Caron (2005:787) – meu eu é o Dasein

Toda essa análise nos mostra, então, que a proposição “Dasein é a cada vez meu” não significa que o Dasein é um eu, mas que o Dasein se desdobra como um eu, sendo o desdobramento, de qualquer forma, mais original do que o desdobrado. Ser-cada-vez-meu é a manifestação fenomenológica de um ser que ek-siste. E como somente o Dasein é tal ek-sistência, somente ele pode dizer, em sua solidão e isolamento ontológicos, “eu”. O Dasein é essa ambiguidade de ser ao mesmo tempo espaçoso e centrado em um ponto (Zugespitztheit); esse é o aspecto fundamental de seu desdobramento como mien, um modo de ser que é perfeitamente representado neste texto: “a expressão ‘sempre meu’ (Je meines) significa: o Dasein é dirigido a mim, de modo que meu eu é o Dasein. Mas Dasein significa: preocupação do ser que, como ser do ente como tal, e não apenas como o ser do homem, está extasiado e aberto nessa preocupação (Sorge). O Dasein é “sempre meu”; isso não significa nem “posto por mim” nem “isolado em um eu singular”. É por meio de sua relação essencial com o ser em geral que o Dasein é ele mesmo. Esse é o significado da frase frequentemente citada de Sein und Zeit: “Ao Dasein pertence a inteligência do ser” (GA40:31). O Dasein é aquele entre-dois que se encontra na coalescência de ser e de ente. É o próprio local do aparecimento do ser como ente, o domínio onde ser é diferenciado de ente, o local da diferença ontológica, a região onde ser e ente são separados, embora permaneçam unidos no mesmo ato manifesto; essa unidade na qual ser e ente se confrontam com sua diferença é o Dasein.