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Língua de Tradição e Língua Técnica

GA80:37-40 – Wiener - aprender como feedback

segunda-feira 18 de outubro de 2021, por Cardoso de Castro

Heidegger, Martin. Língua de Tradição e Língua Técnica. Tr. (do francês) Mário Botas. Lisboa: Vega, 1995, p. 37-40

Com a dominação absoluta da técnica moderna cresce o poder – tanto a exigência como a eficácia – da língua técnica adaptada para cobrir a latitude de informações mais vasta possível. É porque se desenvolve em sistemas de mensagens e de sinalizações formais que a língua técnica é a agressão mais violenta e mais perigosa contra o carácter próprio da língua, o dizer como mostrar e fazer aparecer o presente e o ausente, a realidade no sentido mais lato.

Mas porquanto a relação do homem, tanto quanto ao ente que o rodeia e o sustenta como ao ente que é ele próprio, repousa sobre o [38] fazer aparecer, sobre o dizer falado e não falado, a agressão da língua técnica sobre o carácter próprio da língua é ao mesmo tempo uma ameaça contra a essência mais própria do homem.

Se, avançando no sentido da dominação da técnica que determina tudo, temos a informação pela forma mais alta da língua por causa da sua univocidade, da sua segurança e da sua rapidez na comunicação de informação e de directivas, então o resultado é a concepção correspondente do ser-homem e de vida humana. Assim lemos em Norbert Wiener, um dos fundadores da cibernética, disciplina avançada da técnica modema: «Ver o mundo inteiro e dar ordens ao mundo inteiro é quase a mesma coisa que estar em todo o lado» (Homem e máquina humana [1], 95). E noutro lugar: «Viver activamente significa viver com a informação apropriada» (op. cit., p. 114).

No horizonte de representação da língua, seguindo a teoria da informação, interpreta-se igualmente de maneira técnica uma actividade como a de aprender. Assim escreve Norbert Wiener: «Aprender é fundamentalmente uma forma de retroacção pela qual o modelo de comportamento é modificado pela experiência que precede» (op. cit., p. 63). «A retroacção… é um carácter absolutamente universal das formas de comportamento» (ibid.). «A retroacção é a condução de um sistema pela reintrodução no próprio sistema dos resultados do trabalho cumprido» (op. cit., p. 65).

Uma máquina executa o processo técnico de retroacção, definido como circuito de regulação, assim como – senão de maneira tecnicamente mais reflectida – o sistema de mensagens da língua humana. É por isso que a última etapa, se não for a primeira, de todas as teorias técnicas, é explicar «que a língua não é uma capacidade reservada ao homem, mas uma capacidade que partilha até um certo grau com as máquinas que desenvolveu» (Wiener, op. cit., p. 78). Uma tal proposição é possível se se admite que o próprio da língua está reduzido, isto é, limitado à produção de sinais, ao envio de mensagens.

No entanto, também a teoria da informação vai, necessariamente, de encontro a um limite. Porque «cada tentativa de tornar unívoca uma parte da língua (pela sua formalização [40] num sistema de sinais) pressupõe o uso da língua natural, mesmo não sendo ela unívoca» (C. Fr. von Weizsäcker, A língua como informação [2]). A língua «natural», quer dizer, a língua que não foi por princípio inventada e imposta pela técnica, é sempre conservada e permanece, por assim dizer, como pano-de-fundo de toda a transformação técnica.


Ver online : Língua de Tradição e Língua Técnica


[1Norbert Wiener, Sprache und Dichtung, Francfort: Kösel-Verlag 1952.

[2Carl Friedrich von Weizsäcker, Sprach als Information, in: Die Sprache, quinto lançamento da publicação anual Gestalt und Gedanke, Munich: Verlag R. Oldenburg 1959, p. 70.