio do acontecimento da apropriação chegamos a nós mesmos. Ora, mas um ente não precisa permanecer de qualquer modo diretriz para a determinação da essência do seer? Mas o que significa aqui “diretriz”? Que nós destacamos junto a um ente previamente dado o ser como o seu elemento mais universal, isso seria apenas um adendo na apreensão. A questão continuaria sendo por que e em que sentido o ente é “essente” para nós. Há sempre antes um projeto, e a questão continua sendo apenas se o que projeta salta ou não, como o próprio lançador, para o interior da via do que joga, avia que abre; se o projeto mesmo é experimentado e ratificado como acontecimento a partir do acontecimento apropriador ou se o que brilha no projeto só é recolocado em si como o que emerge (physis – idea) na presentificação que se desprende. De onde, porém, o fundamento da decisão sobre a direção e a amplitude do projeto? Será que a determinação da essência do seer está submetida ao arbítrio ou a uma necessidade suprema e, com isso, a uma indigência? A indigência, porém, é sempre a cada vez diversa segundo a idade do ser e de sua história; o velamento da história do ser. [tr. Casanova; GA65: 118]

No outro início, é importante preparar o SALTO para o meio que abre o fosso da viragem do acontecimento apropriador, a fim de, assim, sabendo – perguntando –, preparar em meio a uma prontidão silenciosa o aí com vistas à sua fundação. [tr. Casanova; GA65: 118]

1) O primeiro início e seu fim abarcam toda a história da questão diretriz de Anaximandro até Nietzsche. 2) A questão diretriz não é questionada inicialmente na apreensão expressa da questão, mas captada por isso mesmo de maneira tanto mais originária e respondida de modo normativo; a irrupção do ente, a pre-sentação do ente enquanto tal em sua verdade; essa fundada no logos (reunião) e no noein (a-preensão). 3) O caminho daqui até a primeira versão, desde então diretriz, da questão em Aristóteles; a preparação essencial por meio de Platão; a confrontação aristotélica com o primeiro início, que ganha ao mesmo tempo por meio daí o cerne de uma interpretação fixamente estabelecida para o que vem depois. 4) A repercussão do modo de formulação da questão que agora retrocede uma vez mais, mas que, porém, a tudo ainda domina no resultado e nos caminhos (doutrina das categorias; teo-logia); a reestruturação do todo por meio da teologia cristã; sob essa figura, o primeiro início permanece, então, apenas histórico, até mesmo ainda em Nietzsche, apesar de sua descoberta dos pensadores iniciais como homens de um nível hierárquico elevado. 5) De Descartes até Hegel uma transformação renovada, mas não uma mudança essencial; a retomada na consciência e a certeza absoluta; em Hegel, realiza-se pela primeira vez uma tentativa filosófica de uma história da questão acerca do ente a partir da posição fundamental conquistada do saber absoluto. 6) O que reside entre Hegel e Nietzsche possui muitas figuras, em parte alguma originariamente no metafísico, nem mesmo em Kierkegaard. Diferentemente da questão diretriz, a questão fundamental desponta enquanto questão concebida com a própria formulação da questão, a fim de saltar a partir dela de volta para o interior da experiência fundamental originária do pensamento da verdade do seer. Mas a questão fundamental também tem enquanto questão concebida um caráter completamente diverso. Ela não é o prosseguimento da formulação da questão que tinha sido empreendida na questão diretriz por Aristóteles. Pois ela emerge por um SALTO imediatamente de uma necessidade da indigência do abandono do ser, daquele acontecimento, que é essencialmente co-condicionado pela história da questão diretriz e por seu desconhecimento. [tr. Casanova; GA65: 119]

Para que, porém, esse questionar completamente outro enquanto consistência do ser-aí em geral possa ascender a uma possibilidade decidível, é preciso que se tente de saída, a partir da questão diretriz, criar por meio de seu desdobramento completo uma transição para o SALTO na questão fundamental; nunca uma transição imediata para essa questão. É preciso que se torne visível que e por que na questão diretriz a questão acerca da verdade (sentido) do seer permanece sem ser questionada. Essa questão não questionada é a questão fundamental, vista no campo de visão do caminho da questão diretriz, ou seja, só indicativamente vista; o tempo como verdade do seer; esse experimentado a princípio inicialmente como presentação nas diversas figuras. [tr. Casanova; GA65: 119]

Ser e tempo é a transição para o SALTO (questionamento da questão fundamental). Portanto, até o ponto em que se retifica essa tentativa como “filosofia da existência”, tudo permanece sem ser concebido. [tr. Casanova; GA65: 119]

Nada é aqui pressentido da incomparabilidade da posição fundamental no outro início. Que o SALTO, aqui como pergunta acerca da essência da verdade mesma, traz pela primeira vez o homem para o interior do campo de jogo do acometimento e da permanência de fora da chegada e da fuga dos deuses. O outro início não pode querer senão isso. Computado a partir do que se teve até aqui, isso significa a recusa a uma validade e a um emprego no sentido de uma “visão de mundo”, de uma “doutrina” e de um anúncio. [tr. Casanova; GA65: 119]

O que temos em vista com essa palavra “SALTO” que aqui, como todas as outras palavras, se mostra como facilmente incompreensível? [tr. Casanova; GA65: 120]

O SALTO é o re-saltar da prontidão para o pertencimento ao acontecimento apropriador. Acometimento e permanência de fora da chegada e da fuga dos deuses, o acontecimento apropriador, não tem como ser imposto de maneira pensante, mas, muito ao contrário, é preciso prontificar por meio do pensamento o aberto que, como tempo-espaço (sítios instantâneos), torna acessível e constante a abertura do fosso abissal do seer no ser-aí. Só aparentemente é que o acontecimento apropriador é levado a termo pelos homens, em verdade o ser do homem acontece como histórico por meio da apropriação em meio ao acontecimento que exige de um modo ou de outro o ser-aí. O acometimento do seer, que é conferido ao homem histórico, nunca se anuncia para esse homem de maneira imediata, mas sim de maneira velada nos modos do abrigo da verdade. Mas o acometimento do seer, raro e esparso em si, emerge sempre da permanência de fora do seer, cujo ímpeto e tenacidade não é menor do que os do acometimento. [tr. Casanova; GA65: 120]

O seer como a essenciação do acontecimento apropriador não é, por isso, um mar vazio, o mar indeterminado do determinável, para o interior do qual nós já saltamos de um lugar qualquer “sendo”, mas o SALTO faz com que o aí experimente pela primeira vez a emergência, como pertinente ao que acontece apropriadoramente no clamor, como os sítios instantâneos do em algum lugar e quando. [tr. Casanova; GA65: 120]

São sempre poucos aqueles chegam ao SALTO e esses chegam sempre por sendas diversas. Trata-se sempre das sendas da fundação criadora e sacrificial do ser-aí, em cujo tempo-espaço o ente é preservado como ente e, com isso, a verdade do seer é abrigada. Isso, porém, acontece sempre no mais extremo encobrimento, o arrebatamento extasiante para o interior do in-calculável e único, na cumeada mais aguda e mais elevada, que constitui o seguir ao longo do a-bismo do nada e funda ele mesmo o abismo. [tr. Casanova; GA65: 120]

O SALTO mais próprio e mais amplo é o SALTO do pensar. Não como se a partir do pensar (enunciado) a essência do seer fosse determinável, mas porque aqui, no saber em torno do acontecimento apropriador, a abertura do fosso abissal do ser é escalada e atravessada mais amplamente, de tal modo que as possibilidades do abrigo da verdade no ente podem ser mensuradas mais extensamente. [tr. Casanova; GA65: 120]

O SALTO é um SALTO sapiente para o interior da instantaneidade dos sítios do acometimento, daquele primeiro elemento, que arranca por meio do SALTO o abrigo do acontecimento da apropriação na palavra que acena. [tr. Casanova; GA65: 120]

O SALTO é a realização do projeto da verdade do seer no sentido da inserção no aberto, de tal modo que aquele que joga o projeto se experimenta como jogado, isto é, como apropriado pelo acontecimento por meio do seer. A abertura por meio do projeto é apenas tal abertura, se ela acontecer como experiência do caráter de jogado e, com isso, do pertencimento ao seer. Essa é a diferença essencial em face de todos os tipos de conhecimento apenas transcendentais no que concerne às condições de possibilidade. [tr. Casanova; GA65: 122]

O elemento conflituoso precisa residir na essenciação do seer mesmo, e o fundamento é o acontecimento da apropriação como recusa, que é uma atribuição. Nesse caso, a negação e o não seriam até mesmo o SALTO mais originário no seer. [tr. Casanova; GA65: 129]

A partir da essência originária da verdade determina-se pela primeira vez o verdadeiro e, com isso, o ente; e, com efeito, de tal modo que agora não é mais o ente que é, mas o seer que emerge como que por um SALTO para o “ente”. Por isso, no outro início do pensar, o seer é experimentado como acontecimento apropriador; e isso de tal modo, com efeito, que essa experiência muda como um novo SALTO todas as referências ao “ente”. Desde então, o homem, isto é, o homem essencial e os poucos de seu tipo, precisa construir a partir do ser-aí a sua história, o que significa que, antes de tudo, é a partir do seer para o ente que ele precisa provocar efeitos no ente. Não apenas como até aqui, de tal modo que o seer se mostre como algo esquecido, mas incontornavelmente apenas pré-visado, mas de tal modo que o seer, sua verdade, suporte expressamente toda e qualquer ligação com o ente. Isso exige a retenção como tonalidade afetiva fundamental, que afina inteiramente aquela guarda no tempo-espaço para o passar ao largo do último deus. [tr. Casanova; GA65: 130]

Efetivo, isto é, essente, é o lembrado e é ainda o pronto. Lembrança e preparação abrem o campo de jogo temporal do seer, para o qual o pensar precisa abjurar a “atualidade” como a única e primeira determinação até aqui. (Porque é aqui que reside o campo de decisão imediato sobre a verdade do seer, o SALTO para o outro início precisou ser tentado como Ser e tempo). Todavia, se gostaria ainda de deixar a partir da concepção habitual do tempo (desde Aristóteles – Platão) o nyn em seu primado, deduzindo apenas a partir de sua modulação o passado e o futuro; e isso sobretudo porquanto a lembrança só pode ser lembrada a partir de e em recurso a algo atual e a algo atual em seu sido, e sobretudo porquanto algo futuro não tem senão a determinação de se tornar algo atual. [tr. Casanova; GA65: 136]

Será que outrora um pensador melhor equipado ousou dar o SALTO? Em um sentido criador, ele precisa ter esquecido o modo até aqui de perguntar sobre o ser, isto é, sobre a entidade. Esse esquecimento não é nenhuma perda de algo de que se precisaria ainda tomar posse, mas a transformação em um estado mais originário do questionamento. [tr. Casanova; GA65: 156]

SALTO é o lançar-se descerrador “no” ser-aí. O ser-aí se funda no SALTO. Aquilo para onde ele, se descerrando, salta se funda pela primeira vez por meio do SALTO. [tr. Casanova; GA65: 181]

O lançar-se; o si mesmo só “se” apropria de si no SALTO, e, no entanto, não há nenhuma criação absoluta, mas, ao contrário: abre-se o caráter de jogado do jogar-se e do jogador de maneira abissal; de maneira completamente diferente do que em toda finitude do assim chamado ente criado presente à vista e do que é gerado pelo demiurgo. [tr. Casanova; GA65: 181]

Aqui, a essência do seer não pode ser nem deduzida por meio da leitura de um ente determinado, nem de todos os entes conhecidos juntos. Sim, uma dedução é absolutamente impossível. O que vigora é um projeto originário e um SALTO, que só pode haurir a sua necessidade da mais profunda história do homem, na medida em que o homem experimentará e alcançará a sua essência como aquele ente que está exposto ao ente (e, antes de tudo, à verdade do seer), exposição essa (aquele que preserva, que guarda e que busca) que constitui o fundamento de sua essência. Mesmo o estabelecimento da idea não é nenhuma dedução! Saber isso significa superá-la. [tr. Casanova; GA65: 184]

A fundação é ambígua: 1) O fundamento funda, se essencia como fundamento. 2) Este fundamento fundante é alcançado enquanto tal e assumido. Sondagem do solo fundamental: a) Deixar o fundamento se essenciar enquanto fundamento; b) Construir sobre ele enquanto fundamento, trazer algo para o fundamento. O fundar originário do fundamento (1) é a essenciação da verdade do seer; a verdade é fundamento no sentido originário. A essência do fundamento originariamente a partir da essência da verdade, verdade e tempo-espaço (a-bismo). Sob o título “fundação”, tem-se em vista a princípio, de acordo com o nexo com o “SALTO”, o significado (2) (a) e (b). Por isto, porém, ele se acha não apenas ligado ao (1), mas também é determinado a partir daí. [tr. Casanova; GA65: 187]

Só se pode falar de maneira fundante sobre o ser-aí, ou seja, na realização pensante da ressonância, da conexão de jogo e do SALTO. [tr. Casanova; GA65: 190]

A partir daqui já é possível perceber com clareza que força projetiva conjugada fugidiamente de maneira una é necessária, para que o SALTO da abertura seja realizado como o ressalto do ser-aí, preparando suficientemente de maneira questionadora e sapiente a fundação. [tr. Casanova; GA65: 190]

A concepção, segundo a qual a verdade seria em primeiro lugar encobrimento clareador (cf o a-bismo) tem em vista o fato de uma clareira se fundar para o que se encobre. O encobrir-se do seer na clareira do aí. No encobrir-se se essencia o seer. O acontecimento apropriador nunca vem à luz abertamente como um ente, como algo presente (cf o SALTO, o seer). [tr. Casanova; GA65: 217]

A verdade funda como verdade do acontecimento apropriador. Esse acontecimento, porém, é, por isso, concebido a partir da verdade como fundamento: o fundamento originário. O fundamento originário só se abre como o que se encobre no a-bismo. O abismo, contudo, é completamente dissimulado por meio do não fundamento. O fundamento originário, o fundamento fundante, é o seer, mas sempre a cada vez se essenciando em sua verdade. Quanto mais fundamentalmente o fundamento (a essência da verdade) for sondado em seu solo, tanto mais essencialmente se essencia o seer. A sondagem do solo do fundamento precisa, no entanto, ousar o SALTO no a-bismo e mensurar e suportar o próprio a-bismo. [tr. Casanova; GA65: 242]

Ressonância e conexão de jogo, SALTO e fundação têm sempre a cada vez a sua tonalidade afetiva diretriz, que afina conjuntamente de maneira originária a partir da tonalidade afetiva fundamental. Essa tonalidade afetiva fundamental, porém, não tem tanto como ser descrita. Ela precisa ser mais provocada no todo do pensar inicial. Em uma palavra, porém, não há quase como nomeá-la, a não ser por meio do nome de retenção. Mas, então, essa palavra precisa ser tomada em toda a plenitude originária, que cresce historicamente para a sua significação a partir do repensar do acontecimento apropriador. A tonalidade afetiva fundamental contém a exigibilidade, o ânimo da coragem como a vontade sapiente e afinada do acontecimento apropriador. As tonalidades afetivas diretrizes são afinadas e afinadoras na ressonância uma com a outra. A tonalidade afetiva diretriz da ressonância é o horrorem meio ao abandono do seer que se desvela e, ao mesmo tempo, o pudor diante do acontecimento apropriador ressonante. Horror e pudor conjuntamente a princípio deixam levar a termo de maneira pensante a ressonância. A consonância originária das tonalidades afetivas diretrizes só é completamente afinada por meio da tonalidade afetiva fundamental. Nela, os que estão por vir são, e, como aqueles que são assim afinados, são de-terminados afinadamente pelo último deus. (Sobre tonalidade afetiva cf algo essencial nas preleções sobre Hölderlin). [tr. Casanova; GA65: 249]

Os que estão por vir, os responsáveis no ser-aí fundado pelo ânimo da retenção, à qual apenas cabe o ser (SALTO) como acontecimento apropriador, se apropriando deles em meio ao acontecimento e potencializando-os para o abrigo de sua verdade. [tr. Casanova; GA65: 252]

A viragem se essencia entre o clamor (ao pertinente) e a escuta (do conclamado). Viragem é contra-viragem. O clamor ao SALTO no acontecimento da apropriação é a grande tranquilidade do conhecer-se mais velado. É a partir daqui que toda linguagem do ser-aí toma a sua origem e está, por isso, na essência o silêncio (cf retenção, acontecimento apropriador, verdade e linguagem). [tr. Casanova; GA65: 255]

O repensar da verdade do seer só tem sucesso se, no passar ao largo do deus, o apoderamento do homem para a sua necessidade se tornar manifesto e, assim, o acontecimento da apropriação no excesso da viragem ganhar o aberto entre o pertencimento humano e a necessidade divina, a fim de revelar seu encobrir-se como meio, a fim de se revelar como meio do encobrir-se, obrigando a reoscilação e, com isso, trazendo ao SALTO a liberdade para o fundamento do seer como fundação do aí. [tr. Casanova; GA65: 256]

O quão pouco sabemos do fato de que o deus espera pela fundação da verdade do seer e, com isso, pelo SALTO do homem no ser-aí. Ao invés disso, tudo se dá como se o homem é que precisasse e fosse esperar por deus. E talvez essa seja a forma mais fatídica da mais absoluta falta de deus e o atordoamento da impotência para o sofrimento do acontecimento da apropriação daquele aí enquanto estada temporária do seer, que oferece pela primeira vez ao encontrar-se do ente na verdade um sítio, atribuindo a ele o elemento justo de se achar na mais ampla distância em relação ao passar ao largo do deus, elemento justo, cuja atribuição só acontece como história; na recriação do ente em meio à essencialidade de sua determinação e em meio à libertação do abuso das maquinações, que, invertendo tudo, esgotam o ente no usufruto. [tr. Casanova; GA65: 256]

O SALTO pensante para o “interior” da verdade do seer precisa ressaltar ao mesmo tempo a essência da verdade, fixar-se no jogo de um projeto e se tornar insistente. [tr. Casanova; GA65: 262]

Aqui também reside a razão pela qual nós, mesmo no interior da necessidade de experimentarmos (re-pensarmos) a verdade do seer, nos movimentamos ainda aparentemente em meio ao elemento re-presentacional. Nós concebemos o “ontológico”, ainda que, em verdade, isso aconteça como condição do “ôntico”, de qualquer modo apenas como um adendo ao “ôntico” e repetimos o “ontológico” (projeto do ente com vistas à entidade) uma vez mais como autoaplicação sobre ele mesmo: projeto da entidade como projeto do seer com vistas à sua verdade. De saída, não há absolutamente nenhum outro caminho para tornar compreensível em geral, provindo do círculo de visão da metafísica, a questão do ser como tarefa. Por meio desse procedimento, o seer mesmo é aparentemente transformado ainda em objeto e se alcança o contrário mais decidido daquilo que o impulso da questão do seer já abriu para si. “Ser e tempo”, porém, busca revelar justamente o “tempo” como o âmbito projetivo para o seer. Com certeza, mas se ele tivesse devido permanecer aí, então a questão do ser teria sido desdobrada enquanto questão e, com isso, enquanto o repensar do que há de mais questionável. Por isso, o importante era superar na passagem decisiva a crise da questão do ser de saída necessariamente estabelecida assim e, antes de tudo, evitar uma objetivação do seer; por um lado por meio da retenção da interpretação “temporal” do seer, e, ao mesmo tempo, por meio da tentativa de tornar “visível” a verdade do seer independentemente disso (Liberdade para o fundamento em “Da essência do fundamento”, mas precisamente na primeira parte desse ensaio se acha inteiramente retido o esquema ôntico-ontológico). A crise não tem como ser controlada por meio de um mero prosseguimento do pensamento na direção estabelecida da questão, mas o SALTO múltiplo na essência do seer mesmo precisou ser ousado, o que exigiu ao mesmo tempo uma inserção mais originária na história. A referência ao início para a clarificação da aletheia como um caráter essencial da própria entidade, a fundamentação da diferenciação entre ser e ente. O pensar tornou-se cada vez mais histórico, isto é, a diferenciação entre consideração historiológica e sistemática se tornou cada vez mais caduca e inadequada. [tr. Casanova; GA65: 262]

O repensar do seer, contudo, logo que e na medida em que tem sucesso o SALTO, determinou a sua própria essência como “pensar” a partir daquilo de que o ser se apropria em meio ao acontecimento enquanto acontecimento apropriador, a partir do ser-aí. [tr. Casanova; GA65: 262]

O re-pensar do seer, a denominação de sua essência, não é outra coisa senão a ousadia de auxiliar o lançar-se para além dos deuses em direção ao seer e deixar pronta para o homem a verdade do verdadeiro. Com essa “definição” do pensar por meio daquilo que ele “pensa” realiza-se a completa saída de toda interpretação “lógica” do pensar. Pois esse é um dos maiores preconceitos da filosofia ocidental: achar que o pensar precisaria ser determinado “logicamente”, isto é, com vistas ao enunciado (a explicação “psicológica” do pensar é de fato apenas um adendo à explicação “lógica” e pressupõe essa explicação; e isso mesmo lá onde ela visa a poder substituir a explicação lógica; a noção do “psicológico” se encontra aqui no lugar de biológico-antropológico). Um reverso daquele preconceito, porém, se dá quando se é acometido em meio à recusa da interpretação “lógica” do pensar (isto é, da ligação com o ser; cf “O que é metafísica?”) pela angústia, ou melhor, pelo temor de que isso colocaria em risco o rigor e a seriedade do pensar e entregaria tudo ao sentimento e ao seu “juízo”. Quem diz, afinal, e quem foi que demonstrou algum dia que o pensar logicamente visado seria o pensar “rigoroso”? Isso só é válido, se é que é em geral válido, sob o pressuposto de que a interpretação lógica do ser poderia ser a única interpretação possível; o que, porém, com maior razão, é um preconceito. Com vistas à essência do seer, precisamente a “lógica” talvez seja o procedimento menos rigoroso e sério para a determinação da essência e apenas uma ilusão, que possui naturalmente uma essência ainda mais profunda do que a “ilusão dialética”, que Kant tornou visível no âmbito da objetivação possível do ente na totalidade. A “lógica” mesma, no que concerne à fundação da essência da verdade do seer, é uma ilusão, mas a mais necessária ilusão, que a história do seer até agora conheceu. A essência da própria “lógica”, que atingiu sua figura suprema na metafísica de Hegel, só se deixa conceber a partir do outro início do pensar do seer. A abissalidade desse pensamento, porém, também deixa o assim chamado rigor da argúcia lógica (como forma do encontro da verdade, não apenas da expressão do que foi encontrado) vir à tona como uma brincadeira que não se apodera de si mesma, a qual, então, também poderia se degradar e se constituir como uma erudição filosófica, na qual qualquer um, dotado com uma argúcia qualquer, pode se movimentar de um lado para o outro, sem jamais ser tocado pelo seer e sem nunca pressentir o sentido da questão acerca do seer. Mas o repensar do seer também é, então, correspondentemente raro e talvez só nos seja concedido no passo tosco de uma preparação sua, se a ousadia desse SALTO abissal puder ser chamada de um favor. [tr. Casanova; GA65: 265]

Quem se espantaria se essa indicação do primeiro fato-de-que da história do seer fosse tomada na transição da metafísica para o repensar do seer como completamente arbitrária e incompreensível? Todavia, não adianta praticamente nada, se fôssemos de encontro a isso com esclarecimentos quanto ao fato de que todos os modos de consideração ligados à “historiologia da literatura”, à história da poesia e à “história do espírito” precisam permanecer de fora. Já se exige aqui o SALTO para o seer e sua verdade, a experiência de que, sob o nome de Hölderlin, acontece apropriadoramente aquele movimento de colocar em decisão – notemos bem: acontece, não aconteceu algo apropriadoramente. Nós podemos tentar destacar historicamente esse “acontecimento apropriador” em sua unicidade, na medida em que o vemos em meio àquilo que ainda se mostra como o que se tinha até aqui em sua mais extrema elevação e em seu mais rico desdobramento: em meio à metafísica do Idealismo alemão e em meio à configuração da imagem de mundo de Goethe, em meio àquilo que permanece separado de Hölderlin por abismos (no “Romantismo”), ainda que ele o tenha “influenciado” historio logicamente, a ele, o portador do nome, mas não o guardião do seer. Mas o que adianta esse alijamento? No máximo, ele alcança apenas uma nova incompreensão, como se, no interior daquela história da metafísica e da arte, Hölderlin fosse algo “próprio”; sendo que o que está em questão não é saber se ele está “dentro”, nem tampouco somente se ele se mostra como o “fora” excepcional, mas antes se abrir para o impulso indedutível do próprio seer, impulso esse que precisa ser capturado em seu mais puro fato-de-que, o fato de que agora e sempre aquela decisão se encontra na história do Ocidente, sem levar em conta se ela é e pode em geral ser apreendida pela era ainda duradoura ou não. Essa decisão posiciona pela primeira vez o tempo-espaço em torno do próprio seer, tempo-espaço esse como o qual o seer se estende a partir desse espaço juntamente com o tempo, que o temporaliza na unidade originária desse campo de jogo temporal. Desde então, todo pensamento que visa à entidade a partir do ente e para além dele permanece fora da história, na qual o seer enquanto acontecimento apropriador se apropria do pensar em meio ao acontecimento sob a figura do que é consonante com o ser-aí e do que lhe pertence. Salvar a unicidade de sua história para o seer é a vocação do pensar e nunca mais a diluição de sua essência nas disciplinas da “universalidade” esmaecida das categorias. Por isso, porém, os sapientes sabem que a preparação dessa história do seer no sentido da fundação da prontidão para o resguardo da verdade do seer no ente que assim vem a ser será uma preparação muito longa e amplamente desconhecida. Separados por uma longa distância precisam estar ainda os preparadores em relação aos fundadores, ainda que eles sejam tocados mesmo que apenas de longe pelo choque da recusa do seer e, por meio daí, queiram se tornar aqueles que pressentem. Continua sendo uma ousadia o dizer sobre o repensar do seer, a ponto de ele ser chamado de auxílio para a acomodação dos deuses no espaço fora e no estranhamento do homem (cf o seer como acontecimento apropriador). [tr. Casanova; GA65: 265]

Na transição para o ser-aí no interior do questionamento acerca da verdade do seer não resta nenhuma outra possibilidade senão mudar de saída a representação até o ponto em que a ligação com o ser como projeto e, por isso, como o caráter da compreensão for fixado (a compreensão de ser do ser-aí). Mas essas determinações, por mais decisivas que elas permaneçam para uma primeira elucidação do questionamento completamente outro da questão do ser, são, porém, vistas a partir da questionabilidade do ser e de sua essenciação, apenas um primeiro passo tateante em uma longa prancha de SALTO, um passo no qual quase não se pressente a presença de algo da exigência, que é feita no final da prancha para o SALTO. Todavia, toma-se esse passo não apenas como o primeiro em um longo estar “a caminho”, mas já como o passo derradeiro, a fim de erigir-se no dito como uma “doutrina” e “perspectiva” determinada e de organizar com ela todo tipo de coisas em um aspecto historiológico. Ou, porém, se recusa essa “doutrina” e se imagina que, com ela, se teria decidido algo sobre a questão do ser. [tr. Casanova; GA65: 266]

O que é feito agora da diferenciação entre ente e seer? Agora, nós a compreendemos como o primeiro plano metafisicamente concebido e, com isso, já mal interpretado de uma de-cisão, que é o seer mesmo (cf acima n. 2). Essa diferenciação não pode mais ser lida a partir do ente e em prosseguimento em direção à generalização isoladora de seu ser. Por isto, ela também não pode ser justificada, por exemplo, pelo aceno para o fato de que “nós” (quem?) precisamos compreender o ser, para que possamos experimentar um ente enquanto tal. Isso é, com efeito, correto, e o aceno para tanto pode servir a qualquer momento como uma primeira indicação do ser e da diferenciabilidade entre ente e seer, mas: o que resulta daqui, o que aqui já é pressuposto, o pensar metafísico da entidade, não pode subsistir enquanto o rasgo fundamental, no qual se deixariam conceber em termos da história do seer, em conformidade com o ser-aí, a essência do seer e de sua verdade em sua essenciação. Apesar disso, a transição não tem como ser preparada de outro modo senão pelo fato de que, nela, a coragem para o antigo (em termos do primeiro início) se faz valer e, assim, se busca de saída impelir esse antigo mesmo para além de si: o ente, o ser, o “sentido” (verdade) do ser (cf Ser e tempo). Desde o início, contudo, em meio a essa repetição mais originária, é preciso saber que ela exige uma completa transformação do homem no ser-aí e já alcançou por um SALTO tal transformação, uma vez que a verdade do seer, que deve se abrir, não trará outra coisa senão a essenciação mais originária do próprio seer. E isso significa: que tudo é transformado e que as veredas que ainda conduziam justamente ao seer precisam ser interrompidas, porque outro tempo-espaço é aberto por meio do seer, que torna necessária uma nova edificação e fundação do ente. Em parte alguma no ente, somente uma vez no seer, se volta em direção ao homem e aos deuses, a cada vez de maneira diversa, como uma tempestade, a suavidade do terrível na intimidade de todos os seres. É somente no seer que se essencia como a mais profunda abertura de seu fosso abissal o possível, de tal modo que é sob a forma do possível que o ser precisa ser pensado em primeiro lugar no pensar do outro início. (A metafísica, contudo, torna o “real e efetivo” enquanto ente ponto de partida e meta da determinação do ser). [tr. Casanova; GA65: 267]

Enunciar desse modo o seer não significa aprontar uma determinação conceitual, mas preparar a tonalidade afetiva do SALTO, a partir da qual e na qual o seer mesmo é ressaltado como projeto para o saber que também mantém a sua essência em um primeiro momento atribuída a partir dessa verdade do seer. [tr. Casanova; GA65: 270]