O próprio Heidegger deu crédito à ideia de uma cesura em sua filosofia quando escreveu que seu pensamento, a partir da década de 1930, foi marcado por uma “Kehre”, um ponto de virada. A palavra Kehre, que serve como radical para vários termos de movimento em alemão (zurückkehren, wiederkehren, Abkehr, etc.), pode ser traduzida de várias maneiras diferentes. Os comentaristas (franceses) às vezes usam as expressões “retournement”, “renversement”, “virage”, ou seja, noções que indicam uma mudança de direção. O termo Kehre também pode ser traduzido por expressões mais significativas, como “revolução” ou “conversão”. A ideia de revolução nos permite traçar paralelos, embora superficiais, com reversões em grande escala, como a “revolução copernicana” ou a “virada linguística”. A ideia de conversão é sugerida pelo fato de que o radical Kehre ocorre em expressões com conotações religiosas, como “Bekehrung” ou “Umkehr” (que traduzem o grego μετάνοια). K. Löwith, no artigo citado, discute Kehre de Heidegger e Umkehr (conversão) de forma intercambiável. Obviamente, a tradução parcialmente justificada de Kehre por revolução ou conversão iria longe demais. Vamos simplesmente apontar que é possível e, acima de tudo, que ela testemunha uma compreensão quase escatológica da Kehre, que geralmente está situada na filosofia de Heidegger e não, como o próprio Heidegger indica, na história do ser.
(GRONDIN, J. Le Tournant dans la pensée de Martin Heidegger. Paris: PUF, 1987)