Agora, porém, devemos prestar atenção para o fato de que nas questões acima não se procura apenas uma delimitação mais exata do que é natureza, movimento, beleza; mas é preciso cuidar para que ao mesmo tempo se dê uma explicação sobre o que significa o “que”, em que sentido se deve compreender o ti. Aquilo que o ‘que’ significa se designa o quid est, tó quid: a quidditas, a qüididade. Entretanto, a quidditas se determina diversamente nas diversas épocas da filosofia. Assim, por exemplo, a filosofia de Platão é uma interpretação característica daquilo que quer dizer o ti. Ele significa precisamente a ideia. O fato de nós, quando perguntamos pelo ti, pelo quid, nos referimos à “ideia” não é absolutamente evidente. Aristóteles dá uma outra explicação do ti que Platão. Outra ainda dá Kant e também Hegel explica o tí de modo diferente. Sempre se deve determinar novamente aquilo que é questionado através do fio condutor que representa o ti, o quid, o “que”. Em todo caso: quando, referindo-nos à filosofia, perguntamos: que é isto?, levantamos uma questão originariamente grega. Que é isto – A Filosofia?
O anèr philósophos ama o sophón. O que esta palavra diz para Heráclito é difícil traduzir. Podemos, porém, elucidá-lo a partir da própria explicação de Heráclito. De acordo com isto, tá sophón significa: Hèn Pánta ‘Um (é) Tudo’. Tudo quer dizer aqui: Pánta tà ónta, a totalidade, o todo do ente. Hèn, o Um, designa: o que é um, o único, o que tudo une. Unido é, entretanto, todo o ente no ser. O sophón significa: todo ente é no ser. Dito mais precisamente: o ser é o ente. Nesta locução, o “é” traz uma carga transitiva e designa algo assim como “recolhe”. O ser recolhe o ente pelo fato de que é o ente. O ser é o recolhimento – Lógos. Que é isto – A Filosofia?
Entretanto, mesmo os gregos tiveram que salvar e proteger o poder de espanto deste mais espantoso – contra o ataque do entendimento sofista, que dispunha logo de uma explicação, compreensível para qualquer um, para tudo e a difundia. A salvação do mais espantoso – ente no ser – se deu pelo fato de que alguns se fizeram a caminho na sua direção, quer dizer, do sophón. Estes tomaram-se por isto aqueles que tendiam para o sophón e que através de sua própria aspiração despertavam nos outros homens o anseio pelo sophón e o mantinham aceso. O philein tà sophón, aquele acordo com o sophón de que falamos acima, a harmonia, transformou-se em órexis, num aspirar pelo sophón. O sophón – o ente no ser – é agora propriamente procurado. Pelo fato de o philein não ser mais um acordo originário com o sophón, mas um singular aspirar pelo sophón, o philein tó sophón torna-se “philosophía”. Esta aspiração é determinada pelo Éros. Que é isto – A Filosofia?
A filosofia procura o que é o ente enquanto é. A filosofia está a caminho do ser do ente, quer dizer, a caminho do ente sob o ponto de vista do ser. Aristóteles elucida isto, acrescentando uma explicação ao ti tó ón, que é o ente?, na passagem acima citada: toutó esti tís he ousia? Traduzido: “Isto (a saber, ti tà ón) significa: que é a entidade do ente?” O ser do ente consiste na entidade. Esta, porém – a ousia -, é determinada por Platão como ideia, por Aristóteles como enérgeia. Que é isto – A Filosofia?
De nenhum modo afirmamos com isto que a definição aristotélica de filosofia tenha valor absoluto. Pois ela é já em meio à história do pensamento grego uma determinada explicação daquele pensamento e do que lhe foi dado como tarefa. A caracterização aristotélica da filosofia não se deixa absolutamente retraduzir no pensamento de Heráclito e de Parmênides; pelo contrário, a definição aristotélica de filosofia certamente é livre continuação da aurora do pensamento e seu encerramento. Digo livre continuação porque de maneira alguma pode ser demonstrado que as filosofias tomadas isoladamente e as épocas da filosofia brotam uma das outras no sentido da necessidade de um processo dialético. Que é isto – A Filosofia?
Sobre o nada a metafísica se expressa desde a Antiguidade numa enunciação, sem dúvida, multívoca: ex nihilo nihil fit, do nada nada vem. Ainda que, na discussão do enunciado, o nada, em si mesmo, nunca se torne problema, expressa ele, contudo, a partir do respectivo ponto de vista sobre o nada, a concepção fundamental do ente que aqui é condutora. A metafísica antiga concebe o nada no sentido do não-ente, quer dizer, da matéria informe, que a si mesma não pode dar forma de um ente com caráter de figura, que, desta maneira, oferece um aspecto (eidos). Ente é a figura que se forma a si mesma, que enquanto tal se apresenta como imagem, origem, justificação e limites desta concepção de ser são tão pouco discutimos como o é o próprio nada. A dogmática cristã, pelo contrário, nega a verdade do enunciado: ex nihilo nihil fit e dá, com isto, uma significação modificada ao nada, que então passa a significar a absoluta ausência de ente fora de Deus: ex nihilo fit – ens creatum. O nada torna-se agora o conceito oposto ao ente verdadeiro, ao summum ens, a Deus enquanto ens increatum. Também a explicação do nada indica a concepção fundamental do ente. A discussão metafísica do ente mantém-se, porém, ao mesmo nível que a questão do nada. As questões do ser e do nada enquanto tais não têm lugar. É por isso que nem mesmo preocupa a dificuldade de que, se Deus cria do nada, justamente precisa poder entrar em relação com o nada. Se, porém, Deus é Deus, não pode ele conhecer o nada, se é certo que o “absoluto” exclui de si tudo o que tem caráter de nada. QUE É METAFÍSICA?
A postura correta diante destas proposições surge de uma renovada meditação da preleção. Ela deve examinar se o nada, que dispõe a angústia em sua essência, se esgota numa vazia negação de tudo o que é, ou se – o que jamais e em parte alguma é um ente – se desvela como aquilo [68] que se distingue de todo ente e que nós chamamos o ser. Em qualquer lugar e em qualquer amplitude em que a pesquisa explore o ente, em parte alguma, encontra ela o ser. Ela apenas atinge sempre o ente porque, antecipadamente, já na intenção de sua explicação, permanece junto do ente. O ser, porém, não é uma qualidade ôntica do ente. O ser não se deixa representar e produzir objetivamente à semelhança do ente. O absolutamente outro com relação ao ente é o não-ente. Mas este se desdobra (west) como ser. Com demasiada pressa renunciamos ao pensamento quando fazemos passar, numa explicação superficial, o nada pelo puramente nadificador e o igualamos ao que não tem substância. Em vez de cedermos a esta pressa de uma perspicácia vazia e sacrificarmos a enigmática multivocidade do nada, devemos armar-nos com a disposição única de experimentarmos no nada a amplidão daquilo que garante a todo ente (a possibilidade de) ser. Isto é o próprio ser. Sem o ser, cuja essência abissal, mas ainda não desenvolvida, o nada nos envia na angústia essencial, todo ente permaneceria na indigência do ser. Mas mesmo esta indigência do ser, enquanto abandono do ser, não é, por sua vez, um nada nadificador, se é certo que à verdade do ser pertence o fato de que o ser nunca se manifesta (west) sem o ente, de que jamais o ente é sem o ser. QUE É METAFÍSICA?
Seja qual for o modo de explicação do ente, como espírito no sentido do espiritualismo, como matéria e força no sentido do materialismo, como vir-a-ser e vida, como representação, como vontade, como substância, como sujeito, como enérgeia, como eterno retorno do mesmo, sempre o ente enquanto ente aparece na luz do ser. Em toda parte, se iluminou o ser, quando a metafísica representa o ente. O ser se manifestou num desvelamento (alétheia). Permanece velado o fato e o modo como o ser traz consigo tal desvelamento, o fato e o modo como o ser mesmo se situa na metafísica e a assinala enquanto tal. O ser não é pensado em sua essência desveladora, isto é, em sua verdade. Entretanto, a metafísica fala da inadvertida revelação do ser quando responde a suas perguntas pelo ente enquanto tal. A verdade do ser pode chamar-se, por isso, o chão no qual a metafísica, como raiz da árvore da filosofia, se apóia e do qual retira seu alimento. Pelo fato de a metafísica interrogar o ente, enquanto ente, permanece ela junto ao ente e não se volta para o ser enquanto ser. Como raiz da árvore ela envia todas as seivas e forças para o tronco e os ramos. A raiz se espalha pelo solo para que a árvore dele surgida possa crescer e abandoná-lo. A árvore da filosofia surge do solo onde se ocultam as raízes da metafísica. O solo é, sem dúvida, o elemento no qual a raiz da árvore se desenvolve, mas o crescimento da árvore jamais será capaz de assimilar em si de tal maneira o chão de suas raízes que desapareça como algo arbóreo na árvore. Pelo contrário, as raízes se perdem no solo até as últimas radículas. O chão é chão para a raiz; dentro dele ela se esquece em favor da árvore. Também a raiz ainda pertence à árvore, mesmo que a seu modo se entregue ao elemento do solo. Ela dissipa seu elemento e a si mesma pela árvore. Como raiz ela não se volta para o solo; ao menos não de modo tal como se fosse sua essência desenvolver-se apenas para si mesma neste elemento. Provavelmente, também o solo não é tal elemento sem que o perpasse a raiz. O RETORNO AO FUNDAMENTO DA METAFÍSICA
Leibniz, de um modo que lhe é característico, dá aqui, junto com a determinação das “primeiras verdades”, uma determinação daquilo que verdade primeiramente e em geral é, e isto com a intenção de demonstrar o “nascimento” do principiam rationis da natura veritatis. E, justamente nesta empresa, tem ele por necessário apontar para o fato de que a aparente evidência de conceitos tais como “verdade”, “identidade”, impede uma clarificação dos mesmos, que seria suficiente para apresentar a origem do principiam rationis e dos outros axiomas. Mas, para a presente consideração, não está em questão a dedução do principiam rationis, mas a explicação articuladora do problema do fundamento. Em que medida oferece a passagem citada um fio condutor para isto? SOBRE A ESSÊNCIA DO FUNDAMENTO
Mas, afinal, é preciso ainda proceder-se a um especial desvelamento da essência da verdade? Não está a essência pura da verdade suficientemente explicitada por esta noção comumente válida que nenhuma teoria perturba e que protege sua evidência. Se, enfim, tomarmos a redução da verdade da proposição à verdade da coisa, por aquilo que ela significa ordinariamente, a saber, por uma explicação teológica, e se procurarmos manter inteiramente depurada a determinação filosófica da essência de qualquer intromissão da teologia e se restringirmos o conceito de verdade à verdade da proposição, então nos encontramos, ao mesmo tempo, com uma tradição antiga do pensamento, ainda que não a mais antiga, segundo a qual a verdade consiste na concordância (omóiosis) de uma enunciação (logos) com o seu objeto (pragma). Que nos restará para investigar se admitirmos que sabemos o que significa a concordância de uma enunciação com uma coisa? Mas sabemos nós isto? SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE
A questão da essência da verdade se origina da questão da verdade da essência. Aquela questão entende essência, primeiramente, no sentido de qüididade (quidditas) ou de realidade (realitas) e entende a verdade como uma característica do conhecimento. A questão da verdade da essência entende essência em sentido verbal e pensa, nesta palavra, ainda permanecendo no âmbito da representação metafísica, o ser (Seyn) como a diferença que impera entre ser e ente. Verdade significa o velar iluminados enquanto traço essencial do ser (Seyn). A questão da verdade encontra sua resposta na proposição: a essência é a verdade da essência. Após a explicação descobre-se, com facilidade, que a proposição não inverte simplesmente um aglomerado de palavras, nem quer suscitar a impressão de paradoxo. O sujeito da proposição é, caso esta fatal categoria gramatical ainda possa ser usada, a verdade da essência. O velar iluminados é, quer dizer, faz com que se desdobre (Wesen) a concordância entre conhecimento e ente. A proposição não é dialética. Não é de maneira alguma uma proposição no sentido de uma enunciação. A resposta à questão da essência da verdade é a dicção de uma viravolta no seio da história do ser (Seyn). Porque ao ser pertence o velar iluminados, aparece ele originariamente à luz da retração que dissimula. O nome desta clareira é alétheia. SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE
Entretanto, já fixamos a mesmidade de pensar e ser como o comum-pertencer de ambos. Isto foi apressado, talvez mesmo forçado. Devemos fazer reverter isto que foi resultado da pressa. Disso também somos capazes, na medida em que não tomamos como definitivo o mencionado comum-pertencer e não o arvoramos em explicação definitiva e decisiva da mesmidade de pensar e ser. IDENTIDADE E DIFERENÇA
O que determina, em última análise, cada mônada a ser exatamente esta? Como se constitui a própria individuação? O recurso à criação é apenas a explicação dogmática da origem do individuado, mas não é a elucidação da individuação mesma. Em que consiste esta? A resposta a esta questão deve clarificar ainda mais a essência da mônada. A DETERMINAÇÃO DO SER DO ENTE SEGUNDO LEIBNIZ
Se antes pusemos de lado a conexão com a criação, isto ocorreu apenas porque no caso se trata de uma explicação dogmática. O sentido metafísico, entretanto, que na caracterização da mônada como criada é expresso, é a finitude. Sob o ponto de vista formal designa finitude: limitação. Em que medida é a pulsão limitável? A DETERMINAÇÃO DO SER DO ENTE SEGUNDO LEIBNIZ
De onde recebe “ser” o sentido de “somente posição”? A partir de que e como se define o sentido da expressão “pura posição”? Não permanece a explicação de ser como posição estranha, arbitrária até, de qualquer maneira plurívoca e, por isso, imprecisa? A TESE DE KANT SOBRE O SER
No uso lógico do ser (a e b) trata-se da posição da relação entre o sujeito da proposição e o predicado. No uso ôntico do ser – a pedra é (“existe”) -, trata-se da posição da relação entre o eu-sujeito e o objeto, isto, todavia, de tal maneira que a relação sujeito-predicado se intercala, por assim dizer, atravessada entre a relação sujeito-objeto. Isto implica: o “é” da cópula possui, no enunciado de um conhecimento objetivo, um sentido diferente e mais rico que o sentido puramente lógico. Entretanto, mostrar-se-á que Kant chega a esta convicção somente após longa reflexão, formulando-a mesmo apenas na segunda edição da Crítica da Razão Pura. Seis anos após a primeira edição foi ele capaz de dizer qual é a situação do “é”, isto é, do ser. Apenas a Crítica da Razão Pura traz plenitude e determinidade à explicação do ser como posição. A TESE DE KANT SOBRE O SER
A “natureza do objeto”, quer dizer aqui a essência do ser, não permite um grau maior de clarificação. Entretanto, para Kant, uma coisa, desde o início, é certa: ele pensa existência e ser “na relação com as capacidades de nosso entendimento”. Também na Crítica da Razão Pura ser é determinado ainda e novamente como posição. É verdade que a reflexão critica não atinge “um grau mais elevado de clarificação”, mas isto pela maneira pré-critica de explicitar e de decompor conceitos. Mas a Crítica alcança outro gênero de explicação de ser e de seus diferentes modos, os quais conhecemos sob os nomes de ser-possível, ser-atual, ser-necessário. A TESE DE KANT SOBRE O SER
Entretanto, através da afecção por nossos sentidos é-nos dada uma multiplicidade de representações. Para que o dado “confuso”, a torrente desta multiplicidade, chegue a se estabilizar e mostrar se possa um ob-stante, o múltiplo deve ser ordenado, quer dizer, ligado. Esta ligação, todavia, jamais pode originar-se dos sentidos. Segundo Kant, todo o ligar se origina daquela faculdade de representação que se chama entendimento. Sua característica fundamental é o ato de pôr enquanto síntese. A posição tem o caráter da proposição, isto é, do juízo, através do qual algo é pro-posto enquanto algo, pelo qual um predicado é atribuído a um sujeito pelo “é”. Mas, na medida em que a posição como proposição se refere necessariamente ao dado na afecção, para que um objeto possa ser conhecido por nós, o “é” como cópula adquire, a partir disto, um sentido novo. Somente na segunda edição da Crítica da Razão Pura (§ 19,B 140 ss.) Kant determina este sentido novo. Escreve no início do § 19: “Nunca pude contentar-me com a explicação que os lógicos dão de um juízo em geral: dizem que é a representação de uma relação entre dois conceitos”. A TESE DE KANT SOBRE O SER
No que se refere a esta explicação, Kant descobre “que aqui permanece indeterminado aquilo em que consiste esta relação”. Kant experimenta, na explicação lógica do juízo, a ausência daquilo em que se fundamenta a posição do predicado e sua relação com o sujeito. O sujeito gramatical da proposição somente pode exercer o ato de fundar enquanto objeto para o eu-sujeito que conhece. É por isso que Kant prossegue, abrindo um novo parágrafo no texto: “Mas, se examino mais exatamente a relação que existe entre conhecimentos dados em cada juízo e se os distingo, enquanto pertencem ao entendimento, da relação que se estabelece pelas leis da imaginação reprodutiva (a qual [relação] tem apenas validade subjetiva), então descubro que um juízo não é outra coisa que a maneira de levar conhecimentos dados à unidade objetiva da apercepção. O papel que representa a palavrinha relacional é, nestes juízos, é distinguir a unidade objetiva das representações dadas, de sua unidade subjetiva”. A TESE DE KANT SOBRE O SER
No desenvolvimento da Crítica não é abandonada nem a determinação do ser como posição, nem, muito menos, em geral o conceito de ser. É por isso que se pode dizer que é um erro do neokantismo, cujas conseqüências ainda hoje se fazem sentir, pensar que, pela filosofia de Kant, foi, como se diz, “liquidado” o conceito de ser. O sentido de ser (presença constante) que impera desde a Antiguidade não apenas é mantido na explicação critica que Kant dá do ser como objetividade do objeto da experiência; ao contrário, através da determinação ‘objetividade’, ele se manifesta em uma forma excepcional, enquanto é justamente encoberto, e deformado até, através da explicação do ser como substancialidade da substância, explicação imperante na história da filosofia. Kant, entretanto, determina o “substancial” sempre no sentido da explicação critica do ser como objetividade: O elemento substancial não significa outra coisa “que o conceito de objeto em geral, o qual subsiste na medida em que nele se pensa somente o sujeito transcendental, sem quaisquer predicados” (A 414, B 441). A TESE DE KANT SOBRE O SER
Conseqüentemente, a explicação sistemática do ser do ente, isto é, da objetividade do objeto da experiência, somente pode realizar-se conforme princípios. Nesta situação reside a razão por que, através de Hegel, no caminho aberto por Fichte e Schelling, “a ciência da lógica” se transforma em dialética, num movimento de princípios que circula em si mesmo, sendo ele mesmo a absolutidade do ser. Kant introduz a “representação sistemática de todos os princípios sintéticos” do entendimento puro com a seguinte proposição (A 158-59, B 197-98): “O fato de em geral se encontrarem princípios em alguma parte é devido, unicamente, ao entendimento puro; pois ele não é somente o poder das regras em referência ao que acontece, mas ele próprio é a fonte dos princípios e é ele que obriga tudo que somente se pode apresentar a nós como objeto a se submeter às regras, porque, sem estas regras, os fenômenos não forneceriam jamais o conhecimento de um objeto que lhes corresponde”. A TESE DE KANT SOBRE O SER
Atentamos agora somente para o fato e o modo como, na explicação kantiana dos modos de ser, o ser é pensado como posição. A TESE DE KANT SOBRE O SER
Antes de, na conclusão, elucidarmos a referida ambigüidade, parece de utilidade mostrar, ainda que em grandes traços, como fala, na interpretação kantiana do ser como posição, a tradição. Já do primeiro texto de Kant, o Argumento, podemos concluir que a explicação do ser se efetua em função da existência, pelo fato de ser tema de consideração a “demonstração do ser-aí (existência) de Deus”. Em vez de “ser-aí” diz a linguagem metafísica também existência. Basta lembrar esta palavra para reconhecer no sistere, no pôr, a ligação com o ponere e a posição; a exsistentia é o actus, quo res sistitur, ponitur extra statum possibilitatis (cf. Heidegger, Nietzsche, 1961, vol. II, pág. 417 e ss.). A TESE DE KANT SOBRE O SER
“Ser enquanto o Ereignis” – outrora pensou a Filosofia o ser enquanto idéa, enquanto enérgeia, enquanto actualitas, enquanto vontade, sempre a partir do ente, e agora-poder-seria dizer-pensa o ser enquanto Ereignis. Assim compreendido, Ereignis significa uma explicação derivada do ser, a qual, caso apresente foros de legitimidade, representa a continuação da metafísica. O “enquanto” significa neste caso: Ereignis como uma espécie de ser, subordinado ao ser, que constitui o conceito central ainda retido. Pensemos, contudo, como foi tentado, ser no sentido de presentar e presentificar, que se dão no destino, o qual, por sua vez, repousa no iluminados-velador alcançar do tempo autêntico, então o ser faz parte do acontecer apropriados. É dele que o dar e o seu dom recebem sua determinação. Nesse caso o ser seria uma espécie de Ereignis e não o Ereignis uma espécie de ser. TEMPO E SER
A explicitação do tempo tem primeiro em vista o caráter de temporalização da temporalidade do ser-aí, para o elemento estático, que em si já contém – sem que este estado se coisas seja expressamente nomeado na parte de Ser e Tempo que alcançou publicação (vide Ser e Tempo, § 28) – uma indicação em direção da verdade, da clareira, do desvelamento do ser enquanto ser. Já em Ser e Tempo, portanto – ainda que aí a explicação do tempo permaneça limitada à temporalidade do ser-aí, e ainda nada se fale do caráter temporal do ser (enquanto na conferência Tempo e Ser o papel do ser humano para a clareira do ser é intencionalmente silenciado) -, é o tempo, pela referência à alétheia e ao presentar, tirado da compreensão ordinária, desde o início, e recebeu um sentido novo. PROTOCOLO DO SEMINÁRIO SOBRE A CONFERÊNCIA “TEMPO E SER”
Primeiramente reside uma crassa contradição na frase: “A tentativa de pensar ser sem o ente impõe-se porque, de outra maneira, penso não haver possibilidade de abrir propriamente os olhos para o ser daquilo que é ao redor do globo terrestre”. A necessidade e a possibilidade desta contradição não foram mais longamente esclarecidas; apontou-se apenas o fato de que está em conexão com a ambigüidade do arrazoamento [Vide a explicação do termo em O Princípio de Identidade, nota 4. (N. do T.)], é neste que se pensa, ao ser usada a expressão “o ser daquilo que hoje… é”. PROTOCOLO DO SEMINÁRIO SOBRE A CONFERÊNCIA “TEMPO E SER”
Se atravessarmos com um olhar a totalidade da história da filosofia, “Hegel e os Gregos”, consumação e começo desta história, tornamo-nos pensativos e perguntamos: não se alteia sobre o começo do caminho da filosofia em Parmênides a alétheia, a verdade? Porque não a deixa Hegel tomar a palavra? Compreende ele com a palavra “verdade” outra coisa que desvelamento? Sem dúvida. Verdade é para Hegel a evidência absoluta do sujeito que se sabe a si mesmo. Para os gregos, porém, segundo sua explicação, o sujeito ainda não se manifesta enquanto sujeito. Por conseguinte, a Alétheia não pode ser o elemento determinante para a verdade no sentido da certeza. HEGEL E OS GREGOS