Para compreender plenamente como Heidegger desenvolve sua concepção da existência humana, precisamos esclarecer o método empregado em Ser e Tempo. A fenomenologia do Dasein é realizada em dois estágios. No primeiro estágio, Heidegger identifica certas estruturas “formais” do Dasein que supostamente fornecem pistas iniciais sobre o que pode ser revelado no decorrer da investigação. Essas caracterizações formais, diz ele, fornecem um “esboço prévio” (Vor-zeichnung) ou “antecipação” (vorhabe), um conjunto de antecipações que guiará nossa tentativa de elaborar o ser do Dasein. Os indicadores formais são, na terminologia da fenomenologia tradicional, “intenções vazias”, pois antecipam formas concretas de experiência, mas ainda não contêm essa experiência.
No segundo estágio, Heidegger apresenta uma descrição fenomenológica da vida cotidiana para mostrar o conteúdo concreto que essas estruturas formais podem ter nos modos reais de existência. Esse segundo estágio fornece uma demonstração fenomenológica para o que é apenas formalmente indicado no estágio inicial. Enquanto as caracterizações formais indicam apenas o que o Dasein é in potentia, como uma “capacidade de ser” (Seinkönnen), a descrição de modos de ser concretos e existentes mostra como essas potencialidades podem e de fato assumem uma forma real em nossas vidas. É uma suposição fundamental do método fenomenológico de Heidegger que nenhuma afirmação ontológica pode ser aceita a menos que seja apoiada pela experiência concreta. O que é proposto nas “indicações formais” do primeiro estágio, portanto, requer “atestação” concreta à medida que a análise prossegue — como diz Heidegger, sua analítica existencial primeiro “pressupõe” estruturas formais que são colocadas em palavras “para que [o Dasein] possa decidir por si mesmo se, como entidade que é, tem a composição do ser que foi revelada na projeção de seus aspectos formais” (SZ:362).1