Se tiver compreendido que a verdade e o valor só podem ser para nós o resultado de nossas verificações ou avaliações, em contato com o mundo, diante dos outros e em determinadas situações de conhecimento e ação, então o mundo recupera seu relevo, os atos particulares de verificação e avaliação nos quais recupero uma experiência dispersa recuperam sua importância decisiva, há algo de irrepreensível no conhecimento e na ação, na verdade e na falsidade, no bem e no mal, precisamente porque não pretendo encontrar neles uma autoevidência absoluta. A consciência metafísica e moral morre quando entra em contato com o absoluto, porque ele próprio é, além do mundo plano da consciência habitual ou adormecida, a conexão viva de mim comigo e de mim com os outros. A metafísica não é uma construção de conceitos pela qual tentamos tornar nossos paradoxos menos sensíveis; é a experiência que temos deles em todas as situações da história pessoal e coletiva — e das ações que, assumindo-os, os transformam em razão. É uma pergunta que não pode ser respondida de forma a anulá-la, mas somente por meio de uma ação resoluta que a leve adiante. Não é um conhecimento que completaria o edifício do conhecimento; é o conhecimento lúcido do que o ameaça e a consciência aguda de seu preço. A contingência de tudo o que existe e de tudo o que vale a pena não é uma verdade pequena, para a qual devemos, de alguma forma, abrir espaço em alguma dobra de um sistema; é a condição de uma visão metafísica do mundo. Essa metafísica não pode ser reconciliada com o conteúdo manifesto da religião e com a posição de um pensador absoluto do mundo.
(M. Merleau-Ponty, Sens et non-sens, Nagel, 1948, p. 185)