VIDE Rück-gang
passo-de-volta (MHeidegger 189)
O passo de volta aponta para o âmbito, até aqui saltado, a partir do qual a essência da verdade se torna, antes de tudo, digna de ser pensada.
Após esta rápida caracterização da diferença do pensamento de Hegel e do nosso, no que se refere ao objeto, no que se refere à medida e ao caráter de um diálogo com a história do pensamento, tentamos pôr em marcha, com um pouco mais de clareza, o diálogo iniciado com Hegel. Isto significa: ousamos uma experiência com o passo de volta (NT: O passo de volta, como re-gresso (Rück-gang), representa o movimento contrário do passo para diante, como progresso (Fort-gang), de Hegel. A grande questão que fica aberta é: pode-se realizar o passo de volta sem a mediação, elemento axial do passo para diante, exigido por Hegel?). A expressão “passo de volta” suscita múltiplas interpretações falsas. “Passo de volta’ não significa um passo isolado do pensamento, mas uma espécie de movimento do pensamento e um longo caminho. Na medida em que o passo de volta determina o caráter de nosso diálogo com a história do pensamento ocidental, o pensamento conduz, de certo modo, para fora do que até agora foi pensado na filosofia. O pensamento recua diante de seu objeto, o ser, e põe o que foi assim pensado num confronto, em que vemos o todo desta história, e, na verdade, sob o ponto de vista daquilo que constitui a fonte de todo este pensamento, enquanto lhe prepara, enfim, o âmbito de sua residência. Isto não é, à diferença com Hegel, um problema já transmitido e já formulado, mas aquilo que, em toda parte, através de toda esta história do pensamento, não foi questionado. Designamo-lo provisória e inevitavelmente na linguagem da tradição. Falamos da diferença entre o ser e o ente. O passo de volta vai do impensado, da diferença enquanto tal, para dentro do que deve ser pensado. Isto é o esquecimento da diferença. O esquecimento a ser aqui pensado é o velamento da diferença enquanto tal, pensado a partir da léthe (ocultamente), velamento que por sua vez originariamente se subtrai. O esquecimento faz parte da diferença porque esta faz parte daquele. O esquecimento não surpreende a diferença, apenas posteriormente, em conseqüência de uma distração do pensamento humano.
A diferença de ente e ser é o âmbito no seio do qual a metafísica, o pensamento ocidental em sua totalidade essencial, pode ser aquilo que é. O passo de volta, portanto, se movimenta para fora da metafísica e para dentro da essência da metafisica. A observação sobre o emprego que Hegel faz parte da palavra-guia “ser”, em sua pluralidade de sentidos, permite reconhecer que o discurso sobre ser e ente jamais se deixa fixar numa época da história reveladora de “ser”. O discurso do “ser” também jamais compreende este nome no sentido de um gênero, sob cuja vazia universalidade se alinham, como casos individuais, as doutrinas do ente historicamente apresentadas. “Ser” fala sempre historialmente e, por isso, perpassado pela tradição.
Ora, o passo de volta da metaffsica para dentro de sua essência exige uma duração e perseverança cuja medida nós não conhecemos. Somente uma coisa está bem clara: o passo carece de uma preparação que deve ser tentada aqui e agora; isto, entretanto, em face do ente enquanto tal em sua totalidade, como agora é e como rapidamente e de maneira mais inequívoca começa a mostrar-se. O que agora é vai sendo caracterizado pela dominação da essência da técnica moderna, dominação que se apresenta já em todas as esferas da vida, através de múltiplos sinais que podem ser nomeados: funcionalização, perfeição, automatização, burocratização, informação. Assim como chamamos de Biologia a representação do que é vivo, assim pode ser chamada Tecnologia e apresentação e aperfeiçoamento do ente perpassado pela essência da técnica. A expressão pode servir como caracterização para a metafísica da era atômica. O passo de volta da metafísica para dentro da essência da metafísica, visto a partir dos dias atuais e assumido a partir de sua compreensão, é o passo da Tecnologia e da descrição e interpretação tecnológicas da nossa era para dentro da essência da técnica moderna que ainda deve ser pensada.
Com esta explicação quer-se manter a distância a outra interpretação falsa da expressão “passo de volta”, que facilmente se insinua, a saber, a opinião de que o passo de volta consiste no retomo histórico aos primeiros pensadores da filosofia ocidental. Sem dúvida, o “para onde” ao qual conduz o passo de volta somente se desenvolve e se mostra através do exercício do passo. (MHeidegger 189)