Heidegger, fenomenologia, hermenêutica, existência

Dasein descerra sua estrutura fundamental, ser-em-o-mundo, como uma clareira do AÍ, EM QUE coisas e outros comparecem, COM QUE são compreendidos, DE QUE são constituidos.

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quarta-feira 13 de dezembro de 2023

Handeln, Handel, Einwirkung

Esse contexto de fundamentAÇÃO dos modos de ser-no-mundo constitutivos do conhecimento de mundo evidencia que, ao conhecer, a presença [Dasein] adquire um novo estado de ser, no tocante ao mundo já sempre descoberto. Esta nova possibilidade de ser pode desenvolver-se autonomamente, pode tornar-se uma tarefa e, como ciência, assumir a direção do ser-no-mundo. Todavia, não é o conhecimento quem cria pela primeira vez um “commercium” do sujeito com um mundo e nem este commercium surge de uma AÇÃO [Einwirkung] exercida pelo mundo sobre o sujeito. Conhecer, ao contrário, é um modo da presença [Dasein] fundado no ser-no-mundo. É por isso também que, como constituição fundamental, o ser-no-mundo requer uma interpretAÇÃO preliminar. STMSC: §13

Enquanto totalidade originária de sua estrutura, a cura se acha, do ponto de vista existencial-a priori, “antes” de toda “atitude” e “situAÇÃO” da presença [Dasein], o que sempre significa dizer que ela se acha em toda atitude e situAÇÃO fática. Em consequência, esse fenômeno não exprime, de modo algum, um primado da atitude “prática” frente à teórica. A determinAÇÃO meramente contemplativa de algo simplesmente dado não tem menos o caráter da cura do que uma “AÇÃO [Aktion] política” ou a satisfAÇÃO do entretenimento. “Teoria” e “prática” são possibilidades ontológicas de um ente cujo ser deve determinar-se como cura. STMSC: §41

O querer-ter-consciência é, sobretudo, a pressuposição existenciária mais originária da possibilidade do ser e estar faticamente em dívida. Compreendendo o apelo, a presença [Dasein] deixa que o si-mesmo mais próprio aja dentro dela a partir da possibilidade de ser escolhida. Apenas assim ela pode ser responsável. Faticamente, porém, toda AÇÃO [Handeln] é necessariamente “desprovida de consciência” não só porque ela de fato não evita a culpabilizAÇÃO moral mas porque, fundada no nada de seu projeto nulo, sempre já está em dívida com os outros. Assim, o querer-ter-consciência significa assumir a falta essencial de consciência, unicamente aonde subsiste a possibilidade existenciária de ser “bom”. STMSC: §58

É a partir da expectativa de uma indicAÇÃO útil das possibilidades de “AÇÃO” [Möglichkeiten des »Handelns«] seguras, disponíveis e calculáveis que se sente a falta de um conteúdo “positivo” no que se apela. Essa expectativa funda-se no horizonte da ocupAÇÃO que compreende e força a existência da presença [Dasein] à ideia de um todo negociável segundo regras. Tais expectativas que, em parte, constituem também o solo implícito da exigência de uma ética material dos valores frente a uma ética “meramente” formal acabam se decepcionando com a consciência. O apelo da consciência não propicia tais indicações “práticas” unicamente porque ele faz apelo à presença [Dasein] para a existência, para o poder-ser mais próprio de si mesma. Com as máximas esperadas e precisamente calculadas, a consciência negaria à existência nada menos do que a possibilidade de agir. Porque, manifestamente, a consciência não pode ser “positiva” nesse modo, ela também não funciona nesse mesmo modo “apenas negativamente”. O apelo não entreabre nada que, enquanto algo passível de ocupAÇÃO, pudesse ser positivo ou negativo, porque ele diz respeito a um ser ontologicamente diverso, qual seja, à existência. Em contrapartida, no sentido existencial, o apelo, compreendido corretamente no sentido existencial, propicia o que há “de mais positivo”, ou seja, a possibilidade mais própria que se pode dar à presença [Dasein] enquanto reclamAÇÃO apeladora do poder-ser faticamente a cada vez si-mesma. Ouvir com propriedade o apelo significa colocar-se na AÇÃO fática. Só podemos conquistar uma interpretAÇÃO plena e suficiente do que se apela no apelo quando se elaborar e apresentar a estrutura existencial à base da compreensão que propriamente escuta o interpelar como tal. STMSC: §59

O fenômeno assim exposto sob o título de decisão dificilmente poderia confundir-se com um “hábito” vazio ou com uma “veleidade” indeterminada. Não é tomando conhecimento que a decisão representa para si uma situAÇÃO. Ela já se acha em uma situAÇÃO. A presença [Dasein] já age decidida. Evitamos, propositadamente, o termo “AÇÃO” [Handeln]. Pois, por um lado, ele deve ser tomado de modo suficientemente amplo para abranger a atividade e a passividade do que opõe resistência. E, por outro, ele introduz o perigo de um equívoco ontológico da presença [Dasein] em que a decisão seria apenas um comportamento especial da faculdade prática enquanto distinta e oposta à teórica. A cura, porém, no sentido de preocupAÇÃO em ocupações, abrange o ser da presença [Dasein] de modo tão originário e total que já se deve pressupor como o todo, em qualquer distinção entre atitude prática e teórica. Ela não pode ser construída a partir dessas duas faculdades através de uma dialética necessariamente destituída de fundamentos porque não fundada existencialmente. A decisão, porém, é apenas a propriedade de si mesma possível como cura e acurada na cura. STMSC: §60

Projetou-se existencialmente um poder-ser todo em sentido próprio da presença [Dasein]. A análise e interpretAÇÃO do fenômeno desvelou o ser-para-a-morte próprio como antecipar. Em seu testemunho existenciário, o poder-ser próprio da presença [Dasein] mostrou-se na decisão, tendo sido, ao mesmo tempo, interpretado existencialmente. Como se devem conjugar ambos os fenômenos? O projeto ontológico do poder-ser todo em sentido próprio não levou a uma dimensão da presença [Dasein] muito distante do fenômeno da decisão? O que a morte tem em comum com a “situAÇÃO concreta” da AÇÃO [»konkreten Situation« des Handelns]? Será que a tentativa de forçar a união entre decisão e antecipAÇÃO não leva a uma construção insuportável, de todo não fenomenológica, que nem é capaz de reivindicar o caráter de um projeto ontológico com base fenomenal? STMSC: §61

A decisão antecipadora abre de tal maneira cada situAÇÃO do pre [das Da] que, agindo, a existência se ocupa numa circunvisão do que, faticamente, está à mão no mundo circundante. O ser que se abre junto ao que, na situAÇÃO, está à mão, isto é, o deixar vir ao encontro na AÇÃO do que é vigente no mundo circundante, só é possível numa atualizAÇÃO desse ente. A decisão só pode ser o que é como a atualidade de uma atualizAÇÃO, ou seja, o deixar vir ao encontro, sem deturpações, daquilo que ela capta na AÇÃO [handelnd
ergreift]. STMSC: §65

Numa primeira aproximAÇÃO e na maior parte das vezes, a presença [Dasein] se compreende a partir do que vem ao encontro no mundo circundante e daquilo de que se ocupa numa circunvisão. Este compreender não é um mero registro de si, que apenas acompanharia todos os comportamentos da presença [Dasein]. Compreender significa projetar-se em cada possibilidade de ser-no-mundo, isto é, existir como essa possibilidade. Assim, compreender enquanto compreensibilidade também constitui a existência imprópria do impessoal. Numa convivência pública, o que vem ao encontro da ocupAÇÃO cotidiana não é apenas o instrumento e a obra, mas também aquilo que com eles se “dá”: os “negócios”, empreendimentos, incidentes, acidentes. O “mundo” é, ao mesmo tempo, solo e palco, pertencendo, como tal, à AÇÃO e à transformAÇÃO cotidianas [alltäglichen Handel und Wandel]. Na convivência pública, os outros vêm ao encontro nesses empreendimentos em que o “impessoalmente-si-mesmo” “também navega”. O impessoal sempre conhece, discute, favorece, combate, mantém e esquece, primordialmente, na perspectiva daquilo que se empreende e daí “emerge”. Sempre calculamos, de imediato, o prosseguimento, a interrupção, a inversão e o “resultado” de cada presença [Dasein] singular a partir do andamento, do estado, da mudança e da disponibilidade daquilo de que se ocupa. Por mais trivial que possa ser a referência à compreensão de presença [Dasein], no sentido de compreensibilidade cotidiana, do ponto de vista ontológico, ela não é, de forma alguma, transparente. Mas por que, então, não se pode determinar o “nexo” da presença [Dasein] a partir das ocupações e das “vivências”? Instrumento, obra e tudo o mais em que a presença [Dasein] se detém não pertencem à “história”? Será então o acontecer da história apenas o transcurso isolado de “fluxos vivenciais” em sujeitos singulares? STMSC: §75