Santos Ser Ente

ARTIGO 2 – OBJETO DA ONTOLOGIA
Ante a constante mutabilidade do devir, ante a fugaz experiência dos fatos, que sucedem, na constante transmutação das coisas, na heterogeneidade do acontecer, tudo quanto percebo é alguma coisa, e essa alguma coisa é uma experiência de ser, e não uma experiência de nada, porque se fosse de nada, como seria alguma coisa? Como poderia ser uma experiência de não-ser, o que já é alguma coisa?

Quer na experiência que a intuição sensível me dá do mundo exterior, quer na experiência íntima de mim mesmo, alguma coisa capta sempre alguma coisa, que é alguma coisa.

Não seria difícil, portanto, desde logo concluir que a minha primeira experiência é a do ser, a de um ser que se põe ante o meu ser.

Mas, desde logo, também noto que há modalidades nessa experiência, que me revelam modalidades de ser.

Vê-se desde logo que é da experiência humana que parte, a caracterização do objeto da Ontologia.

Em face do acontecer, a meditação humana, que de imediato capta o ser, termina por considerar que tudo quanto percebe no mundo fenomênico, fluente e mutável, o mundo do devir, que é o mundo da experiência sensível do homem, aponta, na fluência constante dos fatos, que eles apresentam, em comum, o fato de ser, numa modalidade de ser, não podendo ser reduzidos a um não-ser absolutos, porque a própria experiência nega, terminantemente, considerássemo-los puro nada.

Há assim modos de ser, mas tais modos, por sua vez, apontam ainda o ser, pois tais modos são modos de…, e o de que é (o quid) é o ser. Portanto, tudo o que é (quod) tem um ser (quid). E se quod muda, quid, permanece o mesmo.

E se percebemos que o real não é estável, percebemos, porem que o real é; e se a realidades me revela modalidades diversas, tais modalidades são. Não sei ainda por que é assim ou por que poderia, ou não, não ser assim. Mas já sei que é assim. Não se alegue que esse é é uma mera cópula, que se poderia desprezar, por ex. numa língua que não o tivesse. Mas tal ausência não poderia ser considerada como uma não captação do ser, objeto primeiro da nossa experiência, que a postula desde inicio: pois como o nada poderia captar o nada, sem ser?

E se uma língua não tivesse ainda um termo para expressar o ser, se a sua conceituação ainda não se fizera nitidamente exigente de um termo que o apontasse, a experiência humana dos que usassem essa língua estaria afirmando sempre o ser de todo o predicado afirmado a um sujeito qualquer.

Portanto, a experiência, desde a intuição sensível até a mais profunda das intuições, afirma que o primeiro objeto de toda experiência é o ser, com sua complexa modalidade, com sua complexa diversidade de aspectos. Um Proteu de formas diversas, sucessivas ou simultâneas, sob diversos aspectos e relações, mas sempre ser.

Eis o objeto material da Ontologia: o ser em seus diversos aspectos e modalidades.

O objeto formal da Ontologia é a formalidade, a forma do ser. Um real dado pode ser objeto de várias ciências. A minha experiência do ser pode ser objeto da gnoseolgia, enquanto estudo a relação do conhecimento (sujeito e objeto). Mas a minha experiência, sob outra formalidade, pode ser objeto da psicologia. Mas, em ambos, tanto no gnoseológico como no psicológico, objetos diversos da minha experiência, procuro, neles, captar o comum em todo objeto da experiência, o ser em sua formalidade de ser.

E essa formalidade de ser, esse comum, que passa a ser estudado, interrogado que é (quid), eis o objeto formal da ontologia.

Portanto, desde início se coloca ao que pretende estudar tais objetos, que são o campo de ação da Ontologia, a primeira fundamental pergunta que essa ciência deve responder: que é ser? E conseqüentemente: qual o valor do conceito ser?

Em toda a minha experiência, em todos os meus juízos de existência afirmo o ser. Que é ele? Em que consiste?

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