Na palavra tò mè dynon pote evoca-se algo cuja essência está determinada por dynein. dyno está ligado a dyo, que significa aprofundar, mergulhar. O sol penetra no mar e aí declina (se põe), pros dynontos heliou diz: em direção ao sol que declina, “gen Abend”, “gegen Westen”, inclinando-se para o poente, o Ocidente, nephea dynai diz: declinar nas nuvens, desaparecer atrás das nuvens. Compreendido como dynein, isto é, pensado de modo grego, “declinar” [Untergehen] é o desaparecer da presença [Verschwinden aus der Anwesenheit] e, na verdade, no modo de sair e penetrar no que se oculta, ou seja, se encobre. Pensado no modo grego, declinar tem como essência adentrar o encobrimento [Eingehen in eine Verbergung]. De modo bem diverso, pensamos as palavras “declinar”, “declínio” [Untergang], na acepção pura e simples de um desaparecimento indeterminado [unbestimmte Verschwinden]. “Declinar” é para nós cair, decair, aniquilar-se. “Declinar” é passar para o que não é mais. Vitória ou declínio [Sieg oder Untergang] – ser ou não ser [Sein oder Nichtsein]. Mas, pensado de modo grego, no sentido de “adentrar o encobrimento” [Eingehens in eine Verbergung], “declinar” não é, de modo algum, não mais ser e não ser [Nichtmehrsein und Nichtsein]. Pensado de modo grego, ou seja, experimentado [66] originariamente no sentido de adentrar o encobrimento, “declinar” é bem mais “um” ser, ou até mesmo o ser. Declinar é tornar-se encoberto [Verborgenwerden], é um encobrimento [Verbergung], em grego, lanthano, latho: “declinar”, declínio, no sentido do ocaso, do pôr-do-sol. O declínio do sol não é o seu “aniquilamento” e, de modo algum, o seu não ser. É bem verdade que, desde Copérnico, o declínio do sol não passa de ilusão de ótica. A ciência moderna sabe bem mais sobre isso. Declínios do sol só existem para “poetas” e “apaixonados”. No lugar do encantamento do mundo surge um outro encantamento. Mágica é, agora, a própria “física”, assumida como o desempenho humano mais elevado. O homem se encanta agora consigo mesmo. O homem moderno é agora o mágico. Acabamos de ouvir a palavra de Hegel: nada pode resistir à vontade humana de descobrir o universo. Pressupõe-se aqui, sem dúvida, que aquilo que essa vontade subjuga em sua descoberta é o Universum, isto é, o que se dirige para o uno e o único – versus unum. O “universum” é o que se descobre e oferece para a fruição. Mas Heráclito fala do Mesmo. Sua sentença não fala de um declínio mas, ao contrário, de um mè dynon pote, do que “nunca declina”. Certo. Mas permanece a questão de se aquilo que Heráclito chama de nunca declinar é o mesmo que Hegel pensa como o que se abre e descobre essencialmente. Admitindo-se que sejam o mesmo, o fragmento de Heráclito diz que o homem não pode se manter encoberto face ao que nunca declina, ao passo que, em Hegel e no pensamento moderno, o que se abre e descobre é, ao contrário, o que não pode resistir à conquista do homem. Mas talvez o moderno e o originário se encontrem num outro tipo de relacionamento, diverso de uma simples inversão. De todo modo, a palavra originária nos exige que pensemos o “declinar” e o “declínio” como “adentrar o encobrimento”. [GA55MSC:66-67]