Naturalmente, o sentido literal da Escritura não se entende univocamente em todas as suas passagens nem a todo momento. Pois, é o conjunto da Escritura Sagrada o que guia a compreensão do individual — da mesma forma que, ao inverso, este conjunto só pode ser apreendido quando se realizou a compreensão do individual. Esta relação circular do todo e das partes não é, em si, nenhuma novidade. A retórica antiga já sabia disso, ela que comparava o discurso perfeito com o corpo orgânico com a relação entre a cabeça e os membros. Lutero e seus seguidores transferiram essa imagem conhecida da retórica clássica ao procedimento da compreensão, e desenvolveram como princípio fundamental e geral de uma interpretação de texto o fato de que todos os aspectos individuais de um texto devem ser compreendidos a partir do contextus, do conjunto, e a partir do sentido unitário para o qual o todo está orientado, o scopus. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 1.
Desta posição intermediária, onde a hermenêutica tem que ocupar seu posto, resulta que sua tarefa não é desenvolver um procedimento da compreensão, mas esclarecer as condições sob as quais surge compreensão. Mas essas condições não têm todas o modo de ser de um “procedimento” ou de um método de tal modo que quem compreende poderia aplicá-las por si mesmo — essas condições têm de estar dadas. Os preconceitos e opiniões prévias que ocupam a consciência do intérprete não se encontram à sua disposição, enquanto tais. Este não está em condições de distinguir por si mesmo e de antemão os preconceitos produtivos, que tornam possível a compreensão, daqueles outros que a obstaculizam, os mal-entendidos. VERDADE E MÉTODO SEGUNDA PARTE 2.