(245) Como vimos em Schleiermacher, o modelo de sua hermenêutica é a compreensão congenial possível de ser alcançada na relação entre o eu e o tu. A compreensão de textos tem a mesma possibilidade de adequação total que a compreensão do tu. Pode-se ver diretamente no texto a opinião do autor. O intérprete é absolutamente coetâneo com seu autor. Este é o triunfo do método filológico: conceber o espírito passado como presente, o espírito estranho como familiar. Dilthey está totalmente compenetrado desse triunfo. Sobre isso fundamenta sua afirmação de que as ciências do espírito possuem o mesmo padrão. Assim como o conhecimento natural-científico interroga algo presente sempre em relação a uma explicação que é projetada nele, assim o investigador do espírito interroga os textos. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 1.
De acordo com essa auto-interpretação da metodologia espiritual-científica pode-se dizer, no geral, que o intérprete assinala a cada texto um destinatário, independentemente de que o texto se tenha referido explicitamente a ele ou não. Seja qual for o caso, este destinatário é o leitor original, e o intérprete se sabe distinto dele. Negativamente isso é claro. Aquele que tenta compreender um texto na qualidade de filólogo ou historiador não se põe a si mesmo como referência de seu conteúdo. Apenas procura compreender a opinião do autor. Enquanto que somente procura compreender não se interessa pela verdade da coisa intencionada como tal, e isso nem sequer quando o próprio texto pretende ensinar a verdade. Nisso o filólogo e o historiador concordam. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 2.
Já assinalamos anteriormente o quanto é duvidosa a frase de Vico, segundo a qual este ideal alcança seu cumprimento mais puro na história, porque nela o homem encontra sua própria realidade humana e histórica. Nós, contrariamente, destacamos que todo historiador e todo filólogo têm de contar, por princípio, com a impossibilidade de fechar o horizonte de sentido, no qual se movem quando compreendem. A tradição histórica somente pode ser entendida quando se tiver pensado também o progresso das coisas através da determinação fundamental continuada, e o filólogo, que trata de textos poéticos e filosóficos, sabe muito bem que estes são inesgotáveis. Em ambos os casos o transmitido mostra novos aspectos significativos em virtude da continuação do acontecer. Através de sua nova atualização na compreensão, os textos se integram num autêntico acontecer, tal como os eventos, em virtude de sua própria continuação. Isto é o que havíamos caracterizado, na experiência hermenêutica, como o momento de história efeitual. Toda atualização na compreensão pode compreender-se como uma possibilidade histórica do compreendido. Na finitude histórica da nossa existência está o fato de que sejamos conscientes de que, depois de nós, outros compreenderão cada vez de maneira diferente. Do mesmo modo, para a nossa experiência hermenêutica é inquestionável que é a mesma obra — cuja plenitude de sentido se manifesta na transformação da compreensão — que permanece como é a mesma história, cujo significado continua determinando-se incessantemente. A redução hermenêutica à opinião do autor é tão inadequada como nos acontecimentos históricos, a redução à intenção dos que atuam neles. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 2.
Nossa própria consideração da essência da tradição literária contém, ademais¡ outro argumento fundamental contra a legitimação hermenêutica do conceito do leitor originário. Já vimos que a literatura se define pela vontade de transmissão. Entretanto, o que copia e transmite intenciona outra vez a seus próprios contemporâneos. Nesse sentido, a referenciação ao leitor originário, assim como aquela feita ao sentido do autor, parece representar um cânon histórico-hermenêutico muito grotesco, incapaz de delimitar realmente o horizonte de sentido dos textos. O que se fixa por escrito desvencilhou-se da contingência de sua origem e de seu autor e liberou-se positivamente para novas referências. Conceitos normativos como a opinião do autor ou a compreensão do leitor originário não representam, na realidade, mais que um lugar vazio que se preenche de compreensão, de ocasião em ocasião. VERDADE E MÉTODO TERCEIRA PARTE 1.
Numa recusa expressa à posição extremista de Benedetto Croce, Betti procura o meio-termo entre o elemento objetivo e o subjetivo da compreensão. Formula um cânon completo dos princípios hermenêuticos, e seu ponto culminante é a autonomia de sentido do texto. Em conformidade com essa autonomia, há que se apreender o sentido, ou seja, a opinião do autor, a partir do próprio texto. Mas com a mesma decisão, ele acentua o princípio da atualidade da compreensão, da adequação do mesmo ao objeto, ou seja, percebe que a vinculação do intérprete com sua própria posição representa um momento integrante da verdade hermenêutica. VERDADE E MÉTODO II ANEXOS 27.
Gadamer (VM): opinião do autor
- Gadamer (VM): significado hermenêutico
- Gadamer (VM): símbolo
- Gadamer (VM): sinal
- Gadamer (VM): situação hermenêutica
- Gadamer (VM): subjetividade e objetividade
- Gadamer (VM): sujeito e objeto
- Gadamer (VM): tarefa da compreensão
- Gadamer (VM): tarefa da hermenêutica
- Gadamer (VM): tarefa hermenêutica
- Gadamer (VM): tema da hermenêutica