Já ouvimos que, para a determinação da essência da coisa — com a exceção do começo, no tempo dos Gregos -, foi decisivo o surgimento da moderna ciência da natureza. A transformação do estar-aí, subjacente a este acontecimento, modificou o caráter do pensamento moderno e, também, o da metafísica e preparou a necessidade de uma critica da razão pura. Deste modo, é necessário, por variadas razões, que elaboremos uma representação mais precisa do caráter da moderna ciência da natureza. Apesar disto, devemos logo renunciar a outras questões particulares. Aqui, nem sequer podemos percorrer os momentos essenciais da história desta ciência. Muitos e dos mais importantes fatos desta história são conhecidos e, no entanto, o nosso saber acerca das conexões impulsionadoras mais interiores deste movimento é ainda muito escasso e obscuro. É apenas totalmente claro o fato de que a transformação da ciência se realizou tendo por base um confronto secular e duradoiro com os conceitos fundamentais e os princípios do pensar, quer dizer, com a posição-de-fundo acerca das coisas e do ente em geral. Um tal confronto somente poderia ser levado a cabo através de um domínio completo da tradição da teoria medieval da natureza, tal como da dos antigos; exigiria uma amplitude e uma segurança pouco comuns do pensamento conceitual e, finalmente, um domínio das novas experiências e modos-de-proceder. Tudo isto teria como pressuposto uma singular paixão de exigir um saber capaz de fornecer normas, que só tem paralelo nos Gregos; um saber que, antes de mais e permanentemente, põe em questão os próprios pressupostos e, desta forma, procura fundamentar. Suportar o ser-digno-de-questão manifesta-se como o único caminho humano para conservar as coisas na sua inesgotabilidade, quer dizer, preservá-las de qualquer falsificação.
A transformação da ciência realizar-se-á sempre através da própria ciência. Mas, nessa transformação, a ciência apoia-se num duplo fundamento: 1) na experiência-do-trabalho, quer dizer, na direção e no modo de domínio e de utilização do ente; 2) na metafísica, quer dizer, no projeto do saber fundamental sobre o Ser, sob o qual o ente se estrutura, na ordem do saber. Experiência-de-trabalho e projeto-de-ser estão, assim, numa relação de reciprocidade e reúnem-se sempre num traço fundamental da atitude e do estar-aí. [GA41]