Na tradição metafísica, em Kant em particular, a possibilidade é uma das modalidades, distinta nisso das outras categorias que são a existência e a necessidade (vide Crítica da Razão Pura, A80/B106). Esta triangulação modal repousa sobre um entendimento implícito do ente como ente aí-diante, sobree um entendimento categorial logo, do qual Kant se outorga em se referindo a Aristóteles. No entanto, sublinha Heidegger, “para Aristóteles, a questão tratando da dynamis e energeia, possibilidade e realidade, não é da ordem das categorias”. (p. 1065)
Quanto ao entendimento metafísico categorial, podemos medir tudo isto que o separa do entendimento existencial que transborda em Ser e Tempo se consideramos o fato que em Heidegger, a possibilidade não se opõe à existência (que Kant entende no sentido totalmente clássico de ser-aí), mas constitui o próprio do ser do Dasein, deste ser que tem a existir seu ser.
Com Heidegger, o possível recebe portanto de pronto um lugar eminente e o abandono do olhar categorial do ser o conduzirá mesmo, em uma das mais belas páginas que escreveu, a pensar o possível como um nome do ser (v. [GA9->breve223]).
A possibilidade é assim uma capacidade, aquela que tem a “ideia de bem” de fazer ter como bom um ente. O possível, sendo pensado como entidade do ente, é por inteiro apreendido como atitude que dá a consistência de ser. Em termos modernos, diríamos que o poder do possível se mede a seu poder de tornar efetivamente real; e o possível se torna assim o potencial — onde se lê a passagem da dynamis grega à potentia romana — na aurora da qual se avalia a vontade de poder. (v. [GA6T2->breve225])