Ferreira da Silva (2010:97) – objeto e mundo

A exterioridade do objeto em relação ao pensamento nunca significou a sua exterioridade e independência em relação ao projeto instituidor das coisas e do próprio pensamento. A experiência de uma independência das coisas não nos faria romper o círculo de imanência no qual estamos abandonados, mas nos faria ler no próprio objeto a cifra histórica à qual pertencemos. O mundo espelha, portanto, a nossa própria constituição transcendental e é, em última análise, a exposição externa do projeto ao qual devemos o nosso modo (97) de ser. Contudo, o objetivismo ao qual nos referimos seria uma tentativa de desembaraçarmo-nos desse compromisso com a imagem efêmera do hominismo e da imanência do seu mundo próprio. Enquanto permanecermos cativos dessa imagem, todo o esforço do realismo nada mais será do que um idealismo que se desconhece a si mesmo, nesse caso tendo razão Hegel, quando afirmava que toda filosofia é idealismo. A transcendência do objeto nunca poderá significar uma transcendência ao mundo no qual ele se encontra imerso. O mundo é o prius de todo o ente e de toda a realidade intramundana: isso nos foi revelado definitivamente pela analítica existencial de Heidegger.

(Excerto de FERREIRA DA SILVA, Vicente. Transcendência do Mundo. São Paulo: É Realizações, 2010, p. 97)